Moraes deu 48 horas para a defesa de Bolsonaro apresentar esclarecimentos (Mateus Bonomi / AFP)
Agência de notícias
Publicado em 22 de agosto de 2025 às 19h45.
Última atualização em 22 de agosto de 2025 às 20h35.
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) negou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que ele tenha planejado pedir asilo à Argentina e que tenha descumprido medidas cautelares impostas pela Corte. Os esclarecimentos foram apresentados por determinação do ministro Alexandre de Moraes, após a Polícia Federal (PF) apontar o desrespeito às obrigações.
Os advogados dizem a Moraes que Bolsonaro nunca esteve proibido de usar o "WhatsApp, de trocar mensagens e de se manifestar".
"A tentativa de incriminar o envio de mensagens privadas para sua lista de contatos é, de um lado, dar uma interpretação elástica às medidas cautelares impostas que, pelo contrário, deveriam ter sempre leitura restrita e precisa", argumentam os advogados de Bolsonaro.
A PF relatou o descumprimento das cautelares no mesmo relatório em que indiciou Bolsonaro e um de seus filhos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), por coação no curso do processo abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Os dois são suspeitos de utilizarem sanções aplicadas pelos Estados Unidos para atrapalhar a ação penal da trama golpista.
Na quarta-feira, após a apresentação do relatório, Moraes deu 48 horas para a defesa de Bolsonaro apresentar "esclarecimentos sobre os reiterados descumprimentos das medidas cautelares impostas, a reiteração das condutas ilícitas e a existência de comprovado risco de fuga".
O pedido foi feito por Moraes após a PF encontrar uma carta com um pedido de asilo político ao presidente da Argentina, Javier Milei, no celular de Bolsonaro. O documento, de 33 páginas, prevê uma alegação de perseguição política no Brasil. “De início, devo dizer que sou, em meu país de origem, perseguido por motivos e por delitos essencialmente políticos. No âmbito de tal perseguição, recentemente, fui alvo de diversas medidas cautelares”, diz o texto.
A defesa do ex-presidente argumenta, no entanto, que a carta foi enviada a ele como uma "sugestão", mas que em nenhum momento ele cogitou fugir do país para escapar do processo. Os advogados citam o fato que o documento foi enviado há mais de um ano, em fevereiro de 2024, e que desde então Bolsonaro cumpriu todas as obrigações impostas pela Justiça.
Bolsonaro está em prisão preventiva, em regime domiciliar, desde o início de agosto. A prisão foi decretada justamente devido ao descumprimento de outras cautelares, que tinham sido impostas por Moraes em julho, como a proibição do uso de redes sociais, mesmo que por terceiros.
Agora, a PF apontou novos indícios de desrespeito à proibição do uso de redes sociais, como o envio por WhatsApp de vídeos que depois seriam publicados por outras pessoas nas plataformas.
Segundo o relatório, o ex-presidente atuou para "propagar e amplificar por meio das redes sociais ataques em face de ministros do Supremo Tribunal Federal e dos chefes do Poder Legislativo (Câmara dos Deputados e Senado Federal), de modo a coagir e restringir o livre exercício dos poderes constituídos, visando impor a votação de proposta de anistia e de destituição de ministros do Supremo Tribunal Federal por supostos crimes de responsabilidade".
O documento, de 33 páginas, em que Bolsonaro solicita asilo a Milei, cita as medidas cautelares e o argumento de perseguição política para justificar o pedido de asilo. “De início, devo dizer que sou, em meu país de origem, perseguido por motivos e por delitos essencialmente políticos. No âmbito de tal perseguição, recentemente, fui alvo de diversas medidas cautelares”, diz o texto.
Segundo análise da perícia, o arquivo foi salvo no aparelho no dia 10 de fevereiro de 2024, dois dias após o ex-presidente ter seu passaporte apreendido. No dia 12 do mesmo mês, ex-mandatário foi à Embaixada da Hungria no Brasil, onde ficou por duas noites.
Para os investigadores, a carta endereçada a Milei, um aliado, revela que o ex-presidente planejou fugir do país para escapar de eventuais punições. “Embora se trate de um único documento em formato editável, sem data e assinatura, seu teor revela que o réu, desde a deflagração da operação Tempus Veritatis, planejou atos para fugir do país, com o objetivo de impedir a aplicação de lei penal”, diz o relatório da PF.
O argumento de que se tratava apenas de uma sugestão, mas que nunca foi levada adiante, também já foi utilizada pelo ex-presidente em outros momentos, como no caso da discussão de uma minuta golpista. Em interrogatório ao STF, em junho, Bolsonaro admitiu ter apresentado a comandantes das Forças Armadas um documento no qual previa alternativas diante da derrota eleitoral de 2022, quando Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito. Segundo o ex-presidente, porém, as medidas foram descartadas e não havia “clima”, “oportunidade” e “base minimamente sólida para qualquer coisa”.
Ao indiciar Bolsonaro por coação à Justiça no processo da trama golpista, a PF também afirmou que o ex-ministro Walter Braga Netto, réu na mesma ação, descumpriu a proibição de entrar em contato com o ex-presidente. Foi encontrada uma mensagem enviada pelo militar ao aliado afirmando que estava com um novo número “para qualquer emergência”.
A investigação ainda evidenciou o uso do tarifaço imposto ao Brasil pelo governo de Donald Trump como barganha para livrar o ex-presidente de punições. As conversas de Bolsonaro com o filho e com o pastor Silas Malafaia, também investigado no caso, mostram como as tarifas impostas pelos EUA foram utilizadas para pressionar por uma anistia direcionada ao próprio ex-presidente.
A estratégia foi evidenciada em mensagem enviada por Eduardo ao pai em 7 de julho, no mesmo dia em que Trump fez uma publicação criticando o processo criminal contra o aliado. O deputado considerou que uma “anistia light”, que beneficiaria apenas os executores do 8 de Janeiro, encerraria a “ajuda” dos EUA. Com isso, indicou que seria necessária uma medida mais ampla, que beneficiaria Bolsonaro também.
"Se a anistia light passar, a última ajuda vinda dos EUA terá sido o post do Trump. Eles não irão mais ajudar. Temos de decidir entre ajudar o Brasil, brecar o STF e resgatar a democracia OU enviar o pessoal que esteve num protesto que evoluiu para uma baderna para casa num semiaberto", escreveu Eduardo, na ocasião.
Segundo o parlamentar, Bolsonaro corria o risco de ficar sem o "amparo dos EUA” e acabar “igualmente condenado no fim de agosto". Dois dias depois, Trump anunciou o tarifaço e citou o julgamento de Bolsonaro como um dos motivos.