Vale: Diretores afirmam que comando não sabe de detalhes técnicos das barragens (Washington Alves/Reuters)
Reuters
Publicado em 12 de fevereiro de 2019 às 18h43.
Rio de Janeiro - A diretoria da mineradora Vale não havia tido conhecimento dos documentos internos de segurança que indicavam que a barragem que se rompeu em Brumadinho (MG) estava em zona de atenção, afirmou nesta terça-feira a jornalistas o diretor financeiro da companhia, Luciano Siani.
A afirmação vem após a Reuters antecipar na véspera que a empresa estava ciente, no ano passado, de que a barragem de rejeitos da mina Córrego do Feijão, que entrou em colapso no mês passado matando pelo menos 165 pessoas, tinha um risco elevado de ruptura, segundo documentos elaborados por especialistas.
Siani afirmou que é discutível se detalhes técnicos sobre as barragens devem chegar ao nível da diretoria, pois a medida poderia reduzir a agilidade de tomadas de decisões.
Além disso, ele pontuou que as medidas recomendadas pelos documentos, gerados por especialistas nacionais e internacionais, já estavam sendo atendidas pela empresa para agregar maior segurança. Os documentos, segundo o executivo, recomendavam dar sequência a redução do nível de água e avanço para a descaracterização da barragem, o que já estava sendo realizado.
O CFO frisou que a informação recebida pela diretoria foi de que a barragem estava estável.
"Existia muita controvérsia contra essa recomendação de passar detalhes técnicos para a alta gestão", afirmou Siani, em uma coletiva de imprensa na sede da companhia, no Rio de Janeiro.
"A situação é muito parecida com a de um avião. Se um mecânico e um piloto detectam um problema, eles têm que ter autonomia para tomar decisões imediatas no campo e, você escalar isso na hierarquia da empresa, pode significar diferença entre tomar atitude rápida ou não tomar."
Siani destacou que tomou conhecimento do workshop técnico, que deu origem aos documentos, realizado com especialistas internacionais, apenas na segunda-feira.
O rompimento da barragem, que tinha mais de 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro, liberou uma onda de lama que soterrou instalações da empresa, comunidades, matas e afetou rios da região.
"Essa estrutura, além de não ter risco iminente, não obteve nenhum sintoma de problemas e não teve subida de nível. Então, automaticamente, não teve qualquer indicação de ação necessária", afirmou ele, ressaltando que a empresa seguiu todas as recomendações demandadas pela chamada zona de atenção apontada pelos especialistas.
Questionado sobre como era a participação da diretoria da empresa em decisões relacionadas à segurança de barragens, o executivo afirmou que houve entre 2016 e o ano passado 46 reuniões de órgãos da administração relativos ao tema de barragens, mas não entrou em detalhes.
De modo geral, segundo ele, as reuniões sobre barragens apresentavam relatórios de estabilidade para as operações e de acordo com a legislação.
O executivo também afirmou que a barragem tinha 94 piezômetros --equipamento usado para medir o nível de água--, dos quais 46 eram monitorados eletronicamente.
Siani admitiu que quatro deles tiveram problemas na configuração de leitura, o que chegou a apontar problemas aparentes. Mas depois que eles foram configurados corretamente, ficou comprovado pela empresa que estava tudo dentro do esperado.
Relatório apresentado por uma auditoria externa TUV SUD no ano passado atestou a estabilidade da barragem. No documento, entretanto, a consultoria indicou 17 recomendações, todas elas atendidas, segundo Siani. O executivo ponderou que oito já estavam concluídas e nove estavam em andamento, mas dentro do prazo, quando ocorreu o rompimento da barragem.
A empresa permanece sem apontar causas para o rompimento da barragem. O caso ainda está sendo investigado.
Uma autoridade ambiental de Minas Gerais disse à Reuters anteriormente que todas as evidências sobre a possível causa do problema apontavam para a liquefação, processo pelo qual um material sólido como areia perde força e rigidez e se comporta mais como um líquido.
A liquefação foi a causa de outro colapso mortal de barragem em 2015, em Mariana.