Ciro Gomes: o pré-candidato presidencial confia em uma vitória da centro-esquerda na eleição de outubro (Sergio Moraes/Reuters)
Reuters
Publicado em 16 de março de 2018 às 14h46.
Rio de Janeiro - O pré-candidato do PDT à Presidência da República, Ciro Gomes, afirmou que o Banco Central em seu eventual governo terá o chamado duplo mandato para perseguir a menor inflação a pleno emprego, e prometeu livrar o país da conta de juros ao resgatar parte da dívida pública nacional.
O ex-ministro e ex-governador do Ceará afirmou, em entrevista à Reuters, confiar em uma vitória da centro-esquerda na eleição de outubro com uma margem de 12 milhões a 15 milhões de votos, seja com ele ou com um candidato do PT, que, aposta, terá nome próprio na disputa, mesmo se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva for impedido de concorrer.
Para Ciro, seu "dream team" para a disputa eleitoral seria uma chapa com o ex-prefeito petista de São Paulo Fernando Haddad como vice, mas essa possibilidade seria "ínfima". Nesse cenário, ele diz estar "de boca aberta" para o apoio de partidos que não fecharem aliança com candidatos de centro-direita.
O pedetista afirmou que o Brasil precisa de uma profunda mudança da sua estratégia global de desenvolvimento, que inclui um novo regime para a Previdência, uma reforma "por dentro" do sistema tributário e mudanças no Banco Central, que deixaria de ter como única meta o controle da inflação.
"O meu governo considerará o Banco Central mandatado para perseguir a menor inflação a pleno emprego", disse Ciro, citando como exemplo o Federal Reserve dos Estados Unidos.
"O Fed norte-americano não me parece ser um banco central bolivariano, o Fed norte-americano é mandatado a perseguir a menor inflação a pleno emprego. Isso é um mandato contraditório que obriga o Fed a buscar o equilíbrio permanentemente", afirmou Ciro na entrevista realizada na quinta-feira, em um hotel no Rio de Janeiro, em um intervalo entre compromissos de campanha na cidade.
Segundo Ciro, uma independência para o BC depende do cumprimento do mandato pelo banco. "Não um mandato descontinuado, indemissível, o mandato é de executar essa política."
Com o argumento de apresentar de antemão as medidas que pretende tomar na "contramão do ideário neoliberal" para não ser visto como um "caudilho a mais sul-americano a se eleger", Ciro antecipa que se chegar ao poder vai desfazer, com as devidas indenizações, os contratos de concessão para explorações de petróleo fechados pelo governo do presidente Michel Temer, assim como uma eventual privatização da Eletrobras.
"Todos os campos de petróleo que forem vendidos a partir da constância do golpe de Estado, que eu comovidamente afirmo que o nosso país está sob um, e depois da revogação da Lei de Partilha... serão desfeitos os negócios com as devidas indenizações", afirmou, garantindo, no entanto, que ninguém levará calote.
"O que eu estou querendo dizer, na verdade, é o seguinte: não comprem, esperam um pouco, o país vai se recelebrar. Se essa gente ganhar nas urnas, está sanado o vício de origem de deslegitimidade do processo, sou eu que estou errado, vou para oposição, mas por que a gente vai aceitar isso de um governo ilegítimo, que golpeou a democracia do país, que basicamente é controlado por corruptos?"
Ciro se alinha com os que veem o impeachment da então presidente Dilma Rousseff, que levou o vice-presidente Michel Temer ao poder, como um golpe antidemocrático.
Sobre a Eletrobras, cuja privatização é uma das prioridades do atual governo no Congresso, o candidato garante que desfaria a privatização, se ela já tiver sido aprovada, não por "nacionalismo xenófobo", mas por que a venda poderia levar o país a ter de negociar água e energia com o embaixador na China.
"Qual país do mundo entrega seu regime de águas ao capital estrangeiro?", questionou.
Ciro também propõe uma mudança do atual regime da Previdência de repartição para um regime de capitalização, semelhante ao adotado por empresas privadas, em que contratante e contratados dão suas parcelas de contribuição monetária para um fundo.
Segundo ele, o regime atual está falido e a reforma da Previdência proposta por Temer era uma perversidade, que não resolveria o problema estruturalmente e forçaria permanentes mudanças para estancar os déficits anuais.
O candidato ainda disse que gostaria, se eleito, de esgotar discussões e debates sobre a Previdência nos primeiros seis meses de mandato, antes de levar o tema para votação no Congresso. Diferentemente da proposta do atual governo, o projeto de Ciro prevê a inclusão de todas as categorias no novo regime de capitalização, sem criar grupos de exceções.
"Nós estamos tentando reagir a um problema estrutural com puxadinhos, remendos", disse. "Quero iniciar propondo um novo regime, de capitalização", acrescentou.
O grande desafio aqui é a transição, mas não deveríamos, por causa da grande dificuldade da transição, abandonar a melhor ideia, que o mundo inteiro sabe e já está fazendo há muito tempo, porque simplesmente o sistema de repartição não é reformável."
Ciro afirmou ainda que seu governo terá como diretriz livrar o Brasil da alta conta de juros da dívida pública. Quando foi governador do Ceará, disse, comprou com 20 anos de antecedência 100 por cento da dívida do Estado graças a seu "jeito muito austero" de trabalhar.
"Eu vou pagar a dívida, vou livrar o Brasil dessa conta de juros", afirmou. "Evidentemente que no lapso de um governo com esse tamanho de problema não é possível, mas o 'trend' será definitivo no meu governo, o que supõe que eu vou perseguir aquilo que eu já fiz", disse.
"Atenção mercado: eu fui ministro da Fazenda do Brasil. Pesquisem qual foi o maior superávit primário da história brasileira, 'ever', sem rival de segundo lugar, 1994, 5,17 por cento do PIB, eu era o ministro da Fazenda."
Segundo Ciro, seu programa será voltado para "austeridade, poupança, investimento, produção e trabalho, encerrar essa crônica de especulação que está matando o país".
Se eleito, Ciro prometeu também aumentar a tributação sobre as grandes heranças no país, e disse que vai taxar lucros e dividendos, algo que, segundo ele, só Brasil e Estônia não fazem hoje no mundo.
"O tributo sobre heranças no Brasil está tabelado pela Constituição entre 4 e 8 por cento... Nos Estados Unidos a alíquota mínima é 29 por cento", disse, acrescentando que ainda não tem um valor proposto.
Em sua terceira disputa presidencial -ficou em terceiro em 1998 e em quarto em 2002-- Ciro contou na entrevista que ouviu pessoalmente de Haddad, em um jantar recente, que o ex-prefeito paulistano estaria levantando dentro do PT a hipótese de apoio do partido ao pedetista, mas que o aconselhou a não seguir em frente para evitar se desgastar entre os petistas.
Para Ciro, o PT terá candidato próprio à Presidência, seja o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou outro nome, caso Lula seja impedido de concorrer pela Lei da Ficha Limpa.
Uma chapa com Haddad como vice, disse, seria um "dream". "Pode até ser, mas a probabilidade é ínfima, e eu compreendo isso, não tenho nada contra", afirmou.
Segundo Ciro, o PT está preocupado em perder a hegemonia do pensamento de centro-esquerda se Lula for impedido de concorrer pela Justiça --o que ele disse lamentar, mas que reconheceu ser positivo para sua candidatura.
"Enquanto for constante no imaginário brasileiro a possível presença do Lula na eleição, eu sobrevivo, fico entre 8 e 10 por cento com ele candidato, mas a minha expansão está sombreada. Na proporção em que ele saia, ou que a consciência e percepção da sociedade de que ele não participará, isso descomprime... A tendência é que eu assuma crescentemente a responsabilidade por interpretar esse campo da vida brasileira", afirmou.
Na última pesquisa do Datafolha, no final de janeiro, Ciro aparece com até 7 por cento das intenções de voto quando Lula está entre os candidatos. Sem Lula, o ex-governador chega a 13 por cento.
Ciro reconheceu que tem interesse "explícito" em formar uma aliança com o PSB, seu antigo partido, de onde saiu por discordar do desembarque da legenda do governo da então presidente Dilma Rousseff e da candidatura presidencial do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos.
Segundo ele, os socialistas ainda não definiram o caminho que irão seguir na disputa presidencial, mas o autorizaram a "trabalhar por baixo", junto às bases, para conseguir o apoio da legenda.
O pré-candidato do PDT disse que também irá buscar o apoio de partidos que não fecharem alianças com candidatos à Presidência de centro-direita.
"Se eu me viabilizo por mim mesmo, você tem todo um conjunto de possibilidades, inclusive mais ao centro com partidos que não cabem no entulhado campo da centro-direita, porque não tem duas vices. Não vai caber PSD, PTB, PP, PR e PRB, cinco partidos de centro-direita não cabem. Um, dois, três, mas o quarto e o quinto já vão se sentir subvalorizados, e eu estou ali na espreita de boca aberta", disse.
Na avaliação de Ciro, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, será o principal concorrente do outro campo do espectro político, mas tem no PSDB uma "bigorna" a segurá-lo por problemas do passado, como "privatizações escandalosas", e do presente, como as denúncias contra o senador Aécio Neves (MG).
Para o candidato do PDT, o melhor cenário seria enfrentar no segundo turno o deputado Jair Bolsonaro (PSL), apesar de ele ser o atual líder das pesquisas nos cenários sem Lula.
"Será possível que o mundo empresarial brasileiro vai votar no Bolsonaro? Só com medo do capiroto?", disse.
"Eu sonho, rezo, acendo uma vela diariamente para ser um segundo turno contra o Bolsonaro. Menos porque considero mais simples de ganhar, não estou dizendo que é simples, mas mais simples. Mas porque me permite adiantar os acordos reunindo todo Brasil civilizado de um lado só, com o espantalho de uma direita que está propondo campo de concentração para refugiado venezuelano e armar a população para transformar as ruas do Brasil em um faroeste do outro."