Criminalidade: Estados não têm condições de enfrentar organizações por conta própria (Getty Images/Reprodução)
Luiza Calegari
Publicado em 22 de fevereiro de 2018 às 06h47.
Última atualização em 22 de fevereiro de 2018 às 09h52.
São Paulo – O crime organizado no país é fruto direto do descaso do Estado com o sistema carcerário, segundo o sociológo Julio Jacobo Waiselfisz, autor da edição anual do Mapa da Violência.
Essa avaliação se relaciona diretamente com a participação do Exército na varredura de presídios no Rio de Janeiro nesta quarta-feira (21) após uma rebelião, no âmbito do decreto de Garantia da Lei e da Ordem decretado na cidade.
Waiselfisz, que é coordenador da Área de Estudos sobre Violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), situa o alcance desproporcional das organizações criminosas em eventos como o Massacre do Carandiru, em São Paulo, no qual ao menos 111 presos foram executados pela polícia dentro da cadeia.
“Diante de situações como estas, de graves violações dos direitos humanos, os presos tiveram que criar e fortalecer grupos de autodefesa, que hoje dominam a sociedade nos mais diversos níveis”, explica ele.
O propósito das prisões, argumenta Waiselfisz, parece ser aumentar a criminalidade, ao invés de diminui-la. “No sistema carcerário brasileiro, botamos juntos o pequeno contraventor, que foi detido com duas gramas de maconha, e ele sai como criminoso, porque precisa se associar a alguma organização lá dentro”.
Ele ainda afirma que o Estado tem conhecimento de como funciona toda a estrutura, mas é incapaz de atuar para minimizar o problema. “Para sobreviver na prisão, no Brasil, você precisa entrar para o crime organizado. E o sistema de segurança sabe disso, mas não tem condições de encontrar uma forma de enfrentar a violência dos grupos armados”.
Alguns instrumentos jurídicos já foram implantados no país para diminuir o volume de encarceramentos, especialmente dos presos provisórios, que aguardam julgamento. Um deles foram as audiências de custódia, que determinam que a pessoa que foi detida tenha que comparecer a um juiz em um prazo de até 90 horas para que ele decida se a prisão será mantida enquanto o caso tramita.
A princípio, esses instrumentos funcionaram para diminuir o volume de prisões que talvez fossem desnecessárias, como o caso de Jéssica Monteiro, que foi presa em flagrante com dois pacotes de maconha, entrou em trabalho de parto um dia depois e teve que voltar para a prisão com um bebê recém-nascido nos braços.
No entanto, nos últimos meses os próprios juízes de custódia têm aumentado o volume de encarceramento. No Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, o índice de manutenção das prisões subiu de 52% entre 2015 e 2017 para 73% neste ano.
O que falta para resolver o problema, na opinião de Waiselfisz, é um planejamento que integre todo o território nacional, já que hoje a maioria das funções relacionadas à segurança pública é responsabilidade dos estados – e grande parte deles, como se sabe, enfrenta dificuldades financeiras.
“A prioridade é montar um plano nacional de segurança pública que contemple o problema carcerário, das polícias. É preciso dar estrutura para a polícia, destinar os recursos e ter metas reais. Senão continua como é hoje, que temos respostas circunstanciais a problemas focalizados. Depois de um tempo, surge outro problema que tem a mesma solução, que é mandar tropas do Exército”, finaliza Waiselfisz.