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Erundina ataca PT, Marina e o ‘amigo’ Temer

A deputada federal Luiza Erundina foi companheira de chapa de Michel Temer, de quem se tornou amiga, por causa de uma aliança entre o PT e o PMDB, na disputa pela prefeitura paulistana, em 2004. Na última eleição presidencial, assumiu a coordenação-geral da campanha de Marina Silva à Presidência, mesmo a contragosto, por determinação de […]

ERUNDINA: no quinto mandato de deputada, ela quer fundar o 34o partido do Brasil  / Antonio Milena/ Veja

ERUNDINA: no quinto mandato de deputada, ela quer fundar o 34o partido do Brasil / Antonio Milena/ Veja

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Da Redação

Publicado em 31 de julho de 2016 às 09h55.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h31.

A deputada federal Luiza Erundina foi companheira de chapa de Michel Temer, de quem se tornou amiga, por causa de uma aliança entre o PT e o PMDB, na disputa pela prefeitura paulistana, em 2004. Na última eleição presidencial, assumiu a coordenação-geral da campanha de Marina Silva à Presidência, mesmo a contragosto, por determinação de seu então partido, o PSB. “Sofri, viu?”, relembra. Considera-se uma mulher de partido. Agora, uma das seis representes do PSOL na Câmara dos Deputados, ela se engaja para a criação do Raiz, um novo partido no Brasil, o 34º, que deve estar pronto para disputar as eleições de 2018. Em seu quinto mandato e aos 81 anos, ela critica a atual classe política, fala das tentações da corrupção, conta como gasta seu salário de deputada e diz que não pensa em se aposentar – ela chega a ficar em segundo lugar na disputa pela Prefeitura de São Paulo, a depender do cenário. Leia a seguir a entrevista que Erundina concedeu no salão de festas de seu prédio, na Saúde, bairro de classe média de São Paulo.

A senhora está em seu quinto mandato na Câmara. É verdadeira a afirmação de Ulisses Guimarães de que “se você está insatisfeito com a composição dessa Câmara, então aguarde a próxima”?
Sem dúvida. É incrível como a cada novo mandato vejo uma piora na representação e no desempenho dos parlamentares. Nada me impressiona mais, no entanto, do que a incapacidade do Congresso Nacional de se renovar. Mesmo os parlamentares jovens possuem a mesma cabeça dos parlamentares velhos. Se você analisar os sobrenomes dos atuais membros da Câmara, que conheço melhor, e até no Senado, verá que são os mesmos de sempre. Um é neto de fulano de tal, outro é filho de não sei quem.

A senhora teve de fazer uma vaquinha para pagar uma condenação judicial. O que faz com seu salário? E o que conseguiu acumular nesses trinta anos de política?
Antes de começar a responder, preciso dizer que meu salário de deputada federal é bem elevado para a média salarial do país. Não tenho do que reclamar. Com parte dele, ajudo minha família. Sou responsável pelas despesas médicas de uma irmã e seu marido que moram na Paraíba e estão muito doentes. Também sustento um sobrinho com Síndrome de Down. Só aí vai metade do meu salário. Com a outra parte, pago minhas despesas pessoais. Levo uma vida absolutamente modesta. Moro em um apartamento próprio de dois quartos, com uma sala que serve para receber visitas e de biblioteca. Além disso, tenho um carro usado. Nada além disso. Imagina se eu tivesse que pagar os 400 000 reais que a Justiça me cobrou? Meu apartamento não vale metade disso e, por mais que me baste o salário que tenho, não consegui acumular muitas reservas ao longo da vida. A Justiça bloqueou a minha conta bancária e não consegui sacar um centavo. O que eu poderia fazer? Tive que pedir dinheiro emprestado para amigos e amigas.

Mas o salário pode ser bom, só que mesmo assim os políticos roubam, sempre querem mais…
Primeiro é preciso dizer que as tentações são muito grandes. Você precisa de muita segurança interior para não se deixar seduzir pela corrupção. Quando era prefeita de São Paulo, é claro que poderia ter saído riquíssima. Em qualquer obra, como um simples projeto de canalização de um córrego, falamos sempre de milhões e milhões de dólares. Imagina se eu tivesse superfaturado isso?

O que ajuda a não ceder às tentações?
Venho de uma família pobre do município de Irauna, na Paraíba. A cada nova seca no Nordeste meu pai me carregava, junto com meus irmãos, para um novo lugar. Estávamos sempre fugindo da fome e da sede. Foi essa consciência da realidade, dada no início da minha vida, que me deu ânimo e alento para romper um padrão e entrar na política. Não constitui família porque eu queria mudar o mundo. Politica para mim é opção de vida, é uma opção existencial, é um modo de ser no mundo. É isso que me realiza como ser humano e não gastar um dinheiro ilegítimo, fruto de desvios do dinheiro do cidadão. Se essas pessoas que roubam tivessem descoberto mais cedo qual o real sentido da vida e o que deveria representar a política na nossa vida, certamente não teriam cedido a essas tentações.

Como explicar então que o Partido dos Trabalhadores, que possui muitos fundadores com histórias semelhantes, patrocinou o mensalão e petrolão, os maiores esquemas de corrupção da história do país?
Eu não concordo com a máxima de que o poder corrompe. Acredito, na verdade, que ele fascina. O PT se fascinou pelo poder. De repente, um partido acostumado ao chão de fábrica, sindicatos, luta agrária e periferias conquistou um espaço de poder institucional muito antes de estar preparado. É importante dizer que estou apenas tentando explicar e não justificar os desvios éticos que hoje lamentavelmente estão custando essa tragédia do ponto de vista político e institucional.

O governo Dilma foi responsável pela maior crise econômica no país em trinta anos, com 11 milhões de desempregados, e maquiou o verdadeiro estado das contas públicas para conseguir a reeleição. Como defendê-lo? Não há como. Durante sua Presidência, muitos pontos importantes do campo progressista jamais foram defendidos seriamente por ela. Para piorar, ela não tem aptidão pela política. Durante minha militância nesses últimos trinta anos, jamais vi a presidente Dilma nos enfrentamentos pelo fim da Anistia, pela elaboração da Constituinte ou em outras bandeiras pelo processo de redemocratização do país. Sua luta na ditadura foi generosa e merece ser lembrada. Mas ela não viveu politicamente esse tempo que nos trouxe até aqui e não gosta de política, apesar de não falar isso de forma clara. Vale lembrar que sempre fiz oposição ao seu governo e que, reconheço, é muito difícil que ela tenha condições políticas para governar o país se não for afastada.

Mas por que a senhora mesmo assim não é a favor do impeachment? Porque vejo um problema maior. Não estou defendendo a figura da presidente Dilma Rousseff. Estou defendo a democracia e o Estado de Direito do Brasil. Ela é a primeira mulher que se elegeu presidente do Brasil, 78 anos após as mulheres conquistarem finalmente o direito de votar em um país em que representamos 52% dos eleitores. Vale lembrar que essas conquistas democráticas custaram muito caro para serem descartadas dessa forma, sem que fique comprovado de fato que houve um crime de responsabilidade. Tenho horror em ver aquele monte de homens brancos tomando posse do governo. Sempre disse que, se o crime ficasse claro e evidente, seria a primeira a defender sua saída. Isso não ocorreu.

A senhora defende o “Fora Temer”. Mas ele já chegou a ser até seu companheiro de chapa, na disputa pela prefeitura, em 2004. É a prova de que em política são todos iguais?
De forma alguma. As pessoas podem se juntar. É parte da política. Em 2004, o meu antigo partido, o PSB, se filiou ao PMDB numa composição de chapa mediada pelo Orestes Quércia, principal líder peemedebista de São Paulo da época. Temer, que era pré-candidato, cedeu para ser vice. Foi uma experiência muito rica e interessante. Viramos amigos. Inclusive, tenho uma carta em que ele relata nossa experiência. Não lembro exatamente do conteúdo, mas recordo que tinha lindas palavras sobre nossa convivência durante aquela eleição. No Congresso Nacional, a convivência também sempre foi ótima. Como deputado federal, Temer relatou uma proposta minha de emenda à Constituição que pretende criar uma cota de pelo menos uma mulher na mesa diretora da Câmara. Ele foi aprovado entre deputados, e agora dorme no Senado. Quando presidiu a Casa, nossa relação também foi harmoniosa. Lembro que, quando ele assumiu a articulação política de Dilma Rousseff em 2015, ele sempre me chamava para tomar um café. Como não sou chegada a esses gestos de cortesia, acabei nunca indo.

E o que pensa dele hoje?
Eu sou muito clara no que penso e acredito que ele não foi leal. Ele conspirou contra Dilma durante todo o processo. Ele já preparava discurso antes de Dilma ser afastada e articulou na Câmara para conseguir os votos a favor do impeachment. Isso é injusto. Ele só foi vice porque fez uma coligação com o PT, afinal, Temer nunca foi bom de voto. Na última eleição para deputado federal, ele ficou na rabeira e quase não se elegeu. Quer ser presidente? Então vá buscar voto. Eu não posso concordar que ele tenha cedido a essas tentações pelo poder nesse nível, mesmo que reconheça possíveis méritos que eventualmente ele teve em outros tempos.

O Brasil já possui 33 partidos e, mesmo aquele que a senhora integra, o PSOL, tem apenas seis deputados. Por que pretende criar ainda mais um partido, o Raiz?
Porque acredito que está surgindo uma nova forma de fazer política em que partidos não são apenas partidos, mas também movimentos. O Raiz pretende ser um partido do movimento. Queremos atrair os jovens com capacidade similar ao que o Podemos, na Espanha, e Syriza, na Grécia, conseguiram realizar nos últimos anos. Acredito que o mundo vive uma transformação política em que pessoas querem uma participação mais ativa nas decisões políticas. Todas as decisões são tomadas em rede de forma radicalmente democrática por consenso progressivo. Eu, por exemplo, nunca tive que votar por algo no Raiz. Qualquer assunto que estiver emergindo, qualquer fato que exija uma expressão política, o Raiz irá se expressar. Ele já existe politicamente sem ter obtido todas as assinaturas do TSE. A ideia é que já comece a disputar eleições em 2018.

A Rede, de Marina Silva, já não possui uma plataforma parecida?
Temos também uma identidade ecológica no Raiz, mas as similaridades param por aqui. Acreditamos no socialismo, ela não. Além disso, em relação a valores, certas concepções, a Marina Silva tem muitas restrições ligadas a comportamento e moral, por exemplo. Ela é uma fundamentalista que tem enorme dificuldade em saber se sintonizar com o que é de fato novo. O Raiz tem como princípio básico que não temos direito de impor aos outros convicções religiosas, filosóficas ou políticas. Eu não tolero ninguém que queria impor qualquer coisa. Muito menos uma liderança política.

Por que, então, a senhora aceitou ser chefe de campanha da Marina Silva em 2014?
Estava no PSB e o meu partido me atribuiu essas tarefa. Estava havendo uma crise profunda com a tragédia da morte do Eduardo Campos em um acidente de avião. O então chefe de campanha Carlos Siqueira brigou feio com Marina Silva. Sem outra alternativa, sobrou para mim que eu realizasse o meio de campo entre ela e o partido. Sofri, viu? Não estava convencida da proposta da candidata e estava apenas cumprindo um dever. Minha candidatura para deputada federal ficou às moscas. Se eu não tivesse um grupo de colaboradores que pegou minha campanha e levou para frente, eu não teria conseguido me reeleger. Perdi 30 000 votos na capital em relação a outras eleições. Não foi fácil, mas tarefa partidária é tarefa partidária.

(Pieter Zalis/ Veja.com)

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