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Filho do presidente do STJ obteve R$ 80 milhões para influenciar decisões

Na denúncia recebida pelo juiz Marcelo Bretas, procuradores da Lava-Jato registram duas levas que teriam beneficiado o filho de Humberto Martins

Ministro Humberto Martins: ministro é atual presidente do STJ (José Cruz/Agência Brasil)

Ministro Humberto Martins: ministro é atual presidente do STJ (José Cruz/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 9 de setembro de 2020 às 14h44.

Última atualização em 9 de setembro de 2020 às 15h33.

O advogado Eduardo Martins, filho do atual presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Humberto Martins, fechou contratos de 83 milhões de reais com a Fecomercio do Rio, na época em que era presidida por Orlando Diniz, a pretexto de 'influir em atos praticados por ministros do Superior Tribunal de Justiça', indica a força-tarefa da Lava-Jato fluminense.

Martins é um dos 26 acusados pelo Ministério Público Federal do Rio por suposto esquema irregular de pagamento a escritórios de advocacia que teriam desviado 150 milhões de reais entre 2012 e 2018 das seções fluminenses do Serviço Social do Comércio (Sesc RJ), do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac RJ) e da Federação do Comércio (Fecomercio/RJ).

A Procuradoria imputa ao advogado crimes de peculato, exploração de prestígio, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

Na denúncia recebida pelo juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, os procuradores da Lava-Jato registram duas 'levas' de contratações que teriam beneficiado o filho de Humberto Martins.

A primeira delas teria ocorrido em maio de 2014, no valor de 5,5 milhões de reais e teria contado com auxílio de Cristiano Zanin e Fernando Hargreaves.

Segundo a Procuradoria, na ocasião, Eduardo Martins obteve para si e para Eurico Teles, 'vantagem ilícita, em prejuízo da Fecomercio, consistente no pagamento de 2 milhões de reais'. O filho do presidente do STJ recebeu 1,3 milhão de reais e o Eurico, pouco mais de  600.000 reais.

Os valores foram repassados em maio e dezembro do mesmo ano, mediante formalização de um contrato de honorários advocatícios firmado com o sistema S fluminense, diz a Procuradoria. Em razão de tal contratação, o escritório do Eduardo emitiu duas notas ficais, que, assim como os contratos investigados, são consideradas pela Lava-Jato do Rio 'ideologicamente falsas, na medida em que os serviços nelas especificados não foram prestados'.

Já a segunda leva de contratações relacionadas a Eduardo Martins e identificadas pelo Ministério Público Federal teriam relação com desvios que ocorreram entre 2015 e 2017, em um valor mais substancial: 77,5 milhões de reais, também 'a pretexto de influir em atos praticados por ministros do Superior Tribunal de Justiça'.

Os procuradores registram que entre dezembro de 2015 e abril de 2016, Eduardo Martins 'desviou para si e para César Rocha, com ajuda de Orlando Diniz e Cristiano Zanin', 37,4 milhões de reais dos cofres do Sesc e do Senac do Rio — 36,5 milhões de reais para ele mesmo e 900.000 reais para César Rocha. Os supostos desvios se deram mediante a elaboração de três contratos de honorários advocatícios, firmados entre a Fecomercio e o Escritório de Advocacia Martins.

Segundo a Lava-Jato fluminense, tais contratos eram 'ideologicamente falsos na medida em que, em dois deles, foram apostas datas retroativas e, quanto a todos eles, desde o início os serviços previstos sabidamente não seriam prestados pelo Martins.

A matéria é de competência da Justiça Estadual, conforme jurisprudência pacífica dos Tribunais, inclusive do Superior Tribunal de Justiça; (b) foi efetivada com o mesmo espetáculo impróprio a qualquer decisão judicial dessa natureza, como venho denunciando ao longo de minha atuação profissional, sobretudo no âmbito da Operação Lava-Jato; (c) foi proferida e cumprida após graves denúncias que fiz no exercício de minha atuação profissional sobre a atuação de membros da Operação Lava-Jato e na iminência do Supremo Tribunal Federal realizar alguns dos mais relevantes julgamentos, com impacto na vida jurídica e política do país. Ademais, foge de qualquer lógica jurídica a realização de uma busca e apreensão após o recebimento de uma denúncia — o que mostra a ausência de qualquer materialidade da acusação veiculada naquela peça.

Esse abuso de autoridade, aliás, não é inédito. A Lava-Jato, em 2016, tentou transformar honorários sucumbenciais que nosso escritório recebeu da Odebrecht, por haver vencido uma ação contra a empresa, em valores suspeitos — e teve de admitir o erro posteriormente. No mesmo ano, a Lava-Jato autorizou a interceptação do principal ramal de nosso escritório para ouvir conversas entre os advogados de nosso escritório e as conversas que eu mantinha com o ex-presidente Lula na condição de seu advogado, em grave atentado às prerrogativas profissionais e ao direito de defesa. Não bastasse, em 2018 a Lava-Jato divulgou valores que nosso escritório havia recebido a título de honorários em decorrência da prestação de serviços advocatícios.

Todas as circunstâncias aqui expostas serão levadas aos foros nacionais e internacionais adequados para os envolvidos sejam punidos e para que seja reparada a violação à minha reputação e à reputação do meu escritório, mais uma vez atacadas por pessoas que cooptaram o poder do Estado para fins ilegítimos, em clara prática do lawfare — fenômeno nefasto e que corroeu a democracia no Brasil e está corroendo em outros países."

Até a publicação desta matéria, a reportagem ainda buscava contato com os demais citados, sem sucesso. O espaço permanece aberto a manifestações.

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