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Denúncia não pode ser analisada como uma narrativa de fatos isolados, diz Gonet

O procurador-geral da República afirmou que não é preciso uma "ordem assinada pelo presidente" para caracterizar a tentativa de golpe de Estado

Gonet: PGR defendeu que os atos  (Antonio Augusto/STF/Flickr)

Gonet: PGR defendeu que os atos (Antonio Augusto/STF/Flickr)

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 2 de setembro de 2025 às 12h22.

Última atualização em 2 de setembro de 2025 às 17h35.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, defendeu ao ler o seu parecer em que pede a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e dos outros sete réus que a denúncia sobre a tentativa de golpe de Estado não deve ser analisada como "uma narrativa de fatos isolados". 

"A denúncia apresentada não pode ser analisada como uma narrativa de fatos isolados, mas sim, contemplada como o relato de uma sequência de atos para a finalidade má sã, provocando o resultado que a legislação pune", disse.

Gonet disse que não é preciso uma "ordem assinada pelo presidente" para caracterizar a tentativa de golpe de Estado. O PGR argumentou que a tentativa de golpe se revela na prática de atos e de ações "dedicadas ao propósito da ruptura das regras constitucionais sobre o exercício do poder, um apelo ao emprego da força bruta, real ou ameaçada".

"Para que a tentativa se consolide não é indispensável que haja ordem assinada pelo presidente da República. Não é preciso esforço intelectual extraordinário para reconhecer que, quando o presidente da República e depois o ministro da Defesa convocam a cúpula militar para apresentar documento de formalização de golpe de Estado, o processo criminoso já está em curso", disse o PGR.

Ele reforçou que todas as ações da suposta organização criminosa revelam uma "composição geral dos eventos" que buscavam a "quebra da normalidade democrática". 

Um dos argumentos da defesa de Bolsonaro e de outros réus é que não houve ordem formal, como um decreto assinado, de qualquer medida buscando uma ruptura institucional.

O procurador afirmou que a trama não pode ser tratada como uma situação de pouca importância ou como "devaneios utópicos anódinos". Gonet disse ainda que a acusação não se sustenta com "suposições frágeis", mas em documentos produzidos pelos próprios integrantes da suposta organização criminosa.

"Ainda que nem todos os denunciados tenham ativamente, todos colaboraram, na parte que lhes coube, em cada etapa do planejamento do golpe. Todos os personagens do processo são responsáveis pelos eventos que se concatenam entre si", afirmou.

Gonet afirmou ainda que não punir a tentativa de golpe "recrudesce ímpetos de autoritarismo" e compromete a "vida civilizada".

"Constituição dispõe de meios para talhar investidas contra ela própria. Punir a tentativa frustrada de ruptura contra a ordem democrática é imperativo de estabilização do próprio regime. Não reprimir criminalmente tentativas dessa ordem recrudesce ímpetos de autoritarismo e põe em risco um modelo de vida civilizado", afirmou.

O PGR citou os ataques às urnas eletrônicas, as falas de Bolsonaro nas manifestações de 7 de setembro de 2022, a blitze da Polícia Rodoviária Federal (PRF) realizadas no segundo turno e os atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 como exemplos de ações coordenadas para a abolição do Estado Democrático de Direito.

"O 8 de janeiro de 2023 pode não ter sido o objetivo principal do grupo, mas passou a ser desejado e incentivado, onde se tornou a verdadeira opção disponível. A ideia de manifestações na Praça dos Três Poderes, especialmente diante do Supremo e do Congresso Nacional, já estava no painel de ações do grupo", afirmou.

A sustentação de Gonet ocorreu após o ministro Alexandre de Moraes, relator da ação, ler o relatório com o resumo de todas as etapas percorridas no processo, desde as investigações até a apresentação das alegações finais, última fase antes do julgamento.

O julgamento foi suspenso e voltará às 14h, quando os advogados dos réus serão convidados a subir à tribuna para as sustentações orais em favor dos réus. Eles terão prazo de até 1 hora para suas considerações.

O primeiro será o advogado do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, delator no caso.

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