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Com gastos mínimos, Doria abandona córregos e bueiros de SP

Montante gasto para manutenção do sistema de drenagem, de R$ 84,2 milhões, é o menor para o período desde 2014, em valores corrigidos pela inflação

João Doria: só 12% do previsto para obras no orçamento para tentar controlar as cheias foi gasto pela gestão do prefeito (Adriano Machado/Reuters)

João Doria: só 12% do previsto para obras no orçamento para tentar controlar as cheias foi gasto pela gestão do prefeito (Adriano Machado/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 23 de novembro de 2017 às 07h59.

São Paulo - A Prefeitura de São Paulo gastou até agora pouco mais da metade (56%) da verba para serviços rotineiros de manutenção do sistema de drenagem das chuvas, que inclui bocas de lobo, bueiros, córregos e piscinões.

O montante, de R$ 84,2 milhões, é o menor para o período desde 2014, em valores corrigidos pela inflação.

Além disso, só 12% do previsto para obras no orçamento para tentar controlar as cheias foi gasto pela gestão João Doria (PSDB).

A Prefeitura diz que os serviços são feitos segundo a necessidade de cada uma das 32 prefeituras regionais da cidade.

Com o início da temporada de chuvas, os paulistanos que vivem em áreas onde as enchentes são comuns já estão preocupados.

"Este ano, ainda não vi limpeza de bueiros aqui na região. Há três córregos, o Três Pontes, o Itaim e o Águas Vermelhas. Todos estão sujos", afirma Anderson Cunha, líder comunitário do Jardim Pantanal, bairro da zona leste famoso pelos constantes alagamentos. "Esses três córregos deságuam em um lago que, na semana passada, ficou no limite de transbordar", diz ele.

Dos R$ 147 milhões em serviços previstos no orçamento para as prefeituras regionais fazerem a manutenção do sistema de drenagem, os órgãos gastaram R$ 84,2 milhões até a última sexta-feira, segundo levantamento realizado pelo jornal O Estado de S. Paulo com dados da Secretaria Municipal da Fazenda.

Para comparar, de janeiro a outubro de 2016, haviam sido gastos R$ 120,9 milhões, em valores corrigidos. O total executado deste ano é equivalente só ao montante gasto entre janeiro e outubro de 2013, de R$ 78,9 milhões.

Entre as regiões, há variações de desempenho. O Butantã, zona oeste, gastou 71% do previsto. Já o Itaim Paulista, na zona leste, é o pior, com 33% da verba aplicada. Entre os últimos também aparecem Guaianases (32%), também na zona leste, e Vila Maria (36%), na norte.

Na Lapa, zona oeste, quem vive e trabalha próximo do Mercado Municipal do bairro reclama da falta de limpeza dos bueiros.

Por causa da escassez de espaço para a água escoar, já houve ao menos três alagamentos ali só neste ano. "Carro que tenta passar em meio ao alagamento fica boiando porque só dá para passar ônibus. Não entra água no mercado porque eles abaixam as portas e protegem", diz o balconista Cassiano Adolfo, de 22 anos, funcionário do mercado.

O taxista Ricardo Albuquerque, que trabalha no bairro há um ano, relata ter visto limpeza das bocas de lobo só uma vez. "Em julho, vi os caminhões com os equipamentos e eles estavam fazendo a limpeza. Mas quando a chuva vem forte isso aqui fica intransitável",conta.

"O sistema de macrodrenagem da cidade está superado há 20 anos", diz o engenheiro Julio Cerqueira Cesar Neto, consultor da área de drenagem urbana e ex-diretor de planejamento do Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE).

"A cidade cresceu demais, ficou impermeável. Os canais já não têm capacidade para escoar a água da chuva. Toda tempestade vai resultar em alagamentos."

Demanda

A gestão Doria, por nota, disse ter feito neste ano limpeza manual em 1,4 mil quilômetros de córregos - sem informar a extensão total de córregos da capital -, além de limpeza em 77 mil metros com máquinas.

"O cronograma de limpeza é definido para cada uma das 32 prefeituras regionais, de acordo com necessidade e planejamento técnico", acrescentou.

Sobre os córregos da zona leste, disse que os locais são monitorados e seguem cronogramas de serviço. A Prefeitura afirmou ainda que a regional da Lapa vai avaliar a situação relatada pelos moradores nos próximos dias.

Os recursos para custear essas ações de manutenção vêm do Tesouro Municipal. É uma situação diferente do dinheiro para obras de melhoria da drenagem, feitas com dinheiro da Prefeitura e de transferências do Estado e da União.

Somadas as três fontes, os recursos para este ano eram de R$ 564 milhões. Mas só R$ 70 milhões já foram investidos. Além do fim dos repasses do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que fizeram sumir quase R$ 380 milhões da verba, a Prefeitura disse que havia problemas de documentação em alguns convênios e planeja concluir as obras já iniciadas.

A reivindicação por mais verbas contra enchentes já causou desconforto até dentro da Prefeitura. Neste mês, Doria demitiu Paulo Cahim, prefeito regional da Casa Verde/Cachoeirinha, após ele ter reclamado publicamente da falta de recursos para limpar um piscinão.

Deslizamento

A Vila Silvia Teles, no Itaim Paulista, zona leste, é um daqueles bairros em que, quando se pergunta sobre enchentes, os moradores normalmente apontam para a cintura ou mesmo para o peito, ao explicar o nível a que a água chegou na última estação chuvosa. É um bairro por onde o Córrego Lajeado passa em seu caminho até o Rio Tietê.

Ali, os temores habituais com relação às chuvas estão maiores neste ano, por causa da falta de manutenção do córrego e da demora nas obras para controle das enchentes.

"Meu pai, à noite, está saindo de casa para dormir com a gente, com medo de a margem (do Lajeado) desmoronar e levar a casa dele. A casa fica vazia", conta a professora Luciene Vieira, de 46 anos.

O medo de desmoronamento é causado por uma obra de contenção das margens iniciada neste ano e que ainda não acabou. A sujeira e o mato alto já são motivos de queixas. Além disso, os moradores dizem que a obra, feita em só uma das margens, acabou por fazer a margem oposta ceder, chegando à porta das casas.

"Começou a entrar máquina, mexer em terra, e a margem do outro lado começou a desmoronar", afirma o gari Claudinei Aparecido da Silva, de 38 anos, que vive com a família na margem do córrego. "Quando chover forte, e tiver correnteza, a margem vai embora", diz.

A erosão da margem é um problema de décadas. A professora Luciene diz que sua família fez no ano passado, por conta própria, um muro de proteção para evitar uma tragédia. Gastaram R$ 4 mil com material de construção. O muro agora está embaixo da água.

Segundo a Prefeitura Regional de Itaim Paulista, houve dois solapamentos de terra durante a obra, um no dia 17 e outro no dia 19 deste mês. Por meio de nota oficial, a gestão do prefeito João Doria (PSDB) informou que o serviço ainda deve durar mais quatro meses. "Além disso, o local recebe limpeza mecânica três vezes ao ano, ou de acordo com a demanda", disse a Prefeitura. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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