Local onde o Exército Brasileiro construiu um centro de tortura, durante a Guerrilha do Araguaia: o encontro teve palestra do general que integrou a operação de repressão à resistência armada (MARCOS ROSA/VEJA)
Da Redação
Publicado em 31 de março de 2014 às 17h44.
Rio - Com medo de hostilidades e violência em possíveis manifestações contrárias ao golpe militar, a comissão que reúne dos Clubes Militar, Naval e de Aeronáutica escolheu a zona oeste da cidade, a mais de 20 quilômetros do centro, para sessão solene de comemoração aos 50 anos do movimento que derrubou o presidente João Goulart.
Embora os três clubes tenham sede no centro, a solenidade, seguida de um almoço, aconteceu na unidade da Barra da Tijuca do Clube de Aeronáutica. "Não deixaríamos passar a data em hipótese alguma. Mas, nas sedes do centro, não havia como garantir segurança das nossas instalações, do nosso pessoal", disse o presidente do Clube de Aeronáutica, brigadeiro Ivan Frota, que classificou a Comissão Nacional da Verdade de "uma afronta à verdade".
"Há quase um massacre a um episódio da história que foi a participação dos militares. Nosso poder de comunicação é ínfimo diante da mídia, mas será a briga de Davi e Golias. A contrapropaganda é o que nos resta", discursou o presidente do Clube Naval, almirante Paulo Frederico Dobbin. O almirante reclamou das edições dos jornais pelos 50 anos do golpe: "Da mesma maneira que apoiaram, agora criticam".
O encontro, que reuniu cerca de 80 militares da reserva, teve palestra do general reformado Álvaro Pinheiro. Integrante da operação de repressão à resistência armada no Araguaia, o militar negou a execução sumária de guerrilheiros e disse que os "companheiros despreparados" que torturavam os presos eram repreendidos.
"Matar alguém a dez metros de distância (...) Sonho com todos eles. Mas com orgulho imenso de ter feito", disse Pinheiro à plateia. "Pressão psicológica não é tortura, tem que ser feita sem que se toque no homem. Vimos lá companheiro despreparado pegar o cara e encher de porrada, às vezes estava com raiva. Mas destrói o cara e ele (o preso) perde a condição (de dar informações)", afirmou. "A tropa que combate não pode torturar porque o moral vai embora", prosseguiu o palestrante.
No detalhamento da ação no Araguaia, o general falou da importância do preparo psicológico dos militares. "Para missão desse tipo tem que ser matador, tem que atirar para matar. Não tem tiro para ferir", afirmou.
Pinheiro mostrou notícias sobre ataques de organizações de combate à ditadura, com as bombas no aeroporto de Guararapes, em Recife, e no Quartel General do 2º Exército de São Paulo e falou sobre dois líderes da resistência, Carlos Marighella e Carlos Lamarca.
Embora sustente que não houve guerrilha na resistência brasileira, Pinheiro lembrou que o Manual do Guerrilheiro Urbano, de Marighella, foi traduzido em 37 línguas e serve de inspiração para vários movimentos extremistas atuais. "Marighella era extremamente talentoso (...) Confesso, muito secretamente, que de vez em quando fico orgulhoso desse f.d.p. ser brasileiro", disse o general.
Ao encerrar a sessão solene, o brigadeiro Ivan Frota lamentou que os militares tenham perdido politicamente. "Infelizmente o governo proíbe comemorar coisas maravilhosas como essa. Perdemos na parte política. Hoje somos subordinados a uma política que não entende tudo que foi feito. Há 25 anos entramos no terreno da decadência, a fase do crescimento parou e passamos a andar para baixo", lamentou.