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Governo Bolsonaro quer contratar PM de folga para fiscalizar Amazônia

Ideia é usar policiais que já atuam na área ambiental para "bicos" em unidades de conservação; proposta não é bem recebida por ambientalistas

Amazônia: governo federal quer usar policial de folga para fiscalizar a região (Nacho Doce/Reuters)

Amazônia: governo federal quer usar policial de folga para fiscalizar a região (Nacho Doce/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 31 de maio de 2019 às 11h22.

Brasília — O governo de Jair Bolsonaro quer usar policiais militares de todos os estados do país para fazer, em horários de folga, a fiscalização das florestas nacionais. O plano, em elaboração no Ministério do Meio Ambiente (MMA), prevê contratar PMs que já atuam em fiscalizações ambientais de seus Estados. Eles poderão se credenciar para fazer os "bicos" nas unidades de conservação federais. Esse trabalho seria feito nos horários em que os policiais estiverem livres, recebendo diárias pagas com recursos da União.

Conforme o jornal O Estado de S. Paulo apurou, a ideia é complementar o trabalho feito pelas atuais equipes de fiscalização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio). A contratação dos "frilas" da PM deve ter início nos Estados da Amazônia.

O pagamento de uma "Diária Especial por Jornada Extraordinária de Trabalho da Polícia Militar", prática conhecida como "Dejem", será feito por meio de convênio direto entre a União e cada unidade da PM. A iniciativa pode evitar que o governo tenha de fazer concursos públicos para reforçar as equipes técnicas do Ibama e do ICMBio.

O governo ainda precisa saber o tamanho do efetivo que terá à disposição e o custo da diária de cada PM folguista, uma vez que cada Estado paga salário diferente à categoria. Para isso, o ministério encomendou um levantamento de dados.

Questionado sobre o assunto, o ministro Ricardo Salles confirmou o plano de usar os PMs, sob o argumento de que é preciso "complementar" o trabalho de campo que hoje é feito por fiscais ambientais do Ibama e do ICMBio e que, em sua avaliação, não é suficiente.

"Debatemos essa ideia com o conselho de comandantes-gerais das polícias militares dos Estados. Tivemos uma reunião sobre o assunto", disse Salles. "Mas é importante destacar que não queremos substituir os fiscais. É para complementar as ações de combate nas unidades de conservação."

O ministro afirmou, ainda, que até o fim de agosto terá um levantamento detalhado da força à disposição. "A ideia é dar ênfase na região amazônica, até para vermos como funcionaria isso, mas sem desconsiderar os Estados de outras regiões", comentou. "É uma soma de forças imediata. São pessoas treinadas e capacitadas, que vêm com equipamentos. No final, é uma ajuda recíproca."

O jornal apurou que o Fundo Amazônia, programa de combate ao desmatamento bancado com recursos doados por Noruega e Alemanha, está entre as opções analisadas para bancar a conta extra. Salles diz acreditar que haverá verba, apesar dos profundos cortes orçamentários na pasta. "Acho que teremos recursos, até porque são operações que você não tem custos de treinamento. O efetivo já está pronto. É uma transferência de recursos."

Reação

O plano de usar policiais em horários de folga para proteger a floresta não é bem recebido por ambientalistas e servidores, que veem a medida como ação paliativa e que não resolve o problema. Pesa ainda o fato de os PMs não terem a qualificação técnica dos agentes ambientais, uma vez que estão mais concentrados na autuação de crimes do que na proteção de unidades de preservação.

Dados obtidos pelo Estado apontam que o Ibama tem hoje cerca de 800 fiscais para suas atividades em campo. Apenas 500, entretanto, estão atuando nas matas, porque os demais trabalham em outras funções.

Em meados de 2012, o instituto chegou a ter 1,5 mil agentes, mas o quadro não foi reposto conforme os fiscais se aposentavam ou deixavam o órgão.

No caso do ICMBio, são aproximadamente 320 fiscais. Considerando que há 334 áreas protegidas no País - equivalente a 9,1% do território nacional -, não há nem um fiscal para cada unidade protegida.

Oferecimento

O coronel da Polícia Militar Homero de Giorge Cerqueira, escolhido para presidir o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), já havia oferecido PMs de folga para serviços no governo federal. Ele ainda comandava o setor ambiental da corporação paulista quando fez a proposta à União.

A reportagem apurou que uma "proposta de celebração de convênio" entre a PM de São Paulo e o Ministério do Meio Ambiente foi enviada em 15 de abril, mesma data em que o ministro Salles convidou Cerqueira para o ICMBio. No documento, o coronel pede a "análise e deliberação" de Salles sobre a proposta e traz ainda detalhes de batalhões que já atuam nas proximidades de 12 unidades de conservação federais em São Paulo.

Cerqueira assumiu o cargo logo após a saída do ex-presidente do ICMBio, Adalberto Eberhard. O antigo titular do cargo pediu exoneração após Salles instaurar procedimento administrativo contra servidores do instituto que não participaram de reunião com produtores rurais no Rio Grande do Sul. Esses servidores dizem que não haviam sido convidados. Após Eberhard, mais três diretores do órgão também saíram.

Capital paulista

Um modelo similar é adotado na Operação Delegada, convênio entre o governo paulista e a Prefeitura de São Paulo para que PMs de folga reforcem o patrulhamento nas ruas. O principal foco dessa operação é combater o comércio ambulante.

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