Canavial no interior paulista: de acordo com usineiros, dívida não chega a R$ 50 bilhões (Daniela Toviansky/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 4 de maio de 2014 às 09h32.
Brasília - Defendendo usineiros contra a União há duas décadas, a advogada Anna Paola Zonari, do Dias de Souza Advogados Associados, riu ao ouvir que o governo estima um prejuízo de até R$ 173,5 bilhões, caso seja derrotado nessa disputa. "Esse número é irreal", afirmou. "Pelo que conheço das causas daqui e das de outros escritórios, não chega nem a R$ 50 bilhões."
Ela acredita que o governo esteja usando o dado para pressionar o Judiciário. Quanto mais impressionante a cifra, maior o cuidado dos juízes em impor a fatura aos cofres públicos.
Essa discussão é um dos mais antigos "esqueletos" da União. Ela remonta a 1990, quando os preços do açúcar e do álcool eram fixados pelo governo. Pela lei da época, o valor estabelecido deveria levar em conta os custos de produção, levantados pela Fundação Getúlio Vargas. Mas, reclamam os usineiros, na verdade eles eram arbitrados pelo Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) e, posteriormente, pelo Ministério da Fazenda, levando em conta outros interesses - como o impacto na inflação, por exemplo. Assim, não raro, o preço fixado não cobria de fato o custo de produção.
Segundo Anna Paola, já houve inúmeras decisões no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF) favoráveis ao setor. Mas a decisão vem sendo tomada caso a caso. Em dezembro de 2013, o STJ decidiu favoravelmente aos usineiros numa ação que deverá servir de modelo para as causas semelhantes, no que é chamado de recurso repetitivo. "Mas eles deram com uma mão e cortaram com a outra", disse Anna Paola. Na mesma decisão, o STJ mandou pagar a indenização conforme o prejuízo provocado pela ação do governo em cada empresa.
As usinas não concordaram com o critério de cálculo e recorreram ao próprio STJ, alegando que a apuração do valor da indenização (conforme o prejuízo sofrido por cada empresa) não pode estar desconectada da razão pela qual elas ganharam direito à compensação (o governo haver fixado preços abaixo do custo). E que o STF já reconheceu que o critério do cálculo da perda é pelo preço.
Embora não pareça haver dúvida nos tribunais de que a União deve pagar a indenização, o impacto disso no caixa federal ocorre a conta-gotas. Anna Paola disse que poucas causas sob sua responsabilidade chegaram à etapa final de decisão, após duas décadas. E ainda enfrentam de cinco a dez anos de discussão sobre como será feito o pagamento.
O governo também tem sofrido derrotas em outra causa bilionária, a das prefeituras que reclamam da redução dos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Esse dinheiro, que é uma espécie de "mesada" federal para as prefeituras, vem da arrecadação do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Quando o governo cortou tributos para combater os efeitos da crise, acabou reduzindo o repasse.
"Essa renúncia é ilegítima", disse o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski. A entidade ingressou como interessada nos processos, que foram movidos por prefeituras. Ele alega que a União afetou o balanço federativo ao deixar de pagar às prefeituras um dinheiro com o qual elas já contavam - inclusive porque o próprio Tesouro Nacional divulga, ao início de cada ano, a previsão de pagamentos dos fundos. Segundo Ziulkoski, já houve decisões favoráveis às prefeituras na primeira instância judicial e tribunais regionais. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.