Nas eleições municipais deste ano, 106 cidades têm um único candidato concorrendo ao cargo de prefeito (Elza Fiúza/ABr/Abril)
Fabiane Stefano
Publicado em 1 de outubro de 2020 às 20h19.
Última atualização em 2 de outubro de 2020 às 07h28.
As eleições municipais de 2020 serão as primeiras sem coligações proporcionais. A alteração, definida na reforma eleitoral de 2017, buscava reduzir a fragmentação partidária. Entretanto, como o eleitor já pode notar, 2020 trouxe uma profusão de candidatos a prefeito: são 1.917 candidatos a mais do que na última eleição municipal.
Dados elaborados por EXAME, a partir da base de informações do Tribunal Superior Eleitoral, mostram que em 2016, eram 390 cidades com seis ou mais prefeitáveis. Neste ano, esse número subiu para 635 municípios. Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, é a única cidade que terá 17 opções na urna. Em 2016 a capital do Mato Grosso do Sul, Campo Grande, chegou a ter 18 candidatos.
“É difícil imaginar outra razão para esse aumento que não o fim das coligações proporcionais. Sem elas, os grandes partidos não têm nada de valioso para oferecer aos pequenos em troca de apoio ao seu candidato a prefeito”, diz o cientista político Cláudio Couto, da Fundação Getulio Vargas.
Couto destaca também que as candidaturas ao Executivo municipal divulgam os partidos, aumentando o voto de legenda para vereador. “Aquele eleitor que não quer anular o voto de vereador, mas não sabe em quem votar, acaba votando na legenda do candidato dele à prefeitura”, diz o professor.
Para um partido, fazer parte de uma coligação para eleições legislativas e dividir seus votos com colegas de partidos aliados pode ser bom — ou não. Historicamente, os partidos nanicos sempre tiraram vantagem nessa relação. Agora, eles terão de conquistar cadeiras com suas próprias candidaturas, apoiando"prefeitáveis" de outro partido apenas nas 95 cidades em que há segundo turno. É isso que causa o milagre da multiplicação dos candidatos.
Mesmo evidente, a proliferação de candidaturas a prefeito é um fenômeno restrito às cidades maiores, que possuem mais diretórios partidários disputando. Dentre cidades pequenas, que são maioria no Brasil, 65% dos municípios terão disputas com, no máximo, três candidatos a prefeito e uma média de 26.000 eleitores. De todas as 5.568 cidades brasileiras, 2.010 terão apenas dois candidatos (o da situação e o da oposição), numa espécie de segundo turno já no primeiro.
Em 106 cidades, uma única pessoa se inscreveu para disputar as eleições. Nesse caso, mais comum nos estados do Paraná, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, basta um único voto válido — até mesmo o do próprio candidato — para decidir o resultado das eleições. Campanha? Não precisa. É o caso de Pimenta Bueno, em Rondônia, onde os 25.416 eleitores têm apenas um candidato para votar. O único interessado em governar essa pequena cidade quase sem área rural ou florestal é o Delegado Araújo, do Patriotas.
"As novas regras eleitorais trazem a percepção de um sistema político em transição. Associada à crise de legitimidade dos últimos anos e às redes sociais, essa sensação também favorece o surgimento de novos candidatos, especialmente de pessoas com forte presença digital", diz Rafael Cortez, cientista político da consultoria Tendências.
Como o tamanho das bancadas e a correlação de forças no Legislativo é o que define uma série de atributos políticos, como distribuição de tempo de TV, Cortez explica que a tendência é que esse fenômeno se torne uma característica estrutural do sistema eleitoral brasileiro, se repetindo também nas eleições de 2022.
O aumento no número de candidaturas a prefeito tende a reduzir só em 2024, quando a cláusula de barreira, que começou a operar em 2018, passe a restringir a participação dos partidos mais nanicos.