Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, recebe novo pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff (Adriano Machado/Reuters)
Da Redação
Publicado em 21 de outubro de 2015 às 20h00.
Um grupo de advogados de alto perfil apresentou nesta quarta-feira um pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o que aproxima a decisão sobre sua sobrevivência política, após meses de incertezas que paralisaram o Congresso, sacudiram os mercados financeiros e aprofundaram a recessão econômica.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, um aberto crítico de Dilma que está enfrentando ele mesmo acusações de corrupção, prometeu ser imparcial ao decidir se aceitará o pedido que alega que ela manipulou as contas fiscais em 2014 e neste ano.
A aceitação do pedido poderia levar dias ou semanas e dispararia um prolongado processo judicial que poderia acabar afastando a presidente do cargo.
Pela segunda vez nos 30 anos de democracia do Brasil, o país está envolvido em um frenesi de impeachment presidencial que exacerbou os problemas econômicos.
O mais recente pedido vai testar a determinação de Cunha e da oposição para tentar destituir a presidente menos popular da história moderna do Brasil.
Embora o resultado da iniciativa de impeachment não seja nem um pouco evidente, economistas e investidores estão de acordo em algo: o impasse político precisa ser resolvido – e rápido.
Sem estabilidade na capital, dizem eles, o maior país da América Latina terá dificuldades para sustentar seu crescente déficit orçamentário, reconquistar os investidores e se recuperar daquela que deverá ser a recessão mais longa desde a Grande Depressão.
Pedidos
Dilma sustentou durante todo o desenrolar do escândalo que não fez nada de errado. Ela não quis fazer comentários para esta reportagem.
“A ação do governo não vai ser inviabilizada pela oposição”, disse ela a jornalistas em Helsinque na terça-feira. “Faça ela quantos pedidos de impeachment fizer”.
Embora pelo menos duas dezenas de pedidos de impeachment já tenham sido apresentadas, esse é diferente por causa dos solicitantes: o advogado Hélio Bicudo, um destacado ex-membro do Partido dos Trabalhadores de Dilma, e o ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior. O maior partido de oposição do país apoia a petição.
Um pedido anterior feito por Bicudo e Reale se concentrava apenas nos supostos ajustes orçamentários do ano passado, o que deixava uma margem de incerteza jurídica sobre a possibilidade de responsabilizar um presidente no cargo por ações cometidas no mandato anterior.
“A marca da corrupção continua no governo Dilma”, disse Carlos Sampaio, líder na Câmara do PSDB, o maior partido de oposição. “Cunha tem tudo para aceitar o impeachment”.
Cunha não deu um prazo para decidir, mas disse que teria “novidades” por volta de novembro, de acordo com José Mendonça Filho, líder do partido Democratas na Câmara.
Bicudo e Reale argumentam que Dilma adulterou as contas para esconder a gravidade do déficit orçamentário. O Tribunal de Contas da União já rejeitou as práticas fiscais de 2014.
Processo de impeachment
Realizar o impeachment de um presidente no Brasil implica várias etapas: a Câmara precisa aceitar a petição, analisá-la e votá-la. É necessário que dois terços dos deputados apoiem as acusações para que a petição passe para o Senado, que tomará a decisão final.
Se Dilma for destituída ou renunciar, o vice-presidente Michel Temer assumiria e terminaria o mandato dela, que acaba em 2018.
A última vez que o Brasil enfrentou uma crise semelhante foi em 1992, quando o presidente Fernando Collor de Mello renunciou em meio a um processo de impeachment e foi proibido de concorrer a cargos eletivos durante oito anos. Ele foi acusado de aceitar subornos.
O imbróglio atual começou há cerca de dois anos, quando investigadores da Polícia Federal seguiram o rastro de um Land Rover comprado por uma pessoa envolvida com lavagem de dinheiro para um alto executivo da Petrobras.
Eles desvendaram um esquema de propinas de muitos bilhões de dólares que desde então paralisou a produtora de petróleo, levou à falência alguns de seus fornecedores e apanhou políticos do alto escalão, inclusive o próprio Cunha. Ele negou qualquer irregularidade.
À beira do grau especulativo
À medida que o escândalo se espalhava, os mercados entraram em colapso. A moeda do Brasil, o real, despencou 32 por cento neste ano. A Fitch Ratings deixou a nota do país à beira do grau especulativo na quinta-feira e esse foi o quarto rebaixamento desde que Dilma está no poder.
Ao mesmo tempo, a economia está encolhendo. Projeta-se que o PIB se contrairá 3 por cento neste ano e 1,22 por cento em 2016, de acordo com economistas em uma pesquisa do Banco Central publicada na segunda-feira. O PIB cresceu apenas 0,2 por cento no ano passado.
Os dados fracos refletem uma surpreendente reviravolta em um país que era considerado o lugar ideal para os investidores estrangeiros. Mas o fim do boom das commodities revelou um sistema que, segundo os detratores, sempre precisou de reformas estruturais.
Do mesmo modo, o impeachment poderia revelar o grau de maturidade política do Brasil, de acordo com Eric Farnsworth, vice-presidente do Council of the Americas, em Washington.
“Se isso acabar como um processo de expurgação e as pessoas virem que tudo foi feito de acordo com os padrões certos e com as práticas recomendadas internacionalmente, talvez isso seja muito positivo para o Brasil”, disse Farnsworth.