Presidente da Câmara, Eduardo Cunha: "caso de Eduardo Cunha é o mais longo da história do Conselho de Ética", diz relator (Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 3 de maio de 2016 às 17h56.
Repórter de TV e radialista em Rondônia, Marcos Rogério, de 37 anos, foi vereador de Ji-Paraná antes de ser eleito deputado federal em 2010. Reeleito em 2014 também pelo PDT, foi escolhido no final do ano passado como relator do processo de cassação de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.
Hoje no DEM, Marcos Rogério está na reta final para apresentar o parecer que será analisado pelo Conselho de Ética. Sua meta é finalizar o trabalho até o começo de junho. Em entrevista exclusiva a EXAME, o deputado nega que irá examinar apenas se Cunha mentiu sobre a existência de contas no exterior – deixando de fora as acusações de corrupção.
“Se ficar provado que ele prestou informação falsa, a pergunta é: qual foi a motivação? Foi apenas negar a existência ou foi ocultar uma prática criminosa, que também caracteriza quebra de decoro, mas mais grave, mais violenta contra o interesse do público? Isso tem que ser analisado na confecção do parecer”, diz Marcos Rogério.
Setenta e sete por cento dos brasileiros querem a cassação do mandato de Cunha. Como explicar para a sociedade brasileira a lentidão do Conselho de Ética em tomar uma decisão sobre o futuro de Cunha na Câmara dos Deputados?
A sociedade tem acompanhado, especialmente nos últimos tempos, o desenrolar de vários processos. Seja o processo relacionado à Presidência da República, sejam as ações penais no âmbito do Judiciário, seja o processo disciplinar do deputado Eduardo Cunha aqui no Conselho de Ética. Com a dinâmica das informações, a sociedade acaba vendo por que os processos andam tão vagarosamente. O caso de Eduardo Cunha é o mais longo da história do Conselho de Ética.
Trata-se de um caso complexo, mas a demora se dá, sobretudo, devido às manobras que ele junto com a sua equipe praticam. Ele tem usado de instrumentos regimentais para segurar o processo e, infelizmente, quando não tem meios regimentais, aí usa a força que tem, da presidência da Câmara e de seus aliados junto à Mesa Diretora.
Várias decisões tomadas pela vice-presidência da Câmara (deputado Waldir Maranhão, do PP-MA), que resolve as questões ligadas ao deputado Eduardo Cunha, foram decisões totalmente antirregimentais, ilegais. Isso acaba travando o processo.
Não posso falar muito de mérito porque, qualquer coisa que eu fale, o presidente da Câmara já entra com um recurso novo querendo anular tudo. É um processo complexo, mas que envolve uma pessoa que conhece bem o regimento e que usa o poder que tem para tentar travar o processo.
Não há previsão de quando o processo vai acabar?
A fase em que o deputado Eduardo Cunha conseguia fazer mais manobras, a da admissibilidade, passou. Ficamos mais de 90 dias tentando fazer a aprovação dessa fase, o que é um absurdo. A admissibilidade é uma questão formal na qual você verifica se tem elementos que justifiquem a investigação. Não pode demorar tanto tempo.
A segunda fase, a de instrução e julgamento, não depende muito da defesa nem muito dos aliados dele. É o relator que dirige os trabalhos. Estou procurando cumprir os prazos regimentais. O nosso prazo termina no dia 19 de maio. Já encerrei a oitiva das testemunhas de acusação e agora estou no prazo da oitiva das testemunhas de defesa.
Até agora não apareceu nenhuma testemunha de defesa. Se não vierem, no dia 19 pretendo encerrar a instrução do processo. Depois disso, tenho dez dias úteis para fazer o parecer e apresentar para votação. A minha expectativa, se não houver nenhuma surpresa, é encerrar a parte de relatório até o final de maio.
Aí é só votar no plenário do Conselho de Ética e, dependendo do resultado, depois segue para o plenário da Câmara. Digo que depende porque há a possibilidade de o deputado Eduardo Cunha recorrer à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara para questionar alguma formalidade. Mas a expectativa é que a gente consiga ter esse processo encerrado no Conselho de Ética até o início de junho.
De que forma o depoimento na semana passada do lobista Fernando Soares, também conhecido como Baiano, esclareceu temas que ainda não estavam claros?
Eu já tinha conhecimento dos fatos relatados por aqueles que foram ao Conselho de Ética porque houve o compartilhamento das informações do Supremo Tribunal Federal. Tanto o (doleiro Leonardo) Meirelles quanto o Baiano falaram de situações que envolvem corrupção passiva e, de alguma maneira, lavagem de dinheiro. São informações contundentes, fortes e que precisam ser analisadas. Ainda estou juntando documentos e provas. Na semana passada, mandei juntar mais dois documentos por provocação de parlamentares.
Esses documentos eram relacionados aos depoimentos de Ricardo Pernambuco e Ricardo Pernambuco Júnior (da empreiteira Carioca Engenharia), que também falam de pagamentos de valores mensais ao deputado Eduardo Cunha. As questões trazidas por Baiano e Meirelles falam de recebimento de vantagens indevidas. Não é o objeto central da investigação no Conselho de Ética. O objeto central é a existência ou não de contas no exterior. O deputado Eduardo Cunha disse que não teria essas contas e o Conselho de Ética está investigando.
Agora, obviamente o Conselho de Ética não pode deixar de conhecer informações e provas que apontem para outras condutas que também violam o decoro parlamentar. Até porque a denúncia que recebemos falava das duas coisas. Falava da existência ou não de contas no exterior - se ele teria ou não mentido – e falava também dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ou seja, o recebimento de vantagens indevidas.
Na etapa de admissibilidade, a situação estava complicada para aprovar o parecer (preliminar). Houve apelos para que eu fizesse uma modificação porque a ação penal contra Eduardo Cunha ainda não tinha começado no Supremo Tribunal Federal.
Eu acatei um pedido dos deputados e disse o seguinte: olha, eu vou afastar, temporariamente, a imputação do inciso 2 do Código de Ética, que fala do recebimento de vantagens indevidas. Porém, se houver circunstâncias novas, se a ação contra ele for recebida no Supremo, se provas chegarem ao Conselho de Ética dando conta que houve esse tipo de conduta também, esses fatos serão investigados.
O meu parecer (preliminar) é claro em relação a isso. Até porque, numa investigação, o denunciado não se defende das imputações. Ele se defende dos fatos. O deputado Eduardo Cunha está batendo muito nessa tecla. Que não pode, não pode. Que eu só tenho que investigar se ele mentiu ou não.
O senhor vai levar em conta o conteúdo dos inquéritos sobre Cunha que estão no Supremo?
O conteúdo dos inquéritos, que foi compartilhado, faz parte do acervo probatório. Será levado em consideração. Principalmente aquelas provas que foram juntadas aos autos. Provas materiais que confirmam ou não a existência das contas, a movimentação dessas contas, o recebimento ou não de vantagens indevidas. Enfim, você não analisa uma prova isoladamente. Analisa o conjunto.
Então, Cunha não será julgado no Conselho de Ética apenas por ter mentido ou não a respeito de ter contas bancárias no exterior?
Uma das previsões do Código de Ética é prestar informação falsa. Prestar informação falsa caracteriza quebra de decoro passível de cassação de mandato. O deputado Eduardo Cunha está sendo investigado sobre se prestou informação falsa dizendo que não possui contas no exterior. Caso seja comprovado que as contas existem, ficará evidenciada a quebra de decoro.
Mas o deputado não responde a apenas isso. Se ficar provado que prestou informação falsa, a pergunta é: qual foi a motivação? Foi apenas negar a existência ou foi ocultar uma prática criminosa, que também caracteriza quebra de decoro, mas mais grave, mais violenta contra o interesse do público? Isso tem que ser analisado na confecção do parecer.