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Clube dividia preços antes de licitação, diz delator

Marcos Pereira Berti, diretor da Toyo Setal, revelou detalhes da atuação do "clube" de empreiteiras que cartelizava licitações da Petrobras


	Petrobras: delator disse que começou a participar dos encontros do clube em 2005, quando nove empreiteiras compunham o grupo
 (Fernando Frazão/Agência Brasil)

Petrobras: delator disse que começou a participar dos encontros do clube em 2005, quando nove empreiteiras compunham o grupo (Fernando Frazão/Agência Brasil)

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Da Redação

Publicado em 26 de março de 2015 às 18h18.

São Paulo - O executivo Marcos Pereira Berti, diretor da Toyo Setal e novo delator da Lava Jato, revelou em detalhes à força-tarefa como era a atuação do "clube" de empreiteiras que cartelizava as licitações na Petrobras e elencou 11 obras da estatal divididas pelo grupo, que chegava até a definir quais empresas apresentariam propostas "cobertura" com preços acima da estimativa para perder a licitação e garantir a definição das vencedoras dos certames da petrolífera.

O executivo, que decidiu colaborar com as investigações no âmbito do acordo de leniência firmado pela Toyo Setal com o MPF em outubro do ano passado, relatou que começou a participar dos encontros do clube em 2005, quando nove empreiteiras compunham o grupo - Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, UTC, Mendes Junior, Setal, MPE, Promon e Techint.

Nestes encontros, além de discutir quais empresas venceriam quais licitações da estatal, "as demais participantes do grupo comprometiam-se a não apresentar propostas competitivas que pudessem vir a prejudicar a escolhida", afirmou Berti em depoimento de fevereiro deste ano.

Para apresentar essas propostas de "cobertura", segundo o executivo, as empreiteiras chegavam a compartilhar os orçamentos que seriam apresentados nas licitações.

"Para que esta rotina funcionasse as empresas ou consórcio de empresas escolhidas pelo grupo para vencer os certames da Petrobras encarregavam-se de, por meio de emissários próprios, encaminhar envelopes com o valor da proposta que apresentariam no certame para que as empresas ou grupos de empresas que forneceriam as propostas coberturas pudessem efetuar lances superiores", explicou. Dessa forma, não apenas eram definidos os vencedores das disputas, como também as propostas que ficariam em 2º, 3º e 4º colocados nas licitações.

Além de definir os vencedores e as demais propostas apresentadas nas disputas da Petrobras, o grupo de empreiteiras também buscava "agregar" as empresas de fora que eventualmente disputavam os certames da petrolífera. Segundo Berti, isso passou a ocorrer no fim de 2006, quando a Petrobras começou a convidar empresas que não participavam do clube das 9 empreiteiras.

Com as dificuldades causadas pela decisão da estatal, de acordo com o executivo "os representantes das empresas que o depoente considera as mais fortes do grupo, quais sejam: Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, UTC e Odebrecht procuraram manter contato com estas novas empresas fora do grupo para também chamá-las para participar do grupo e das reuniões para a divisão dos certames e contratos da Petrobras", afirmou.

A partir de então, e com o aumento das licitações na estatal, segundo o depoimento, as reuniões do clube passaram a ser mais frequentes, "ocorrendo mensal ou bimestralmente" e agregando as empresas: OAS, Engevix, Skanska, GDK, Iesa e Queiroz Galvão.

De acordo com o executivo, o esquema envolveu as licitações das refinarias de Paulínia (Replan), Alberto Pasqualini (Revap), Gabriel Passos (Regap), Abreu e Lima (Rnest), Duque de Caxias (Reduc), Presidente Bernardes (Rpbc), Presidente Vargas além dos terminais de Barra do Riacho, da Bahia e de Cabiúnas. O esquema ainda foi utilizado nas licitações do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), segundo o delator.

Tabelas

A dinâmica do clube para definir a divisão dos certames contava ainda com a elaboração de tabelas em que cada empresa definia suas prioridades - 1, 2,3 - em determinado trecho a ser licitado em cada obra. A força-tarefa da Lava Jato aprendeu algumas destas tabelas nas buscas realizadas na sede da Engevix, e Berti confirmou que elas eram utilizadas nas reuniões do grupo.

"Esta tabela serviu de base para as discussões nas próximas reuniões do grupo, que nas etapas seguintes as empresas buscavam formar consórcios entre si para discutir seus interesses em conjunto nas próximas reuniões do grupo, que então se buscava uma reunião global com todos os participantes para estabelecer quais empresas ou consórcios 'ficaria com o que'", explicou o executivo.

Ele afirmou ainda que as definições do clube permaneciam "ao longo de todos os certames da Petrobras", caso a petrolífera não convidasse nenhuma empresa de fora. Nestes casos podiam ocorrer duas possibilidades: ou as empresas deixavam de combinar e disputavam entre si para competir com as concorrentes de fora do clube, ou passavam a procurar representantes de outras empresas de fora para fazer os acertos.

Defesa

A empresa Mendes Junior diz que não se pronuncia sobre inquéritos e processos em andamento. A Engevix afirma que "está prestando os esclarecimentos necessários à justiça". A MPE diz que "ainda não tomou conhecimento oficial deste documento e só vai se pronunciar depois de citada."

Em nota, a Andrade Gutierrez repudiou "as ilações indevidas que vêm sendo feitas sobre a suposta participação em cartel e reitera, como tem feito desde o início da Operação Lava Jato, que não tem ou teve qualquer envolvimento com os fatos relacionados com as investigações em curso.".

A empresa afirma também que "não há qualquer tipo de prova sobre a participação da AG nesse suposto cartel e que todas as acusações equivocadas vem sendo feitas em cima de ilações e especulações."

A Odebrecht nega as alegações do depoente. "A empresa não participa e nunca participou de nenhum tipo de cartel e reafirma que todos os contratos que mantém, há décadas, com a Petrobras, foram obtidos por meio de processos de seleção e concorrência que seguiram a legislação vigente". Também a Queiroz Galvão negou " práticas anticoncorrenciais" e reitera "que todas as suas atividades e contratos seguem rigorosamente a legislação vigente".

A Promon Engenharia também repudia a acusação de envolvimento em cartel e esclarece que "todos os contratos com a Petrobras foram obtidos de maneira ética e cumprindo toda a legislação aplicável".

A GDK informou que não tem conhecimento de nenhuma acusação formal.

A Construtora Camargo Corrêa reiterou que segue à disposição das autoridades para prestar os esclarecimentos necessários e que desenvolve esforços para sanar eventuais irregularidades. A OAS diz que exerce suas atividades "com integridade, pautada pela conduta ética e pelo respeito à legislação em vigor" e nega as alegações.

A Iesa diz que não irá se manifestar sobre esse assunto. As demais empreiteiras citadas não foram localizadas ou não retornaram os contatos da reportagem até a conclusão desta matéria.

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