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Ex-deputado é preso em operação da Polícia Federal

Foi preso de forma temporária o ex-deputado federal Charles Lucena (PTB-PE), autor de emendas parlamentares que podem ter sido desviadas


	Polícia Federal: o prejuízo com os desvios dos Ministérios da Agricultura e do Turismo é estimado em R$ 4 milhões
 (Arquivo/Agência Brasil)

Polícia Federal: o prejuízo com os desvios dos Ministérios da Agricultura e do Turismo é estimado em R$ 4 milhões (Arquivo/Agência Brasil)

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Da Redação

Publicado em 15 de março de 2016 às 16h45.

Recife - Um suposto esquema de desvio de verbas dos Ministérios da Agricultura e do Turismo foi o foco da operação Remenda, da Polícia Federal (PF), na manhã de hoje (15) no Recife.

Foram cumpridos mandados em Pernambuco, Ceará, Distrito Federal e Rio de Janeiro.

No Recife, foi preso de forma temporária o ex-deputado federal Charles Lucena (PTB-PE), autor de emendas parlamentares que podem ter sido desviadas. O prejuízo  é estimado em R$ 4 milhões, segundo a PF.

De acordo com a Polícia Federal, as emendas parlamentares custeavam convênios firmados entre 2010 e 2011 pela Organização Não Governamental (ONG) Instituto Brasil de Desenvolvimento Institucional (Ibdi) e os ministérios.

Pelo Ministério do Turismo foram repassados R$ 3 milhões para a realização de cinco vídeos de promoção do turismo em municípios de Pernambuco.

Já com o Ministério da Agricultura, os seis contratos eram para a criação de planos de negócios para arranjos produtivos locais de fruticultores em seis estados, no valor de R$ 1,2 milhão.

A suspeita de irregularidades nos convênios surgiu a partir de uma fiscalização de rotina da CGU.

“Como é de praxe, nosso trabalho procurou a sede do instituto [Ibdi], a gente já viu que não tinha como uma estrutura do Ibdi ter capacidade de executar os projetos do Ministério da Agricultura”, explicou o chefe da CGU em Pernambuco, Victor de Souza Leão.

Mecanismo

O Ibdi subcontratava outras empresas para a realização da ação prevista no contrato.

Ao fiscalizar outras empresas, a CGU encontrou instituições que nunca existiram ou que tinham dois ou três funcionários, apenas para “fingir que funcionavam. Uma delas, a Rede Vida, tem os mesmos funcionários do Ibdi, ou seja, o repasse de dinheiro era feito deles para eles mesmos”, disse o superintendente da Polícia Federal em Pernambuco, Marcello Diniz Cordeiro..

Em uma segunda fase da fiscalização da CGU, ao analisar convênios firmados com o Ministério do Turismo, constatou-se que a sede do Ibdi já não estava em funcionamento. “A organização desapareceu”, explica Souza Leão.

A suspeita dos órgãos envolvidos na operação é que o ex-deputado Charles Lucena seja o intermediador do desvio. Segundo a Polícia Federal, existem provas de que o dinheiro acaba na conta de ex-assessores de Lucena.

“E temos fortes indícios de que a ONG já estava pré-selecionada para receber recursos. Tem que ser feito processo de seleção pública, o que não foi cumprido”, acrescenta o chefe da CGU.

A falha na execução dos serviços contratados também é apontada pela Polícia Federal como um indício de irregularidade.

Um dos exemplos citados pela PF é a criação de seis manuais que integram o plano de negócios dos arranjos produtivos contratado pelo Ministério da Agricultura junto ao Ibdi.

“Cada manual foi contratado por R$ 39 mil para cada estado [onde o convênio foi contratado], mas são todos iguais. Ou seja, só precisaria de um manual”, disse o superintendente da Polícia Federal.

O próprio plano de negócios, também igual para todos os estados envolvidos, continha plágio de outros documentos disponíveis na internet, informou a PF.

A Polícia Federal foi acionada pela CGU para rastrear recursos.

“Seguimos o dinheiro até constatar que, depois do dinheiro passar por tantas contas, ele volta às mesmas pessoas, diretores das ONGs, e, inclusive, um assessor do ex-parlamentar acusado”, revela o titular da Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros e Desvio de Recursos Públicos, da Polícia Federal, Wagner Menezes.

Um dos ex-dirigentes do Ibdi mora em Brasília, onde foi cumprido um mandado de prisão temporária e outro de busca e apreensão. No Rio de Janeiro, um mandado de busca e apreensão teve como alvo a casa de um ex-assessor do ex-deputado Lucena.

“Hoje, foram coletados documentos que não haviam sido obtidos na primeira fase das investigações. O objetivo é chegar a novos nomes e desvios”, resume o delegado da PF.

A Justiça Federal já determinou a apreensão de bens, como veículos, no valor de R$ 700 mil.

No total, foram cumpridos 13 mandados de busca e apreensão, cinco de prisão temporária (mais dois foram solicitados, mas ainda não tinham sido executados) e um de prisão preventiva em Pernambuco, Ceará, Distrito Federal e Rio de Janeiro.

Também estão sendo cumpridos quatro mandados de intimação para depoimento dos investigados, cujos nomes não foram divulgados pela PF.

Os crimes investigados são formação de quadrilha ou bando; peculato ou apropriação indébita de recursos públicos; e lavagem de dinheiro. A pena, caso os suspeitos sejam condenados, é de 1 a 12 anos de prisão.

Ministérios falharam, diz CGU

De acordo com o chefe da CGU em Pernambuco, não se descarta a participação de funcionários dos ministérios no esquema. “É possível, isso tudo está sendo objeto de investigação para identificar a parcela de culpa de cada um”, informou Souza Leão.

É que os ministérios precisam confirmar se a organização que vai receber os recursos pode atender ao convênio.

“O ministério tem dois papeis. Antes de celebrar o convênio ele precisa ver se a ONG tem condições de executar aquele objeto. E o segundo é fiscalizar a execução do objeto. Não é simplesmente repassar o dinheiro”, detalha Souza Leão.

Segundo a CGU, especificamente com relação ao Ministério da Agricultura, no momento em que houve parecer favorável [do ministério] dizendo que o Ibdi tinha condições de executar o convênio, o estatuto da ONG não previa o tipo de atividade contratada.

O chefe da CGU afirma, ainda, que somente em uma data posterior foi feita uma ata e se alterou o estatuto acrescentando a informação.

“A princípio, o parecer é falho. Se ele [o Ministério da Agricultura] aprovou o repasse a uma ONG que não tinha condições de executar, é falho. No segundo momento, na hora de aprovar a prestação de contas, ele reprovou. Então, pode-se dizer que ele atuou a posteriori, mas atuou. Mas na hora de aprovar o convênio houve falha”, disse.

Ex-deputado diz ser inocente

O advogado Francisco de Lacerda, que integra a defesa do ex-deputado Charles Lucena, afirmou que o investigado é inocente.

“Ele fez os devidos esclarecimentos, deixou clara a sua inocência e aguardamos com serenidade que seja revista essa prisão temporária de cinco dias. A única participação dele seria na aprovação das emendas e nada mais, beneficiando suas bases. Qualquer outro desvio é alheio à vontade dele e não seria da competência dele”, declarou.

A defesa de Lucena também negou que ele tenha qualquer ligação com o Ibdi. O instituto tem uma página na internet onde constam os contatos telefônicos da ONG.

A ligação dá sempre ocupada para o telefone divulgado. Por e-mail, a Agência Brasil buscou contato, mas até a publicação da matéria não obteve resposta.

O ex-deputado, que é médico, foi preso em um dos hospitais onde faz plantão. Ele foi levado à sede da Polícia Federal em Pernambuco no início da manhã.

O depoimento, de acordo com o advogado, durou cerca de 1h30. Um mandado de busca e apreensão também foi cumprido na casa de Lucena.

Ele foi deputado federal pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), já foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE) por abuso de poder econômico e político durante campanha eleitoral de 2006, quando foi candidato ao cargo. Acabou sendo declarado inelegível por três anos. A decisão transitou em julgado em 2008.

Em 2010, quando se candidatou novamente a deputado federal, teve a candidatura impugnada pelo TRE-PE, mas o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) permitiu que  fosse diplomado como suplente.

A última eleição a que concorreu foi para vereador, pelo Partido Trabalhista Brasileiro, em 2012. Lucena não foi eleito e declarou à Justiça Eleitoral, à época, R$ 0 como o valor de bens que possuía.

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