Brasil

De isenção de visto a tom conciliador: O que Bolsonaro foi fazer na Ásia

Na semana em que vazamento de óleo e aprovação da Previdência dominaram manchetes, presidente passou por Japão e China e segue para o Oriente Médio

Jair Bolsonaro e Xi Jinping: na China, o presidente anunciou isenção de vistos para chineses (Isac Nóbrega/ Palácio do Planalto/Divulgação)

Jair Bolsonaro e Xi Jinping: na China, o presidente anunciou isenção de vistos para chineses (Isac Nóbrega/ Palácio do Planalto/Divulgação)

CC

Clara Cerioni

Publicado em 26 de outubro de 2019 às 08h20.

Última atualização em 26 de outubro de 2019 às 08h20.

São Paulo — Enquanto o Nordeste enfrenta o maior vazamento de petróleo em extensão da sua história e seu partido, o PSL, racha em meio a disputas internas, o presidente Jair Bolsonaro está a 16 mil quilômetros do Brasil em um tour pela Ásia e pelo Oriente Médio.

Em doze dias de viagem, a mais longa desde que assumiu o mandato, ele já visitou o Japão e a China. Agora, passa pelos Emirados Árabes, Catar e Arábia Saudita. Com retorno marcado para o próximo dia 30, o presidente não se envolveu em nenhuma grande gafe - por enquanto.

Desde o início, com parada no Japão, o presidente tem mantido um tom apaziguador, já que um dos principais objetivos das visitas é aumentar as possibilidades de acordos econômicos. No primeiro evento oficial, a cerimônia de entronização do imperador japonês Naruhito, Bolsonaro se vestiu com sete condecorações e a faixa presidencial. 

Em Tóquio, Bolsonaro, em tom de brincadeira, disse que não iria comer carne nos restaurantes locais enquanto os japoneses não abrirem seu mercado para suínos e bovinos do Brasil.

A ofensiva para expandir as exportações tem sido conduzida pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, com apoio dos ministros Ernesto Araújo, das Relações Exteriores, que estão na comitiva. Mais quatro chefes de pastas também participam: Onyx Lorenzoni, da Casa Civil, Osmar Terra, da Cidadania, Bento Albuquerque, de Minas e Energia, e Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional.

Apesar da importância econômica do tour, não acompanharam o presidente nem o ministro da Economia, Paulo Guedes, nem o da Infraestrutura, Tarcísio Freitas.

Guedes ia para a Arábia Saudita mas cancelou para ficar no país "dedicado à agenda econômica", de acordo com a assessoria. A expectativa é que seja apresentado um pacote de propostas na terça-feira (29).

De concreto, a passagem pelo Japão resultou em um avanço para viabilizar o acordo comercial entre o Mercosul e o país asiático. Segundo Bolsonaro, o início das negociações será formalizado em novembro, quando Abe vai ao Brasil.

“Demos mais um passo na questão (do acordo) do Mercosul. Há interesse por parte dele (Abe) também”, declarou. Questionado se é possível oficializar o início do acordo no próximo mês, com a visita de Abe ao Brasil, o presidente respondeu que sim. “Não há a menor dúvida”, enfatizou.

"Um país capitalista"

Após ter feito declarações críticas à China durante as eleições do ano passado, quando chegou a dizer que os chineses estavam "comprando o Brasil", Bolsonaro mudou de tom em sua primeira passagem pelo país. 

A China é o maior parceiro comercial do Brasil, e o presidente destacou, em Pequim, que há interesse mútuo de ampliar ainda mais este fluxo e que está disposto a fazer o possível para que isso ocorra. “Essa é a prioridade número um”, afirmou.

Indagado por apoiadores para explicar o motivo da sua presença em um país comunista, ele respondeu: “Estou em um país capitalista”. A fala foi feita no mês em que a República Popular da China completa 70 anos da revolução comunista.

O primeiro grande anúncio do presidente foi a isenção dos vistos de turista e de negócios para 1,4 bilhão de chineses. No entanto, o chefe do Itamaraty foi mais ponderado: “Vamos ver os passos… Seria uma medida grande, dada a demanda que certamente vai gerar. Vamos ver os passos que seriam necessários”, disse Ernesto Araújo.

A abertura, que não será recíproca, foi divulgada a um grupo de cerca de 20 presidentes de empresas chinesas de setores como infraestrutura, logística, agronegócio e comércio digital. Entre os participantes estavam Wang MingQiang, CEO do Alibaba, Feng Yong Fang, presidente do Grupo de Investimentos CRCC (infraestrutura), e Yu Songho, presidente do HeRun Group, um dos maiores importadores de soja do país.

O empenho de atrair os investidores chineses também foi notado no discurso de Bolsonaro ao abrir um fórum de negócios com empresários do país.

Bolsonaro se mostrou “honrado e feliz” de estar na China e classificou sua presença como “uma prova concreta” de que o atual governo brasileiro quer “mais que aumentar, diversificar” o entorno de negócios. “Não há país que não queira conversar conosco, afinal de contas o Brasil mudou, e mudou para melhor”, garantiu.

Um ponto de tensão entre a China e os Estados Unidos, que são aliados do governo brasileiro atual, envolve a tecnologia de internet 5G, dominada pela Huawei, gigante chinesa de telecomunicações. Apesar dos questionamentos se Bolsonaro vai aprovar a entrada do serviço, ele declarou que a pauta "não está no radar".

Durante a viagem, a conta oficial do presidente no Twitter divulgou algumas de suas ações como a liberação de mais uma parcela do FGTS. A rede social é bloqueada no país, mas estrangeiros usam tecnologia VPN para utilizá-la no território.

O mais provável é que as publicações tenham sido feitas pelo seu filho Carlos Bolsonaro, que na semana passada deixou claro que tem acesso ao perfil do presidente.

Oriente Médio

Nos próximos dias, o presidente visitará os Emirados Árabes, o Catar e a Arábia Saudita, que também são importantes parceiros comerciais.

Entre janeiro e setembro deste ano, o Brasil vendeu aos 22 países da Liga Árabe US$ 9,3 bilhões, alta de 13% na comparação com o ano passado. O superávit foi de US$ 4,2 bilhões. Entre os principais produtos exportados estão carne bovina e de frango, além de milho, ferro, soja e açúcar.

Assim como na China, o presidente deve adotar um discurso conciliador. A esperança é de superar a desavença diplomática travada com nações árabes no ano passado devido a uma proposta de transferir a embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, questão sensível para o mundo árabe já que a cidade também é reivindicada como capital da Palestina.

Na passagem desta viagem, o objetivo é dar continuidade de um trabalho iniciado pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que visitou a região no mês passado. Nos dias que passou no Oriente em setembro, a ministra conseguiu fazer o Brasil voltar a vender produtos lácteos para o Egito e apresentou propostas de investimentos.

Em seu último dia de viagem, Bolsonaro deve participar do fórum "Davos do Deserto", que acontece desde 2017, onde se encontrará com representantes dos fundos soberanos da região.

Há a possibilidade de que ele se encontre com o príncipe herdeiro saudita, Mohammad bin Salman, alvo de questionamentos internacionais por ser apontado como comandante do assassinato do jornalista Jamal Khashoggi na embaixada saudita na Turquia.

A expectativa é que Bolsonaro apresente propostas de negócios militares, com destaque para o avião de transporte multimissão KC-390, da Embraer. 

Apesar do clima harmonioso da viagem, Bolsonaro retorna ao Brasil com a necessidade de lidar com as consequências do derramamento de óleo nos nove estados da região. De positivo, terá na agenda a assinatura da reforma da Previdência, principal pauta do seu primeiro ano, e cuja aprovação no Senado ele classificou como uma "vitória" durante a viagem.

Acompanhe tudo sobre:Arábia SauditaÁsiaCatarChinaEmirados ÁrabesExportaçõesJair BolsonaroJapãoOriente Médio

Mais de Brasil

Inmet prevê chuvas intensas em 12 estados e emite alerta amerelo para "perigo potencial" nesta sexta

'Tentativa de qualquer atentado contra Estado de Direito já é crime consumado', diz Gilmar Mendes

Entenda o que é indiciamento, como o feito contra Bolsonaro e aliados

Moraes decide manter delação de Mauro Cid após depoimento no STF