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Defesa de Bolsonaro e críticas a delação de Cid: o que aconteceu no 2º dia do julgamento

Maioria dos advogados afirmaram que o direito de defesa foi cerceado pela forma em que as provas foram disponibilizadas pela PF

 (Gustavo Moreno/STF/Flickr)

(Gustavo Moreno/STF/Flickr)

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 3 de setembro de 2025 às 13h08.

O segundo dia do julgamento da denúncia do ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus acusados de tentativa de golpe de Estado em 2022 foi mais curto, com apenas uma sessão pela manhã.

A fase de sustentação oral das defesas foi finalizada nesta quarta, com a fala dos advogados de quatro acusados.

O destaque foi a apresentação dos argumentos dos defensores de Bolsonaro, apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como líder da suposta organização criminosa.

Os advogados Celso Vilardi e Paulo Cunha Bueno defenderam que não há "uma única prova" que ligue Bolsonaro a suposta tentativa de golpe de Estado. Além disso, a defesa criticou como as provas foram disponibilizadas e contestou a delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens.

Os advogados Matheus Milanez, do general e ex-ministro Augusto Heleno, Andrew Farias, do ex-ministro Paulo Sérgio Nogueira, e José Luis Oliveira Lima, do ex-ministro Walter Braga Netto, também fizeram coro nas críticas a disponibilidade de provas pela Polícia Federal e nas argumentações de acusação da PGR.

O julgamento foi suspenso após a sustentação do advogado do ex-ministro Walter Braga Netto.

Na próxima sessão, marcada para o dia 9 de setembro, a expectativa é que ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, inicie a leitura de seu voto.

A ação vai decidir se o grupo será condenado ou absolvido da acusação. O julgamento pode resultar na prisão de um ex-presidente da República e de generais do Exército.

Veja os principais pontos do segundo dia do julgamento:

Defesa de Heleno pede nulidade da ação

A defesa do general e ex-ministro Augusto Heleno argumentou que o "excesso de documentos" apresentados de "forma desordenada" dificultou a análise das provas na ação penal que acusa o general de ter participado da articulação de uma tentativa de golpe de Estado e pediu nulidade da ação penal. 

"Um arquivo tinha 125 GB de arquivos compactados. Todo o material soma mais de 20 TB compactados e, descompactado, ultrapassa os 70 TB. Isso impossibilitou o trabalho da defesa técnica", afirmou o advogado Matheus Milanez.

O advogado afirmou que o link disponibilizado tinha “uma montanha de documentos, excesso de documentos com nomes que não se entendem”. A defesa pediu que as provas fossem catalogadas, mas a solicitação foi negada pelo Tribunal.

Durante sua intervenção, Milanez questionou a validade do sistema acusatório, citando o alto número de perguntas feitas pelo ministro relator Alexandre de Moraes durante o interrogatório. Segundo o advogado, enquanto o Ministério Público fez 59 perguntas, Moraes fez 302.

Advogado Matheus Milanez (Rosinei Coutinho/STF/Flickr)

Na defensa da absolvição do general, o defensor disse que Heleno se afastou do ex-presidente Jair Bolsonaro após a ascensão do Centrão no governo, em meio à pandemia, e por isso não atuava como planejador de qualquer suposta tentativa de golpe.

Ao citar a agenda pessoal de Heleno, uma das principais provas usadas pela PGR em sua denúncia contra o general, Milanez diz que o documento era "somente suporte da memória do próprio general" e foi usado fora de ordem e que "induziu a erro". 

"Não há uma prova" que ligue Bolsonaro ao plano de golpe, diz defesa

Na sua argumentação, a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou que não há "uma única prova" que ligue Bolsonaro à suposta tentativa de golpe de Estado em 2022. Os defensores criticaram como as provas foram disponibilizadas pela Polícia Federal e contestaram a delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens.

"Esse papel, essa minuta, esse depoimento, não há uma única prova que conecte o presidente Punhal Verde e Amarelo à Operação Luneta e ao 8 de janeiro. Aliás, nem o delator, que mentiu contra o presidente da República, mencionou qualquer participação em Punhal, Luneta ou 8 de janeiro", afirmou o advogado Celso Vilardi.

A manifestação de Bolsonaro foi dividida entre Vilardi e o advogado Paulo Cunha Bueno.

Na avaliação do defensor, Bolsonaro foi "dragado" para o processo em "uma denúncia baseada em um general que imprime uma minuta no Palácio e em uma delação".

Sobre a delação de Mauro Cid, Vilardi afirmou que o ex-ajudante de ordens não é "confiável", por alterar sua versão dos fatos diversas vezes. O defensor classificou a delação como "mentirosa".

Em relação ao acesso às provas, ele citou o volume de 70 terabytes de documentos, que, segundo ele, não deu tempo suficiente para análise técnica da defesa. Vilardi afirmou que "não conhece o conteúdo completo do processo e das provas" por esse motivo.

O defensor disse ainda que reuniões com os embaixadores e de 7 de dezembro não podem ser tratadas como atos preparatórios de crime, sob risco de violar o princípio da taxatividade do direito penal. 

“Não se pode punir um ato preparatório", disse o advogado. Vilardi defendeu que Bolsonaro agiu para garantir a ordem e citou que ele pediu que os caminhoneiros desobstruíram as vias após as eleições de 2022 e facilitou a transição de governo. 

Ex-ministro da Defesa atuou para 'demover' Bolsonaro, diz advogado de Nogueira

O advogado Andrew Fernandes Farias negou que o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira tenha participado de uma suposta trama golpista.

Segundo o defensor, Nogueira atuou, na verdade, para "demover" o ex-presidente Jair Bolsonaro de adotar medidas de exceção após a derrota eleitoral em 2022.

"O general Paulo Sérgio atuou para demover o presidente (Bolsonaro) de caminhar por qualquer medida de exceção. A inocência do general Paulo Sérgio, segundo a delação (de Mauro Cid), o depoimento da principal testemunha de acusação, é manifesta", disse Farias.

Advogado Andrew Fernandes Farias (Rosinei Coutinho/STF)

O ex-ministro é acusado pela PGR de elaborar medidas para evitar a posse do presidente Lula e manter Bolsonaro no poder.

O advogado sustentou que o general “não fazia parte dessa organização criminosa” e, por esse motivo, “sofreu ataques virtuais” de apoiadores do ex-presidente.

Farias afirmou que está provado nos autos que o "general Paulo Sérgio é inocente".

Defesa de Braga Netto pede anulação de delação de Cid

A defesa do general da reserva Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e ex-chefe da Casa Civil, afirmou que a delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, é uma "farsa e mentirosa" e pediu anulação da peça.

O advogado José Luis Oliveira Lima afirmou que não há provas que conectem Braga Netto a uma tentativa de golpe, exceto por uma "delação mentirosa e oito prints de tela adulterados".

"Não se pode condenar alguém com base em uma narrativa. A condenação precisa ser feita com base em provas", disse Oliveira Lima.

Braga Netto encontra-se preso preventivamente e é apontado pela Procuradoria Geral da República (PGR) como uma figura central na tentativa de golpe.

Oliveira Lima declarou ser favorável ao instituto da delação premiada, mas defendeu que ela deve ser fundamentada em coerência e provas. Ele ressaltou que Cid mudou sua versão diversas vezes e omitiu fatos importantes.

O defensor também destacou vícios na colaboração, como o acordo firmado pela Polícia Federal e o colaborador sem a participação do Ministério Público.

"Não se pode condenar alguém com base em narrativas. E o Ministério Público não apresentou nenhuma prova. Não por incompetência ou inércia, mas porque não as tem em relação a Walter Braga Netto. Com toda essa quantidade industrial de documentos, o que temos contra Braga Netto é essa delação e oito prints", afirmou.

O que vai acontecer no 3º dia do julgamento?

Na próxima sessão, marcada para o dia 9 de setembro, a expectativa é que ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, inicie a leitura de seu voto.

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