Rio de Janeiro: soldados patrulhando a Vila Kennedy em intervenção militar na cidade (Dado Galdieri/Bloomberg)
Da Redação
Publicado em 14 de fevereiro de 2019 às 10h31.
Última atualização em 14 de fevereiro de 2019 às 11h40.
O cenário da violência no Rio de Janeiro pouco se alterou desde o início da intervenção federal na segurança pública no estado, segundo relatório do Observatório da Intervenção, vinculado ao Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes (CESeC/Ucam), lançado nesta quinta-feira (14).
"Durante os dez meses que a gente acompanhou toda a intervenção federal, a gente teve olhar específico para operações que desde o começo se mostraram grandiosas com mais de mil, três mil, quatro mil homens, com resultados pouco expressivos", disse à Agência Brasil o coordenador de Pesquisa do Observatório da Intervenção, Pablo Nunes.
Para se ter uma ideia, no período, o número de mortes violentas no estado teve uma redução pífia: apenas 1,7% em relação ao mesmo período de 2017. Na capital e na Baixada Fluminense, a queda foi mais expressiva com 9,4% e 6,5%, respectivamente. No entanto, esses números foram compensados pelo aumento de 15,8% no número de mortes violentas no interior do estado.
Por outro lado, as mortes por ação de agentes do Estado somaram 1.375 casos, um incremento de 33,6% do que o verificado em 2017, no mesmo período. Os homicídios por ação de agentes do Estado representaram cerca de 22,7% do total de mortes violentas. A média nacional em 2018 foi de 8,1%, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Segundo o Observatório da Intervenção, os tiroteios e disparos de armas de fogo cresceram 56,6% durante a intervenção federal na segurança pública, contra diminuição de 8,2% na apreensão de armas longas.
"Em vez de modernizar, reformar ou mudar, a intervenção levou ao extremo políticas que o Rio de Janeiro já conhecia: a abordagem dos problemas de violência e criminalidade a partir de uma lógica de guerra, baseada no uso de tropas de combate, ocupações de favelas e grandes operações", afirma o relatório.
Por outro lado, o número de policiais militares mortos em 2018 - um total de 92 - foi o menor da série histórica. Isso se deve, segundo a Diretoria de Assistência Social, a cursos ministrados internamente. No total, 99 agentes do Estado morreram nos dez meses de intervenção federal.
Segundo os integrantes do observatório, a intervenção federal focou na redução de crimes contra o patrimônio, em especial o roubo de cargas, que registraram queda no estado 17,2% entre fevereiro e dezembro, enquanto teria ocorrido elevação desse tipo de roubo na Grande Niterói (19,1%) e no interior do estado (46,5 %), o que evidenciaria o deslocamento do crime para o interior fluminense.
O Observatório da Intervenção analisa que o movimento de repressão a roubos de carga registrado a partir de março com o gabinete a intervenção federal foi interrompido no final do ano. Com isso, os números voltaram a subir entre outubro e dezembro de 2018.
"[Houve] aumento no roubo de carga em relação ao ano e até em relação a 2017, porque a intervenção investiu em operações ostensivas para coibir roubos de carga nas operações e nas grandes vias do Rio de Janeiro", afirma Nunes. O cientista social lembrou que é preciso acompanhar a cadeia que envolve este tipo de crime com "operações de inteligência para entender [não só] quem rouba, mas também quem recebe esse material roubado".
Para a coordenadora do Observatório da Intervenção, Silvia Ramos, o modelo militar intervencionista foi pouco efetivo diante de instituições policiais do estado que "necessitam de reformas estruturais, combate à corrupção e choque de eficiência em inteligência".