Venezuelanos na fronteira com a cidade de Pacaraíma, em Roraima: cidade tem cerca de mil imigrantes em situação de rua (Nacho Doce/Reuters)
AFP
Publicado em 19 de agosto de 2018 às 10h22.
A cidade fronteiriça de Pacaraima, no estado de Roraima, viveu momentos de tensão neste sábado com um confronto entre brasileiros e imigrantes venezuelanos cujos acampamentos improvisados foram destruídos e incendiados.
O tumulto começou pela manhã depois que um comerciante foi ferido na madrugada e seus familiares responsabilizaram os venezuelanos que no último ano intensificaram sua presença na cidade.
Dezenas de brasileiros, em retaliação, atacaram os dois principais acampamentos improvisados dos imigrantes e queimaram seus pertences.
A força tarefa que opera na região para atender ao fluxo migratório dos venezuelanos confirmou as informações e apontou que o comerciante ferido foi auxiliado e se encontra estável em Boa Vista, capital do estado de Roraima.
Um moradorde Pacaraima contou à AFP que o confronto começou cedo, depois que a notícia sobre o ataque ao comerciante se espalhou.
"Ele é conhecido, é o nosso vizinho, houve indignação quando o pessoal soube do roubo. O pessoal começou a expulsar os venezuelanos que estavam no centro, empurrando eles de volta para seu país", contou o morador que pediu anonimato.
Três brasileiros ficaram feridos, segundo um porta-voz da Polícia Militar, e não houve detidos. Não há informações sobre os venezuelanos, muitos dos quais, segundo imagens divulgadas por moradores da cidade, cruzaram a fronteira de volta a seu país.
Autoridades informaram que à noite a cidade estava tranquila, mas entre os moradores circulavam rumores sobre a situação e possivel retorno dos imigrantes em território venezuelano.
A governadora do estado de Roraima, Suely Campos, pediu à Brasília reforços de segurança para "enfrentar o aumento da criminalidade" que ela atribui ao aumento de venezuelanos na região.
Mais cedo, vídeos enviados por moradores de Pacaraima mostram momentos de confrontos, que se dispersaram ao meio-dia, deixando as ruas vazias de pessoas e cheias de escombros. O comércio foi fechado.
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"Foi terrível, queimaram as tendas e tudo o que havia dentro", contou à AFP Carol Marcano, venezuelana que trabalha em Boa Vista e que estava na fronteira voltando de seu país. "Houve tiros, queimaram pneus", disse.
Marcano disse que alguns venezuelanos reagiram ao ataque e destruíram um carro com placa brasileira. Ela e outras pessoas se abrigaram nos postos de controle do lado venezuelano.
Apesar do confronto, a fronteira permaneceu aberta, confirmou a força-tarefa à AFP. A equipe multidisciplinar, composta pelas Forças Armadas do Brasil e organizações civis e não governamentais, repudiou os atos de violência em um comunicado.
Outro vizinho brasileiro disse que os moradores da cidade temem que os venezuelanos "voltem para se vingar" pelo ataque.
Há três anos, milhares de venezuelanos cruzam a fronteira terrestre para o Brasil devido à intensificação da crise econômica, política e social no país.
Segundo autoridades regionais, Pacaraima, com aproximadamente 12.000 habitantes, tem cerca de mil imigrantes em situação de rua. Os moradores reclamam do aumento de roubos e incidentes violentos, enquanto o governo de Roraima alega falta de recursos para atender a situação e pede o fechamento da fronteira.
A cidade brasileira mais próxima é Boa Vista, capital do estado, que fica a aproximadamente 215km. Lá vivem cerca de 25.000 venezuelanos, segundo balanço oficial.
A Polícia Federal, encarregada do trâmite migratório no Brasil estima que cerca de 500 venezuelanos chegam diariamente ao Brasil. O auge deste movimento neste ano oscilou entre 900 e 1.200 em janeiro.
Há onze abrigos em Boa Vista e Pacaraima, com mais de 4.000 venezuelanos, incluindo mais de mil indígenas warao, originários do norte da Venezuela.
No primeiro semestre deste ano, 56.740 venezuelanos tentaram legalizar sua situação no Brasil, solicitando refúgio ou residência temporária.