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Quem paga a conta da proteção ao vinho nacional

Medidas protecionistas para dar fôlego ao vinho brasileiro podem acabar prejudicando o consumidor e a própria indústria nacional, dizem analistas

Vinhos importados poderão ficar mais caros ou escassos no Brasil (Alexandre Jaeger Vendruscolo/Stock.Xchng)

Vinhos importados poderão ficar mais caros ou escassos no Brasil (Alexandre Jaeger Vendruscolo/Stock.Xchng)

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Da Redação

Publicado em 17 de março de 2012 às 11h46.

São Paulo – O governo está cogitando afogar as mágoas do produtor nacional de vinhos com um pacote de medidas de salvaguarda que poderão encarecer ou dificultar a chegada dos rivais importados ao copo do brasileiro. Mas, na opinião de analistas de mercado, a festa pode acabar em ressaca.

De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), o Brasil importou 77,6 milhões de litros de vinho em 2011, quase o dobro do volume importado em 2004, que foi de 39,1 milhões de litros. Em contrapartida, a indústria nacional patinou no mesmo período. As vendas dos produtores do Rio Grande do Sul, que respondem pela maior parcela da produção brasileira, empataram nos 19 milhões de litros – após atingirem o pico de 22 milhões em 2006, foram recuando ao longo dos anos até voltarem no ano passado ao mesmo nível de 2004.

Diante do avanço dos estrangeiros no mercado, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) estuda adotar medidas de salvaguarda para dar vantagem competitiva à indústria nacional durante três anos, incluindo o estabelecimento de cotas de entrada para produtos estrangeiros e um possível aumento do imposto de importação de 27% para 55%. 

Mas o que, à primeira vista, pode parecer motivo para brinde, corre o risco de terminar em dor de cabeça para os próprios produtores nacionais. 

Após os duros anos de reserva de mercado, os vinhos importados começaram a ganhar popularidade no Brasil ao longo da década de 1990. Junto com a invasão dos rótulos estrangeiros, veio um amadurecimento dos consumidores e da própria indústria nacional.

“A entrada dos vinhos argentinos e chilenos a taxa zero forçou uma profissionalização do mercado brasileiro nos anos 2000, com investimentos na contratação de enólogos e em novos métodos de poda e colheita, maquinários, barris, garrafas, rótulos, transporte, acondicionamento e até nos pontos de venda. Isso impactou muito na qualidade do produto final”, avalia Túlio Rodrigues, coordenador do curso Negócios do Vinho da FGV.

Além de ter melhores vinhos nacionais à disposição, o consumidor brasileiro passou a encontrar uma maior variedade de importados a preços interessantes nas prateleiras, principalmente após a crise de 2008, que impactou o consumo interno do mercado europeu e fez com que mais rótulos do velho continente encontrassem seu destino final nas mesas brasileiras. “O mercado ficou mais competitivo e o consumidor mais educado, exigindo mais dos produtos”, explica Rodrigues.

Mas este avanço pode ser prejudicado com uma alta nos preços, na avaliação de especialistas do setor. “É uma medida que protege os produtores de vinho, mas é péssima para o consumidor. O vinho brasileiro não vai ficar mais barato, pelo contrário, a média de preços vai subir. O consumidor vai ter um espectro de qualidade e variedade menor”, aponta Alberto Bueno, da Prospectiva Consultoria.


Para os analistas, o consumo de vinhos no Brasil, que já é baixo (a média anual per capta aqui é de 2 litros, enquanto em países como França, Itália e Portugal supera os 40 litros per capta), pode ser ainda mais impactado pela estratégia. “Com este tipo de medida, o consumidor tem menos incentivo a comprar o produto e toda a indústria perde”, opina Rodrigues.

O caminho das uvas

Para o professor, o caminho para o sucesso do vinho nacional está na receita adotada por países que se tornaram referência no mercado mundial nas últimas décadas, como Nova Zelândia, Austrália, África do Sul e Chile.

O salto de competitividade destes países veio da introdução de novas técnicas produção aliadas à criação de leis que incentivaram o cultivo e a produção local, com estratégias de marketing globais muito bem elaboradas arrematando o ciclo.

Segundo Carlos Paviani, diretor-executivo do Ibravin (Instituto Brasileiro do Vinho), a indústria brasileira está fazendo sua lição de casa e deve investir 18 milhões de reais na modernização do setor e outros 15 milhões de reais na promoção e divulgação do produto nacional como contrapartida às medidas de salvaguarda.

“Hoje a participação do vinho nacional no mercado é de menos de 20%. Se conseguirmos dobrar esse número ou até aumentar em 50% nestes três anos, já seria ótimo”, diz.

Embora no momento o governo esteja apenas estudando a proposta, Paviani disse que o setor está confiante de que as medidas serão aprovadas. A demanda principal, de acordo com o produtor, não é o aumento dos impostos, mas sim o estabelecimento de cotas de importação.

“Isso deve fazer com que produtos de melhor qualidade cheguem ao mercado, pois os importadores serão mais criteriosos na hora de comprar”, argumenta. A associação defende que os produtores europeus desovam no mercado brasileiro produtos de qualidade inferior, a preços que inviabilizam a competição, e que os três anos de salvaguarda dariam aos produtores locais fôlego para se reestruturar e competir em condições mais justas. 

O alvo, ao que parece, são principalmente os países europeus, já que Argentina e Chile não serão impactados pelo acordo – a primeira por fazer parte do Mercosul, e o segundo por ter um acordo de tarifa zero com o Brasil, que não seria invalidado pelas medidas.  

Para Celina Ramalho, professora da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP), a demanda é justa. “O protecionismo permite que indústrias nascentes se desenvolvam melhor. Quando abre, a pujança é maior. Foi assim que os asiáticos conseguiram se estabelecer no mercado global e se tornar competitivos”, defende. “É a hora e a vez do Brasil se posicionar no mundo”, acrescenta.

Mas, mesmo que a indústria saia fortalecida deste período de “reabilitação”, quem pode acabar com um gosto amargo no copo é o consumidor.

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