Moradores da Favela Sônia Ribeiro, conhecida como favela do Piolho, atingida por um incêndio (Agência Brasil/Marcelo Camargo)
Da Redação
Publicado em 8 de setembro de 2014 às 10h14.
São Paulo - Centenas de casas e barracos foram destruídos pelo fogo na noite deste domingo, 7, e na madrugada desta segunda-feira, 8. O incêndio, cuja causa ainda é desconhecida, forçou a retirada de ao menos entre 500 e 600 famílias das Favelas do Piolho e da Chácara, no Campo Belo, zona sul de São Paulo. Uma mulher gestante foi atendida com crise hipertensiva e a ocorrência não deixou feridos no local.
Móveis, eletrodomésticos, colchões e outros pertences das famílias ficaram espalhados pela Avenida Jornalista Roberto Marinho, nas proximidades do canteiro de obras do monotrilho da Linha 17-Ouro.
Aos moradores das favelas, só restava assistir ao trabalho do Corpo de Bombeiros. O fogo, que teve início pouco antes das 21h, foi controlado à 0h30. O trabalho de rescaldo contra os focos restantes, no entanto, prosseguiu pela madrugada.
A Defesa Civil Municipal estima que entre 500 e 600 famílias foram afetadas pelo incêndio. O último cadastro disponível, realizado há dois anos e quando ocorreu outro incêndio na localidade, apontava a presença de 450 famílias nas comunidades.
"Esse número certamente aumentou", disse o coordenador da Defesa Civil, Milton Roberto Persoli.
Persoli acrescentou que medidas de emergência foram tomadas para atender às famílias. "Estamos abrindo o centro de convivência para receber as crianças, as mulheres e fornecer toda a assistência nesse momento inicial", disse.
O coordenador esclareceu que está estabelecendo contato com lideranças locais para, em um segundo momento, checar a necessidade de um alojamento para abrigar as vítimas.
Apesar de não conhecer a causa oficial do incêndio, moradores relataram que problemas elétricos podem ter levado ao início do fogo. Em uma das entradas das favelas, é notável o acúmulo de fios em um dos postes da rede pública. Para o Corpo de Bombeiros, as estruturas de barracos contribuiu para que o fogo se espalhasse rapidamente.
"Comunidades como estas representam perigo iminente de incêndio pela quantidade de material combustível que têm em seu interior, como barracos de madeira", disse o coronel Sérgio Moretti, comandante do 1º Grupamento de Bombeiros, que atuou no combate às chamas.
De acordo com Moretti, cerca de 80% de ambas as favelas ficaram totalmente destruídas, em especial no centro das instalações, onde o fogo teve início. O oficial não cogitou qualquer razão para o começo da ocorrência. "Só uma perícia mais detalhada vai dizer o que causou", disse.
Desolação. Nas imediações da Roberto Marinho, o cenário era de desolação. Enquanto os bombeiros ainda tentavam controlar as chamas, restava às famílias ficar sentadas sobre os pertences e aguardar um desfecho.
Geladeiras, fogões, máquinas de lavar, colchões e diversos outros pertences se espalhavam pela via. Os objetos representavam o que havia conseguido ser salvo pelas vítimas; outros materiais ficaram pelo caminho e foram consumidos pelo fogo.
Com a família, a agente de trânsito Lucilene Lelis do Santos, de 30 anos, relatou a tristeza em sofrer novamente um incêndio. "Moro aqui desde sempre, e é a quinta ou sexta vez que passo por isso", disse. "Não tem muito o que fazer. Agora é esperar amanhecer, limpar e construir tudo de novo", acrescentou.
O auxiliar de carpinteiro Bruno Fernandes Vieira, de 19 anos, disse ter conseguido salvar somente metade dos seus pertences. "Salvei só isso aqui. Não tenho para onde ir. Vamos esperar para ver o que dá", disse apontando para trouxas de roupa e um colchão. O jovem mora na favela há dois anos com um irmão, um primo e um amigo.
Luiz Henrique Melo, de 25 anos, desempregado, olhava entristecido para o fogo que ainda queimava sobre a comunidade. Morando há quatro meses no local com a mulher, ele disse não ter alternativa.
"Vou ficar na rua. Quando acabar ali, vou construir tudo de novo", afirmou Melo. Ao lado dele estavam uma máquina de lavar, um fogão e uma geladeira que foram todos os eletrodomésticos que ele conseguiu salvar, após ser acordado por vizinhos que contavam sobre o incêndio.
Desentendimentos
O Batalhão de Choque da Polícia Militar precisou ser acionado para garantir o trabalho em tranquilidade do Corpo de Bombeiros. O coronel Moretti relatou que as equipes foram recebidas a pedradas pelos moradores e houve registro de disparos de arma de fogo, cuja autoria não foi identificada.
Diversos moradores reclamavam do isolamento realizado pela PM na área. Eles pediam para ajudar os trabalhos dos bombeiros e também resgatar materiais e objetos de barracos e casas que ainda não haviam sido atingidos pelo fogo. Diante do bloqueio da PM, a resposta era a indignação.
"Em um primeiro momento, a comunidade atrapalhou a nossa locomoção. Não é recomendado a ajuda de pessoas em momentos como esse. Elas não têm preparo e podem se transformar em vítimas", disse o coronel bombeiro Moretti.
Na Rua Cristóvão Pereira, próximo à Roberto Marinho, bombeiros tentavam sem sucesso acionar um hidrante para suprir a necessidade imediata de água.
Moradores protestavam contra a demora no combate às chamas. "Não houve falta d'água. Recorremos a outros hidrantes e também contamos com o auxílio de prédios próximos que nos cederam água", informou o coronel Moretti.
Saques
Após o controle das chamas, alguns populares da região já pensavam em como recompor suas moradias. Para isso, saqueavam o canteiro de obras do monotrilho vizinho às favelas. O principal alvo eram os tapumes de madeira do canteiro, que eram retirados a chutes e carregados para as proximidades da comunidade.