ROBERTO CAMPOS NETO: "Trocar inflação controlada, um sistema de credibilidade no longo prazo, por um crescimento de curto [prazo], é voo de galinha" (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Agência Brasil
Publicado em 16 de maio de 2019 às 16h28.
O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse hoje (16) que o desempenho recente da economia foi decepcionante. Ele destacou que é preciso resolver a situação fiscal e, assim, o país voltará a ter investimentos.
"Ficamos decepcionados com o resultado", disse. Ele também afirmou que não existe país com inflação e juros baixos e com o cenário fiscal desarrumado.
Campos Neto acrescentou que existia a expectativa no mercado financeiro de que, após eleição, a questão fiscal fosse rapidamente resolvida. Entretanto, como isso não ocorreu, o mercado está em processo de espera pelas reformas.
"Incertezas continuam no ar, isso explica um pouco esse adiamento da decisão de investir", afirmou.
Entretanto, o presidente do BC reforçou que a expectativa é de retomada do crescimento econômico adiante. Ontem (15), o BC informou que a atividade econômica registrou recuo no primeiro trimestre deste ano. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) apresentou queda de 0,68%, segundo dados dessazonalizados - ajustados para o período.
Campos Netto disse também que não se pode trocar inflação sob controle por crescimento econômico. Em audiência pública na Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso NacionalCampos Neto afirmou que a estratégia já foi testada no passado e não deu certo, gerando recessão.
"Achar que a gente vai trocar inflação controlada, um sistema de credibilidade no longo prazo, por um crescimento de curto [prazo], isso é voo de galinha. Não dura e quando volta a crise é grande e nós gastamos um bom tempo tentando recuperar isso", afirmou, em audiência na Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso Nacional.
Campos Neto ressaltou que a melhor forma de ter crescimento econômico é com inflação sob controle e expectativas de inflação dentro da meta. Segundo ele, reduzir juros para a economia crescer foi um erro que gerou a crise de 2014, com perda de credibilidade e "enorme" saída de recursos do país.
Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada nessa terça-feira (14), o BC adiantou que a economia poderia apresentar recuo no primeiro trimestre. Segundo o documento, o processo de recuperação gradual da atividade econômica sofreu interrupção no período recente, mas a expectativa é de retomada adiante.
De acordo com o documento, o arrefecimento da atividade observado no final de 2018 teve continuidade no início de 2019. "Em particular, os indicadores disponíveis sugerem probabilidade relevante de que o Produto Interno Bruto (PIB) tenha recuado ligeiramente no primeiro trimestre do ano, na comparação com o trimestre anterior, após considerados os padrões sazonais", diz a ata.
Na audiência, Campos Neto também afirmou que depois da crise financeira global de 2008, os países trocaram a competição entre os bancos, com maior número de instituições no mercado, pela estabilidade, com concentração bancária. "Acharam que o sistema concentrado tinha menos vulnerabilidade. Isso não só aconteceu no Brasil como em vários outros países", disse.
Campos Neto avaliou, entretanto, que o principal fator responsável pelos juros altos no país é a inadimplência. Segundo ele, a inadimplência é responsável por 37,5% do spread (diferença entre taxa captação dos recursos pelos bancos e os juros cobrados dos clientes). Ele também citou outros fatores como o custo financeiro (23%), operacional (25%) e o lucro (15%)
Segundo ele, "micromedidas" como estímulo ao cooperativismo e às fintechs (empresas de inovação tecnológica no mercado financeiro), por exemplo, vão ajudar a baixar o custo do crédito no país.
Campos Neto defendeu mudança na legislação para garantir a autonomia do BC. "Acreditamos ainda que um BC autônomo, como estabelece projeto de lei atualmente em discussão nesse parlamento, proporcionaria uma redução de incertezas econômicas e dos prêmios de risco [retorno adicional cobrado por investidores para aceitar correr maior grau de risco], o que nos levaria a uma melhor condição de consolidar os ganhos recentes e abrir espaço para os novos avanços que o país tanto precisa", ressaltou.