Cármen Lúcia: presidente tem resistido a colocar o assunto na pauta do plenário do Supremo (Antonio Cruz/Agência Brasil)
Reuters
Publicado em 20 de março de 2018 às 16h27.
Brasília - O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta terça-feira ter sugerido à presidente da corte, Cármen Lúcia, marcar uma reunião com todos os ministros a fim de discutir a inclusão, na pauta do plenário, de ações que discutem a constitucionalidade da prisão de um condenado após esgotados os recursos na segunda instância.
Em entrevista coletiva dada na entrada do plenário da 2ª Turma do STF, Celso de Mello disse ter feito a proposta a Cármen Lúcia na quarta-feira passada, num encontro em seu gabinete com a presença do ministro Luiz Fux, atual também presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Na ocasião, segundo ele, a presidente do STF concordou em marcar a reunião.
Segundo Mello, Cármen Lúcia iria fazer o convite aos ministros para que o encontro ocorresse nesta terça-feira. Mas o decano da corte disse que a presidente do Supremo não fez, até o momento, nenhum convite a ele e aos demais ministros.
O ministro mais antigo em atividade no Supremo defendeu que o julgamento de ações que avaliariam a constitucionalidade da prisão em segunda instância pelo plenário poderia evitar o "constrangimento inédito" de eventualmente algum ministro do Supremo levar um recurso para contestar esse tipo de execução provisória da pena diretamente a julgamento, sem que ela tenha pautado. Há previsão regimental para isso.
"Está dependendo de um convite a ser formado, que caberia a presidente formular este convite que, ao menos em relação a mim, não foi feito", disse ele.
Cármen Lúcia tem resistido a colocar o assunto na pauta do plenário do Supremo, já afirmou publicamente que seria "apequenar" a corte rediscutir esse assunto.
Na véspera, a ministra lembrou que a posição atual do STF foi tomada recentemente, em 2016, e que não houve uma mudança significativa na composição do Supremo que justificasse o tema voltar a ser reexaminado tão cedo.
Celso de Mello disse que o julgamento de alguma das duas ações de constitucionalidade sobre o assunto daria efeito vinculante para o caso --teria de ser seguido por todos os magistrados do país. Segundo ele, o entendimento atual --que permite a execução da pena após a segunda instância-- foi construído por uma maioria precária e não tem esse caráter vinculante.
"Esse é um tema que está na agenda do tribunal há algum tempo e o processo nobre que está para ser decidida essa questão é um processo de controle abstrato", afirmou ele, ao frisar que as ações já tinham sido ajuizados há algum tempo, uma das quais, salientou, movida pela Ordem dos Advogados do Brasil.
Questionado se há um equívoco de Cármen Lúcia em não pautar as ações, o decano disse não saber. Afirmou que respeita o poder de agenda da presidente do Supremo, mas argumentou que se quer apenas fazer uma ponderação de um julgamento que, a seu juízo, parece ser "muito importante".
Uma eventual mudança no entendimento sobre as prisões em segunda instância pode beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que teve em janeiro a condenação confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) no caso do tríplex do Guarujá.
O petista deverá ter julgado em breve os últimos recursos pelo TRF-4. Se forem negados, isso pode levá-lo à prisão sem uma alteração na jurisprudência do Supremo.
Questionado se um eventual julgamento do tema agora beneficiaria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o decano destacou ainda que a medida não tem por objetivo avaliar qualquer situação concreta.
Ele fez uma defesa enfática da "presunção de inocência" até o trânsito em julgado do processo, ou seja, até esgotado todos os recursos cabíveis.
"Prefiro não discutir ações de natureza pessoal ou processos específicos. A preocupação do tribunal é que haja um debate, em tese, em torno de um pleito formulado pela OAB, vale dizer, a execução antecipada da pena é ou não é compatível com a presunção de inocência. Apenas isso", disse ele, ao ser questionado se uma eventual prisão de Lula torna a discussão mais urgente.
Celso não quis dizer se a eventual mudança no Supremo já seria majoritária na atual composição.
Ele também se esquivou de responder se seria ruim para a imagem do STF haver uma prisão de Lula com base na atual jurisprudência. "Não se cuidada imagem da corte, o Supremo fixou uma posição precária, por seis votos a cinco, numa discussão", disse.