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Estudo apoia transferência de leitos privados ao SUS em vez de fila única

Rede pública precisa se preparar para um pico de casos de contágio pelo novo coronavírus no país, esperado para acontecer no fim de abril

Imagens aérea do hospital temporário construído no Estádio do Pacaembu, em São Paulo, para absorver demanda esperada de doentes com novo coronavírus (Imagem do satélite Maxar/Getty Images)

Imagens aérea do hospital temporário construído no Estádio do Pacaembu, em São Paulo, para absorver demanda esperada de doentes com novo coronavírus (Imagem do satélite Maxar/Getty Images)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 7 de abril de 2020 às 12h38.

Última atualização em 7 de abril de 2020 às 13h36.

Com apenas 44% dos leitos para tratamento intensivo do Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) precisa se preparar para um avanço no número de casos da Covid-19, já que o pico do contágio pela doença causada pelo novo coronavírus é esperado para o fim de abril no país.

Uma alternativa a esse cenário, defendida por estudo do escritório Barbosa, Pontes e Gaertner Advogados (BPGA), especializado em relações entre as esferas pública e privada, é a transferência de leitos do Sistema de Saúde Suplementar, que reúne a atividade de planos e seguros privados de assistência médica, para a rede pública, mediante acordo do governo federal com as operadoras de planos de saúde.

Uma outra ideia para o cenário de sobrecarga das UTIs da rede pública, defendida mais cedo neste mês por acadêmicos da USP e da UFRJ, sugere uma fila única ou um estoque único de leitos para absorver o aumento, nos mesmos moldes de filas de doações de órgãos, por exemplo. A concretização dessa plano, no entanto, pode demorar, já que depende da negociação do governo com outras esferas públicas. Na prática, caberia às secretarias estaduais de saúde a organização das vagas.

"Se o governo procurasse a FenaSaúde, que agrega as maiores operadoras, já seria 46% do atendimento. Unimed tem outros 40%. Unidas, outros 15%. Com 3 ou 4 associações, poderia definir um protocolo ao invés de falar com 2 mil hospitais", diz Frederico da Silveira Barbosa, consultor em regulação e especialista em relações com o poder público no BPGA.

O intermédio feito pelos planos permitiria às redes pública e privada manter cada uma das demandas sendo atendidas pelos respectivos sistemas. "Imagine transferir a capacidade hospitalar de unidades privadas ao SUS para montar uma fila única do dia para noite?  Não dá para desmanchar o sistema rapidamente, sobretudo no meio de uma pandemia. Neste momento de crise, a primeira coisa a ser feita é a aproximação das duas filas", diz Barbosa.

Uma unificação da demanda poderia encontrar obstáculos práticos na rotina: "Os profissionais gastariam muita energia com burocracia. É melhor que cada um venha trabalhando como tem feito. Não queremos gerar confusão neste momento", diz.

As classes média e alta no Brasil foram as primeiras a registrar casos de Covid-19, em função de pessoas que viajaram para a Europa, sobretudo Itália,. O vírus, porém, vem se espalhando e, segundo o ministro da sáude, Luiz Henrique Mandetta, deve chegar com mais força às favelas e comunidades a partir de agora, e chegar como uma avalanche aos hospitais públicos.

"De 5 mil leitos de UIT, 3 mil são privados e 2 mil do SUS, enquanto a clientela dos planos deve ser de 30% e a do serviço público, de 70%. Essa situação não é sustentável", diz Barbosa. 

A crise sanitária causada pela pandemia expos a desigualdade entre o sistema público de saúde e o suplementar. Apesar de o número de leitos de UTI no Brasil estar de acordo com a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) - de 1 a 3 leitos para cada 10 mil habitantes -, a Associação de Medicina Intensivista Brasileira (AMIB) estima que metade deles acaba sendo direcionada a um quarto da população, formado de usuários de planos de saúde.

Outro ponto que poderia facilitar um acordo com as operadoras, é o poder de barganha que o governo tem na negociação. Isso porque, em última instância, a Constituição federal permite que as autoridades públicas utilizem a propriedade particular para o atendimento de necessidades coletivas e transitórias, como é o caso atualmente, mas mediante remuneração justa.

"O SUS poderia requisitar até mesmo todos os leitos privados diretamente aos hospitais, indenizando-os por possíveis prejuízos, como perda de receita com operadoras e particulares", diz Barbosa, "no entanto, seria traumático, uma vez que os usuários dos planos poderiam ficar sem atendimento, além da possibilidade de eventual conflito entre níveis federativos".

Uma transferência de leitos ao SUS mais eficiente envolveria apenas a cessão parcial de leitos existentes a serem implantados pelos hospitais privados, defende o estudo, em medida que torne mais justa e menos desigual a oferta dos leitos perante as demandas de cada sistema, mas mantendo-se o funcionamento do setor privado.

Por meio desse plano, ficaria clara a responsabilidade do SUS em pagar à rede hospitalar privada pelos leitos que lhe fossem transferidos os mesmos valores pagos pelos planos de saúde, ou seja, menores do que o valor pago diretamente aos hospitais. "O governo teria na mão o porrete e o plano, a capacidade de organização", diz o advogado.

A transferência de leitos privados ao SUS também beneficiaria as operadoras de planos, que gastariam menos, já que não teriam que arcar com número de atendimentos equivalente às capacidades incorporadas ao SUS.

Já chega a 553 o número de mortes pelo novo coconavírus e a 12.056 o de novos casos confirmados no Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde divulgados nesta segunda-feira, 6. Desde o dia 31 de março, diariamente as novas infecções confirmadas passam ou chegam perto de mil.

Especialistas sugerem, no entanto, que os registros oficiais representam apenas 10% do total real de infectados, já que não há testes para todo mundo. Além disso, muitos casos são assintomáticos.

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