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"Guedes não percebeu que foi vencido", diz Salim Mattar

Salim Mattar vê a saída de Roberto Castello Branco da Petrobrás como uma truculência por parte do governo

Ministro da Economia, Paulo Guedes (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Ministro da Economia, Paulo Guedes (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 21 de fevereiro de 2021 às 16h24.

Secretário especial de Desestatização e Privatização do Ministério da Economia por 19 meses até agosto passado, Salim Mattar vê a saída de Roberto Castello Branco da Petrobrás como uma truculência por parte do governo. Ele diz torcer para que CVM, acionistas minoritários e investidores abram ações na Justiça, processem conselheiros e o controlador pela interferência na empresa. Ele acredita que o Brasil perdeu o foco e, desse jeito, não pode dar certo.

Mattar deixou o governo ao perceber que não conseguiria cumprir seu objetivo de privatizar o máximo possível de estatais. Mas continua defendendo a necessidade de o País privatizar tudo. Sobre o ministro Paulo Guedes, que tem opinião semelhante, afirma que ele “é resiliente, obstinado e determinado, mas não percebeu que foi vencido”.

• Como o sr. vê a intervenção do governo na Petrobrás?

Quando um governo faz opção de abrir o capital de uma empresa, captando investimentos de pessoas físicas, jurídicas e de investidores estrangeiros, sabe que ela será regida sob o manto do mercado. Se o governo deseja intervir numa empresa, primeiro não deveria ter aberto seu capital. Mas ele pode tomar uma atitude, chamar os minoritários, pagar todo mundo, fechar o capital e fazer o que quiser, como colocar a gasolina a R$ 1. É simples, é seguir a lei. Mas não pode interferir num ativo que tem investimento de milhares de pessoas físicas e jurídicas. Isso traz insegurança jurídica.

• Qual pode ser o impacto dessa decisão?

Há um risco muito elevado e iminente de processos, porque os conselheiros têm de agir no sentido de proteger a empresa, de fazer o que for melhor para ela e não para o acionista controlador. Estou torcendo para que o mercado reaja e para que CVM, minoritários e investidores abram ações na Justiça, processando conselheiros e o controlador pela interferência na Petrobrás, e acho que isso vai acontecer.

• O aumento no preço do combustível, que teria provocado descontentamento entre caminhoneiros, é uma justificativa?

Os caminhoneiros são muito importantes na nossa sociedade, assim como outras funções. Mas é bom ressaltar que não existe greve de caminhoneiros nos EUA, Canadá, Reino Unido e Suécia, porque lá não tem petroleira estatal. Por outro lado, temos greve na Argentina, Brasil e França, porque há estatais de petróleo. Quem gera a greve é o próprio governo, não são os caminhoneiros. O combustível brasileiro tem elevada carga tributária, e a Petrobrás fica pagando o pato por isso. Esse problema precisa ser resolvido. No passado os governos acharam uma forma fácil de conseguir mais impostos, taxaram o combustível e isso precisa ficar mais transparente para a sociedade. A origem do problema é o gigantismo do Estado, que como consequência gerou o aumento da carga tributária que onerou o diesel e prejudicou o caminhoneiro. A carga tributária tem de ser muito elevada para pagar os 12 milhões de funcionários públicos.

• O que pode ser feito para amenizar isso?

A solução definitiva é a redução do tamanho do Estado. Quando candidato, (Jair) Bolsonaro falava em privatização, e o ministro (Paulo) Guedes, que é liberal, defendia a tese da redução do tamanho do Estado. Me senti motivado a deixar meus negócios para contribuir com isso. Quando cheguei, disseram que havia 134 estatais, mas, como todo mineiro desconfiado, fui verificar e descobri que eram 698 empresas, entre estatais, subsidiárias, coligadas e investidas. Nos 19 meses que permaneci no governo, vendemos 84 empresas por quase R$ 150 bilhões. Mantido esse ritmo, vamos gastar dez anos para vender tudo, e todo mundo é contra: servidores, políticos, o establishment - Executivo, Legislativo e Judiciário. Em momentos oportunistas se juntam a eles os sindicatos, fora os empresários criminosos que ficam escondidos atrás de um CNPJ, tipo os empreiteiros durante os governos petistas.

• O sr. acha que acabou de vez o sonho liberal?

O ministro Guedes é resiliente, obstinado e determinado, mas não percebeu que foi vencido. Por exemplo, há quanto tempo a história da Eletrobrás está no Congresso e não consegue autorização? Tem a Casa da Moeda, que eu tentei privatizar e o Congresso disse não por considerá-la estratégica. Mas ela é uma gráfica. O pior é que daqui a três ou quatro anos vamos vender as máquinas de fazer notas e moedas a quilo em ferro-velho, porque não vai ter mais valor. Essas pessoas que falam que é estratégico são cegas e não conseguem entender que moeda e papel-moeda vão desaparecer em pouco tempo. A China, desde maio do ano passado, só paga os servidores em moeda digital, princípio que outros países vão adotar.

• Como o sr. avalia a saída do Castello Branco?

Primeiro, acho que faltou elegância, respeito e consideração pela forma como foi demitido. Isso demonstra uma certa truculência do governo. O histórico da Petrobrás é que os presidentes têm sido substituídos a cada dois anos. Como pode uma empresa dar certo trocando o presidente a cada dois anos? Quero lembrar que há alguns anos saiu o Pedro Parente por problemas parecidos - combustível, greve de caminhoneiro. Governos, por favor fechem o capital da Petrobrás e façam o que quiserem, mas respeitem as regras.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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