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Em 6 meses, Bolsonaro enterrou presidencialismo de coalizão. Isso é bom?

Presidente acumula confrontos públicos e derrotas em votações diante de um Congresso que busca protagonismo e faz avançar a Previdência

Jair Bolsonaro, seis meses de governo (Andre Coelho/Bloomberg)

Jair Bolsonaro, seis meses de governo (Andre Coelho/Bloomberg)

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Clara Cerioni

Publicado em 30 de junho de 2019 às 08h10.

Última atualização em 2 de julho de 2019 às 12h36.

São Paulo — O presidente Jair Bolsonaro chega a seis meses de governo, completados nesta segunda-feira (01), consolidando uma nova era da relação entre os poderes Executivo e Legislativo no Brasil.

O discurso de campanha da "nova política" se traduziu em seis meses de confrontos públicos, deterioração das expectativas econômicas e derrotas em votações.

"Não existe articulação do governo dentro do Congresso, só espasmos, coisas bem pontuais", diz Marcelo Calero, deputado federal pelo Cidadania do Rio de Janeiro e ministro da Cultura no governo Temer, em uma avaliação que é generalizada.

Apesar de ter ministros filiados a partidos e de prometer liberar emendas para quem votar a favor da Previdência, o governo nunca terá uma base aliada majoritária estável no Congresso, afirma Christopher Garman, diretor para as Américas da consultoria política Eurasia.

Se confirmado, seria o fim do modelo de presidencialismo de coalizão, termo criado pelo sociólogo Sergio Abranches para descrever a dinâmica brasileira na qual o presidente compartilha poder e recursos com outras forças políticas em prol de um projeto comum.

A nova estratégia (ou falta dela) gerou uma série de derrotas ao governo no Congresso. A mais significativa foi a ampliação do Orçamento Impositivo, que obriga a execução das emendas de bancada apresentadas por deputados e senadores, tirando a margem de manobra do Executivo no Orçamento.

Mais recentemente, o Senado revogou os decretos sobre posse e porte de armas, uma das principais promessas e marcas públicas do presidente.

O governo também foi derrotado em partes da sua proposta de reestruturação ministerial com a devolução do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) do Ministério da Justiça para a Economia e a manutenção da Funai (Fundação Nacional do Índio) na Justiça e não no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos.

Além de capitanear iniciativas em várias áreas como a Educação, o Congresso também ensaia medidas para limitar prerrogativas do Executivo como a de editar Medidas Provisórias.

"Nada resiste ao vácuo de poder. Se o governo não consegue mostrar para a sociedade que tem uma agenda para o país, o Congresso tem que assumir essa liderança", diz Calero.

Isso parece incomodar o presidente. Em referência ao projeto que transfere a parlamentares o poder de indicar integrantes de agências reguladoras, Bolsonaro reclamou que "querem me deixar de Rainha da Inglaterra”. Reina, mas não governa.

Reformas econômicas

A falta de articulação política do governo atrasou mas não impediu o avanço da reforma da Previdência, emenda constitucional enviada em fevereiro pela equipe de Paulo Guedes, ministro da Economia.

Especialistas atribuem o aparente mistério a fatores como a maturidade da discussão, que vem desde o governo Temer, e sua maior popularidade em um Congresso cada vez mais sensível à opinião pública.

Pesquisas da XP realizadas em junho mostram que 52% dos brasileiros e 56% dos deputados já são favoráveis à reforma da Previdência em tramitação.

A pauta é apoiada pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, que afirmaram recentemente, pela primeira vez, que tem os votos necessários para sua aprovação.

"O grande motor disso é o medo de mais um desastre econômico. Mas aprovada a reforma, qual vai ser a dinâmica daqui pra frente?", questiona Garman. Ele avalia que reformas mais difíceis, como a tributária, dificilmente passarão.

Abranches também é pessimista com a capacidade de um "parlamentarismo branco" gerar estabilidade política no sistema brasileiro.

Por enquanto, o presidente parece ter apostado em uma estratégia de confronto materializada em uma manifestação pró-governo já no final de maio.

"Bolsonaro trouxe a polarização para dentro do governo. Ele usa as suas redes sociais como mecanismo de comunicação, aproveita de sua narrativa bélica e fala basicamente com a própria base", afirma Maurício Moura, fundador do Instituto de pesquisa Ideia Big Data e autor do livro recém-lançado "A eleição disruptiva: Por que Bolsonaro venceu".

A última pesquisa Ibope/CNI, mostra que a taxa de ruim/péssimo do governo cresceu de 27% para 32% de abril para junho enquanto a taxa de ótimo/bom foi de 35% para 32%.

A queda de popularidade tira incentivos para colaboração dos parlamentares ao mesmo tempo em que parece reforçar os instintos do governo.

A aposta é que manter uma base mobilizada, somada com uma melhora econômica, bastaria para colocar Bolsonaro em posição sólida para tentar a reeleição em 2022. A possibilidade de um novo mandato já foi citada publicamente pelo presidente, em uma antecipação inédita do calendário eleitoral.

A primeira grande notícia positiva do governo Bolsonaro só veio na sexta-feira (28), com a conclusão do acordo Mercosul e União Europeia após 20 anos de negociação. Para um governo que fez seis meses parecerem uma eternidade, um feito histórico cai muito bem.

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