Ricardo Salles: futuro ministro tem processo em andamento já em fase de sentença (Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo/Divulgação)
Agência Brasil
Publicado em 10 de dezembro de 2018 às 20h59.
Última atualização em 27 de dezembro de 2018 às 20h35.
O ex-secretário do Meio Ambiente do governo paulista de Geraldo Alckmin, Ricardo Salles, que vai comandar o Ministério do Meio Ambiente a partir de janeiro, conforme anunciou no domingo (9) o presidente eleito, Jair Bolsonaro, responde a ação civil por improbidade administrativa, acusado de alterar ilegalmente o plano de manejo de uma área de proteção ambiental para supostamente favorecer interesses empresariais.
No período em que esteve à frente da Secretaria do Estado de São Paulo - de julho de 2016 a agosto de 2017 - foi alvo de ação do Ministério Público (MP-SP), acusado de irregularidades durante a elaboração do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) da Várzea do Rio Tietê, em 2016.
O processo foi aceito pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e está em fase de sentença. Já o plano de manejo está suspenso por causa da ação, segundo o promotor Silvio Marques.
"A minuta de decreto do plano de manejo e os mapas de zoneamento da APA passaram a sofrer inúmeras modificações, todas feitas na clandestinidade e que visavam a favorecer o setor industrial, notadamente o minerário, entre outros, descaracterizando totalmente a minuta de decreto e os mapas de zoneamento", diz ação do MP.
Os mapas de zoneamento já haviam passado por análise e votação na Comissão Temática de Biodiversidade, Florestas, Parques e Áreas Protegidas (CTBio), órgão auxiliar do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), que foi destinada pela legislação para esta atribuição.
Demandas apresentadas pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e pela Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp), que já tinham sido debatidas pelos membros da CTBio e que foram rechaçadas pela comissão, teriam sido contempladas no plano de manejo por meio das mudanças realizadas por Salles.
O MP afirma que não havia qualquer justificativa para alteração no plano de manejo e que elas foram feitas por determinação do secretário Estadual do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
Em entrevista à Rede Globo, Salles apresentou sua defesa: "Em certos lugares, onde diziam que era área de preservação, já tinha estação de tratamento de esgoto, havia avenidas, conjuntos residenciais da CDHU.
Quer dizer, se nós deixássemos aquele plano de manejo ser aprovado daquela forma, absolutamente desconectado da realidade, o prejuízo a todos, à sociedade, ao desenvolvimento econômico e ao meio ambiente, seria enorme".
O indicado comentou ainda, na entrevista, o andamento do processo. "Sou réu, mas não há decisão contra mim. São todas favoráveis a mim. Todas as testemunhas foram ouvidas, todas as provas produzidas e o processo está concluso para sentença, pode ser sentenciado a qualquer momento. Todas as testemunhas ouvidas, de funcionários do governo e fora, corroboraram a minha posição", afirma Salles.
Citada pelo MP, a Fiesp foi procurada pela reportagem da Agência Brasil, e não se pronunciou até o momento. A Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo informou, em nota, que não vai se manifestar.
As polêmicas que envolvem o Ministério do Meio Ambiente começaram logo após vitória de Bolsonaro nas eleições, quando chegou a ser anunciada a fusão dos ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente. Depois de reações negativas, o presidente eleito recuou da decisão.
No entanto, a escolha de Ricardo Salles para comandar a pasta do Meio Ambiente gerou críticas de várias organizações que defendem direitos ambientais.
A coalização de organizações da sociedade civil Observatório do Clima avaliou assim a indicação: "Se por um lado contorna o desgaste que poderia ter com a extinção formal da pasta, por outro garante que o MMA [Ministério do Meio Ambiente] deixará de ser, pela primeira vez desde sua criação, em 1992, uma estrutura independente na Esplanada. Seu ministro será um ajudante de ordens da ministra da Agricultura", acusa a entidade em nota.
O Greenpeace avalia que a nomeação de Salles ocorre no momento em que a área ambiental recebe más notícias, quando o desmatamento da Amazônia registrou o maior índice dos últimos dez anos e o país acaba de retirar sua candidatura para sediar a COP-25. E também julga que irá favorecer os setores ligados à agricultura.
"A principal função do novo ministro será a promoção de uma verdadeira agenda anti-ambiental, colocando em prática medidas que vão resultar na explosão do desmatamento na Amazônia e na diminuição do combate ao crime ambiental. O que já está ruim, pode piorar", afirmou Márcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil.
A WWF, outra organização não governamental internacional, comentou a nomeação, dizendo que esta é uma pasta estratégica para o Brasil.
A entidade destaca que a destruição ilegal das florestas na Amazônia e do Cerrado diminuem a competitividade dos produtos brasileiros diante de um mercado global que busca produtos livres de desmatamento, além de prejudicar o cumprimento dos compromissos que o Brasil assumiu no Acordo de Paris, como a diminuição na emissão de gases de efeito estufa.
"Desejamos que o Ministério do Meio Ambiente cumpra a missão de balancear as questões ambientais nas outras pastas do governo, zelando assim para que o Brasil tenha medidas necessárias para proteger de forma estratégica o nosso imenso patrimônio natural. E que tenha capacidade de dialogar com os diversos setores da sociedade, uma vez que o direito à um meio ambiente saudável se aplica a todos, desta e das futuras gerações", disse Mauricio Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil.