Brasil

Cortes do MEC nas universidades federais podem ferir a legislação

Depois de criticar a "balbúrdia" de faculdades específicas, ministro Abraham Weintrau anunciou corte linear de 30% nos orçamentos das federais

UFPR: universidade mais antiga do Brasil pode fechar as portas se corte de 30% não for revertido (Marcos Solivan/UFPR/Divulgação)

UFPR: universidade mais antiga do Brasil pode fechar as portas se corte de 30% não for revertido (Marcos Solivan/UFPR/Divulgação)

CC

Clara Cerioni

Publicado em 4 de maio de 2019 às 08h00.

Última atualização em 4 de maio de 2019 às 08h00.

São Paulo — Apesar de ter assumido o posto de ministro da Educação com o objetivo declarado de "acalmar os ânimos" na pasta, o economista Abraham Weintrau vem anunciando uma série de alterações nas universidades federais do país.

Nas últimas duas semanas, o chefe do MEC determinou a redução no repasse de verbas para cursos de filosofia e sociologia e afirmou que cortaria o investimento em faculdades que praticassem o que chama de "balbúrdia".

Depois, voltou atrás e anunciou um contingenciamento de 30% do orçamento para todas as 63 faculdades federais que funcionam hoje no Brasil.

Com um discurso de que é preciso respeitar “os pagadores de impostos”, Weintrau definiu o bloqueio de 5,8 bilhões de reais do orçamento do MEC para as faculdades. De acordo com o presidente Jair Bolsonaro, esse valor será revertido para investimentos na educação básica.

Todas essas medidas estabelecidas pelo ministro do MEC, contudo, têm sido questionadas por descumprirem a legislação brasileira.

Quando o Executivo diz que vai escolher quais serão os cursos que receberão mais ou menos dinheiro, ele estaria ferindo a autonomia das universidades, um princípio estabelecido na Constituição Federal de 1988.

No artigo 207, está determinado que "as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão".

"Se o governo entende que há dificuldades financeiras é necessário conversar com os reitores das universidades para analisar de quais maneira se pode estabelecer outras metas. Não é permitido, no entanto, cortar linearmente o recurso e muito menos baseado em uma motivação vaga e inespecífica", diz Nina Ranieri, coordenadora da Cátedra UNESCO de Direito à Educação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

Quando determina cortes sem especificar uma motivação ou critério claro, e sim ideológico, o governo também estaria infringindo a Lei do Procedimento Administrativo (Lei nº 9.784/99), que estabelece a obrigação de que todas as ações do Executivo sejam acompanhadas de justificativas técnicas, como um estudo.

"Qualquer corte de recursos do Executivo precisa ser justificado com fatos e não deve ser arbitrário. Com uma motivação equivocada, isso pode vir a ser questionado na Justiça e trazer mais problemas para a administração pública", explica Renato Janine Ribeiro, ex-ministro da Educação do governo de Dilma Rousseff.

Mesmo sem interferir diretamente nas universidades, no entanto, o MEC tem outras prerrogativas que o permitem influenciar na sua gestão, já que o chefe da pasta é o responsável por escolher os reitores.

"É o governo que nomeia o dirigente, com base em uma lista tríplice. Não é necessário conduzir dessa forma as mudanças", conclui Ranieri.

Mobilização das federais

O contingenciamento de 30% das verbas das universidades federais preocupa os reitores, que têm dado declarações públicas sobre os problemas que enfrentarão daqui para a frente.

Antonio Claudio Lucas da Nóbrega, reitor da Universidade Federal Fluminense (UFF), diz que com "esse corte vamos, mal, só pagar conta. E tem de sobrar para pagar água e luz. Se não, nem abro a porta”, disse.

Em nota, a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a mais antiga do país, anunciou que pode fechar as portas sem o dinheiro. "Se esta medida não for revertida, as consequências serão graves para o desempenho das atividades da UFPR no segundo semestre de 2019".

O vice-presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), João Carlos Salles, afirma que será preciso diálogo com o MEC para reverter essa realidade.

"O ensino superior é patrimônio da sociedade, ele não pode ser contraposto com a educação básica: não há educação de qualidade sem professores de qualidade", afirmou.

Salles, que também é reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), defende que haja uma defesa da importância das faculdades públicas para o desenvolvimento social do Brasil.

Acompanhe tudo sobre:abraham-weintraubEducação no BrasilFaculdades e universidadesGoverno BolsonaroJair Bolsonaro

Mais de Brasil

Governadores do Sul e do Sudeste criticam PEC da Segurança Pública proposta por governo Lula

Leilão de concessão da Nova Raposo recebe quatro propostas

Reeleito em BH, Fuad Noman está internado após sentir fortes dores nas pernas

CNU divulga hoje notas de candidatos reintegrados ao concurso