A presidente Dilma Rousseff (Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 21 de agosto de 2015 às 18h22.
Brasília/São Paulo - A denúncia contra o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e as crescentes especulações sobre a permanência do vice-presidente Michel Temer à frente da articulação política podem atrapalhar o governo da presidente Dilma Rousseff.
Apesar de, em tese, a denúncia do Ministério Público Federal contra Cunha por corrupção e lavagem de dinheiro enfraquecer o presidente da Câmara, observadores da cena política lembram que não é do feitio do deputado amainar os ânimos após ser atingido e que, por isso, a tendência é ele manter a temperatura elevada ou subir ainda mais o tom.
"Acho que o apelido que ele carrega, de homem-bomba, é cada vez mais atual. À medida em que se enfraquece, que é o que está em curso, dentro da tática agressiva, ele pode tentar ativar mais algumas pautas-bomba e teremos de administrar isso", disse o vice-líder do PT na Câmara Henrique Fontana (RS). Fontana é um dos parlamentares que, na quinta-feira, defenderam o afastamento de Cunha da presidência da Câmara, logo após ser formalizada a denúncia contra ele no Supremo Tribunal Federal (STF) por suposto envolvimento nas irregularidades investigadas pela operação Lava Jato.
Na mesma linha, uma fonte próxima à área de articulação política do governo disse, sob condição de anonimato, que a denúncia contra Cunha no STF pode tornar a situação do governo na Câmara mais "conturbada". Segundo essa fonte, Cunha "age com o fígado" e costuma "se defender atacando".
A percepção de que a denúncia contra Cunha não alivia a vida do governo também existe do outro lado do Congresso Nacional, no Senado.
"Claro que as denúncias contra o presidente da Câmara vão criar mais dificuldades (para o governo), não tenha dúvidas disso", disse à Reuters o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE).
Em nota divulgada após ser denunciado na quinta-feira, o presidente da Câmara voltou a acusar o governo de atuar em conjunto com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para torná-lo o primeiro político denunciado na Lava Jato, que apura uma esquema bilionário de corrupção em estatais. Ele também disse estranhar que nenhum membro do governo ou parlamentar petista tenha sido denunciado.
Nesta sexta, ao participar de evento da Força Sindical em São Paulo, Cunha negou, entretanto, que fará qualquer retaliação por conta da denúncia, mas adotou tom desafiador ao negar que renunciará ao comando da Câmara.
IMPEACHMENT
A principal retaliação que Cunha pode realizar contra o governo seria dar seguimento a um processo de impeachment contra a presidente. Para Ricardo Ribeiro, analista político da MCM Consultores Associados, no entanto, o parlamentar fluminense perdeu força para fazer esse movimento após ser denunciado por corrupção.
"Perde legitimidade um processo de impeachment contra Dilma com as digitais de Eduardo Cunha", avaliou o analista. Para Ribeiro, no entanto, Cunha deve manter a agressividade contra o governo, mesmo correndo agora o risco de tornar-se réu em uma ação penal da Lava Jato. "A guerra que ele já tinha com o governo, ele vai manter. Ele está em campo aberto de batalha", disse.
TEMER CANSADO
Além das dificuldades que podem vir da Câmara, o governo terá ainda de administrar nas próximas semanas as sinalizações cada vez mais frequentes de que o vice-presidente da República, Michel Temer, quer deixar as funções de principal articulador político do governo.
Aliados e pessoas ligadas ao vice afirmam que uma eventual saída dele da articulação não deve acontecer "por enquanto" e que Temer não tomará medidas que provoquem o agravamento da crise. Reconhecem, entretanto, que o vice tem encontrado obstáculos para exercer suas funções e que tem "desabafado" sobre o assunto com pessoas próximas.
"Falei com o Michel (Temer) ontem (quinta) umas duas vezes, estive com ele antes de ontem (quarta). O que o Michel está dizendo é que ele terminou um papel importante que ele tinha a fazer que era a questão do ajuste fiscal", disse Eunício à Reuters.
"Ele enfrenta dificuldade no governo, coisas internas... o problema é que ajusta as coisas e depois as coisas não caminham, deve ter chateado", disse o líder, ressalvando que não recebeu "absolutamente nada" do vice no sentido de que ele deixará a articulação.
De acordo com a fonte próxima à articulação política do governo, entre as dificuldades enfrentadas por Temer estão a incompreensão que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem do processo político, o que atravanca a liberação de emendas parlamentares a aliados, e a atuação do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, que tem, segundo essa fonte, represado a nomeação de cargos.
Uma fonte do PMDB na Câmara com conhecimento das queixas de Temer, que também preside o PMDB, disse que o vice-presidente de fato tem se dito "bastante cansado" com a tarefa e manifestou que gostaria de atuar numa articulação "mais macro".
Na mesma linha, um senador petista afirmou que Temer, por ser vice-presidente, "pode cuidar dos grandes temas e agir apenas em questões pontuais quando for preciso".
Uma eventual saída de Temer da articulação criaria "um estresse", segundo Ribeiro, da MCM, por sinalizar o afastamento do governo de uma parcela importante do partido. Geraria ainda, segundo ele, um aumento das especulações sobre a posição do vice em relação a um eventual afastamento de Dilma.
Texto atualizado às 18h22