Projeto do estádio do Corinthians: clube e a construtura Odebrecht ainda não se entenderam quanto ao valor da obra (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 27 de junho de 2011 às 08h25.
São Paulo – Um “Pai Nosso” foi o pontapé inicial das obras do estádio do Corinthians, o “Fielzão”, que será construído em Itaquera, zona Leste de São Paulo. Os operários da construtora Odebrecht se reuniram no centro do terreno, por volta das 8h do dia 30 de maio, e fizeram, em círculo, a oração. Dias depois, um pai de santo visitou a obra e realizou um trabalho para que a construção da arena que deve sediar a abertura da Copa de 2014 não tenha problemas. Os que sabem dos imbróglios envolvendo o custo e a viabilidade financeira do estádio fazem coro ao dizer: é bom que a reza seja forte.
Apesar de tratores e caminhões já terem começado a terraplanagem no local da construção, questões importantes sobre a arena ainda permanecem indefinidas. O valor é uma delas. A diretoria do Corinthians quer que o investimento máximo seja de 700 milhões de reais. Já a Odebrecht apresentou um orçamento maior, de 1,07 bilhão. Segundo a construtora, o projeto ficou mais caro porque foram necessárias adaptações para adequá-lo às exigências da FIFA.
No começo do mês, o Corinthians chegou a revelar que a Odebrecht já havia topado reduzir em 20% o valor da obra, que ficaria em torno de 800 milhões de reais. O valor inicial, além de embutir as adaptações às normas da FIFA, também incluíam, segundo o clube, o valor total dos impostos. Os 20% de abate seriam possíveis graças às isenções do governo para as 12 cidades sedes da Copa. A princípio, os recursos disponíveis para a construção do estádio somam 650 milhões de reais: 400 milhões financiados pelo BNDES e 250 milhões garantidos pela Prefeitura de São Paulo por meio de Certificados de Incentivo ao desenvolvimento.
Desentendimentos à parte, qualquer um dos dois valores possíveis para o Fielzão causa estranhamento, principalmente ao compará-lo com outros estádios brasileiros com projeto semelhante. Uma delas é o do Castelão, estádio de Fortaleza que será reformado. Segundo o arquiteto Ronald Werner, do escritório Vigliecca e Associados, responsável pelo projeto do Castelão, a obra terá capacidade para 66 mil torcedores. O estádio será totalmente coberto, e contará com um estacionamento, também coberto, de duas mil vagas. O custo total deve ficar em torno de 460 milhões de reais.
Já o estádio do Corinthians deve ter capacidade para 68 mil torcedores na abertura da Copa do Mundo. Destes, 18 mil lugares são provisórios e serão retirados depois do Mundial. Cerca de 70% da arena será coberta e o estacionamento anexo terá três mil vagas, das quais 800 serão cobertas. Há quem diga que a comparação é desproporcional, por diversas razões. A primeira é o fato de o Fielzão ser construído “do zero”, enquanto o Castelão vai aproveitar parte da estrutura do estádio que será apenas reformada.
Segundo um especialista em estádios, que preferiu não ser identificado, pois está envolvido em projetos ligados à Copa, a diferença de preço das obras de modernização de um estádio em comparação com a construção de um novo não passa de 5 a 10%. Outra questão levantada é a diferença entre os custos de mão de obra e de material de construção, que seriam menores no Nordeste em comparação com o Sudeste.
Segundo Ronald Werner, do Vigliecca e Associados, esta diferença não se aplica a estruturas complexas, como as arenas. “A construtora deve ter um ganho com a mão de obra básica mais barata, mas muitos insumos vêm do sul do Brasil, encarecendo o custo total por causa dos fretes”, diz. Ele também explica que o acabamento mais fino e especial é em geral feito por empresas do Sul do país, que levam mão de obra para o Nordeste.
Há ainda o argumento de que o preço do estádio do Corinthians é elevado porque ele será construído com um padrão de qualidade semelhante ao dos melhores estádios do mundo. Por isso, cabe compará-lo ainda àquele que é visto por especialistas como uma das mais modernas arenas existentes: a Allianz Arena, em Munique, na Alemanha.
Inaugurado em 2005, o estádio foi palco da abertura da Copa do Mundo de 2006. Ele tem capacidade para 66 mil torcedores sentados e conta com um estacionamento de mais de 10 mil vagas cobertas. O projeto custou 340 milhões de euros, algo em torno de 780 milhões de reais. Trazido a valores atuais, o valor do estádio chega a pouco mais de um bilhão de reais. Segundo Ronald Verner, cerca de um terço deste valor corresponde ao custo de construção do estacionamento, que é mais de três vezes maior do que o do Fielzão.
“A Alianz Arena é uma das obras primas do futebol mundial, e foi construído em um lugar onde a mão de obra é mais cara. Nós aqui no Brasil estamos invertendo a lógica. Não é viável construir estádios assim”, diz Amir Somoggi, diretor da área de consultoria esportiva da BDO CRS.
Segundo Somoggi, além de ser elevado demais para os padrões brasileiros, o preço do estádio do Corinthians é também perigoso para a saúde financeira do próprio clube e de quem for explorá-lo comercialmente. O especialista explica que um estádio no valor de 500 milhões de reais – bem abaixo do menor preço considerado para o Fielzão – deve gerar um faturamento médio anual de 96 milhões de reais para ser viável financeiramente.
“Sabe quantos estádios brasileiros oferecem isso? Nenhum, zero. Não vai gerar, independente de qual seja o time dono do estádio. O Morumbi é o que garante um dos melhores retornos, e rendeu 56 milhões de reais em 2010. A Copa do Mundo na África do Sul foi um evento de rasgar dinheiro para agradar a Fifa. Parece que vai ser o nosso caso aqui também”, diz Sommogi.
Por hora, o Fielzão segue sem as garantias financeiras necessárias para assegurar que a obra será levada adiante. Segundo o Corinthians, dentro das duas próximas semanas, as questões financeiras do estádio serão definidas. Para garantir a abertura do Mundial em São Paulo, era necessário apresentar as garantias para a construção da arena até o último dia 12 de junho, o que não aconteceu. Sem segurança financeira para a obra e sem estádio, a cidade São Paulo ainda corre o risco de deixar de contar também com a paciência da Fifa. Daí a ficar definitivamente sem a Copa é um passo.