João Doria: no setor rodoviário, governador terá que levar adiante a construção do trecho norte do Rodoanel, obra que está parcialmente paralisada por suspeita de superfaturamento (Redes Sociais/Reprodução)
Estadão Conteúdo
Publicado em 5 de novembro de 2018 às 14h43.
Última atualização em 5 de novembro de 2018 às 14h44.
São Paulo - Embora as contas do Estado estejam em dia, o governador eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), herdará da atual gestão uma série de problemas de difícil solução, como obras paradas por abandono de parceiros, contratos com suspeita de superfaturamento, crise financeira nas universidades estaduais, déficit de policiais e fila de exames na rede pública de saúde.
Um dos casos sobre os quais Doria terá de se debruçar é o da construção da Linha 6-Laranja do metrô, que foi paralisada há mais de dois anos pelo consórcio parceiro na obra, formado pelas empreiteiras Odebrecht, Queiroz Galvão e UTC. O contrato está em fase de rescisão por caducidade e o tucano terá de decidir se tentará fazer uma nova Parceria Público-Privada (PPP) ou construir a linha, que ainda está no início, com recursos próprios.
Durante a campanha, Doria prometeu concluir as cinco linhas metroviárias herdadas dos governos Geraldo Alckmin (PSDB) e Márcio França (PSB), incluindo a Linha 6, com 15,3 km de extensão e 15 estações, e enfatizou que priorizaria parcerias com a iniciativa privada.
No setor rodoviário, o tucano terá de enfrentar um problema ainda mais delicado. Com quase três anos de atraso, a construção do trecho norte do Rodoanel está parcialmente paralisada por suspeita de superfaturamento de até R$ 625 milhões nos aditivos que foram assinados pela Dersa com as empreiteiras da obra, entre as quais a OAS, no governo Alckmin.
Os indícios resultaram na prisão temporária de Laurence Casagrande, ex-secretário de Transportes, e de ex-diretores e gerentes da estatal pela força-tarefa da Lava Jato em São Paulo, em junho deste ano. Segundo a Dersa, ainda restam 15% de obra física do trecho norte, que tem 47 km de extensão e deve custar R$ 9,9 bilhões.
As suspeitas de fraude foram levantadas em 2015 por ex-funcionários e apontadas em uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU). O material serviu de base para o Ministério Público Federal (MPF) denunciar criminalmente 14 pessoas por desvio de verba pública.
De acordo com a estatal, o TCU autorizou a continuidade da obra e o governo trata agora a retomada dos canteiros com as empreiteiras, que alegam falta de dinheiro e pedem novos reajustes. Se a negociação não avançar, a Dersa informou que vai propor ao futuro governo a possibilidade do consórcio que ganhou a concessão para operar o trecho assuma a obra.
Carro-chefe da campanha tucana ao governo, a segurança pública também impõe um duro desafio à nova gestão. O maior deles é a recomposição dos quadros da polícia, em especial a Polícia Civil que tem uma defasagem de 12,9 mil agentes, segundo o sindicato da categoria. A maior parte dos cargos vagos, cerca de três mil, é de investigadores. Durante a disputa eleitoral, Doria prometeu contratar 8 mil policiais civis e 13 mil militares, além de investir em inteligência policial.
Com um discurso duro, o futuro governador também prometeu combater o crime organizado que atua no tráfico de drogas e no roubo de cargas e a bancos, mas herdará um sistema prisional superlotado e controlado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC).
Na outra ponta, o tucano precisará agir em conjunto com as prefeituras para enfrentar as cracolândias, que já viram problema sério em 192 cidades paulistas, segundo monitoramento da Confederação Nacional de Municípios (CNM). Quando foi prefeito da capital, Doria lançou o programa Redenção junto com uma operação policial que prendeu traficantes, mas espalhou usuários de drogas pela cidade. Mais de um ano depois da ação, a Cracolândia resiste no centro de São Paulo.
Outro desafio do futuro governador e que passou batido na campanha eleitoral é a crise financeira das três universidades estaduais: USP, Unicamp e Unesp - essa última, por exemplo, tem um déficit orçamentário de R$ 300 milhões que pode levar ao atraso, pelo segundo ano consecutivo, do pagamento do 13.º salário de servidores.
A situação foi agravada pela queda de arrecadação do ICMS em decorrência da crise econômica do País. As três instituições têm como principal fonte de receita a cota fixa de 9,57% do imposto estadual e pedem há anos que o governo aumente essa alíquota.
Na saúde, o desafio mais urgente de Doria será o de reduzir as filas para exame e consultas, que chegam a 1,3 milhão de pessoas. Na campanha, o tucano prometeu levar para o interior e o litoral o programa Corujão da Saúde, adotado por ele na Prefeitura. Neste caso, o governo paga para que pacientes do SUS façam exames em hospitais particulares em horários ociosos, como de madrugada.
Para o cientista político Marco Antônio Teixeira, da FGV-SP, os desafios do futuro governo "são enormes" e foram pouco discutidos durante a eleição. "A campanha ficou muito centrada nos temas da saúde e da segurança pública e muitos outros problemas ficaram à margem, como a baixa qualidade da educação no ensino médio e a evasão escolar", diz.
Procurada pela reportagem, a assessoria de Doria informou que a equipe de transição ainda está fazendo um diagnóstico da situação do Estado, incluindo os problemas que serão herdados e que somente após essa análise será possível estabelecer as prioridades do futuro governo. As reuniões entre os assessores do tucano e do atual governador Márcio França começam nesta semana.