A ministra deu um conselho à população, ao fazer uma enfática defesa da Justiça Eleitoral e do esforço de seus integrantes para garantir a transparência e credibilidade do processo de votação no País (Rosinei Coutinho/SCO/STF/Divulgação)
Agência de notícias
Publicado em 14 de novembro de 2023 às 14h53.
A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), rebateu as críticas segundo as quais a Corte tem se comportado com ativismo e ido além do que dispõe a lei. Ao participar nesta terça-feira, 14, do seminário "O Papel do Supremo na Democracia" realizado pelo Estadão, Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) e Universidade Mackenzie, repetiu as palavras do presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, que no mesmo evento ontem negou que a Corte aja pautado pelo ativismo.
"O STF não é ativista, mas cumpre a Constituição", rebateu a ministra acrescentando que o STF atua por provocação é que não pode deixar de dar respostas às demandas dos jurisdicionados e da sociedade como um todo.
Cármen Lúcia disse ter sido questionada, até com certa frequência, por pessoas sobre o porquê de o STF estar, na avaliação destas pessoas, tomando decisões que vão além do que estabelece a Constituição, que nunca leram a Carta Magna.
A ministra deu um conselho à população, ao fazer uma enfática defesa da Justiça Eleitoral e do esforço de seus integrantes para garantir a transparência e credibilidade do processo de votação no País.
"A única flor que garante a liberdade de você cultivar o que você quiser na sua vida é a flor da democracia. Tudo mais é erva daninha. Nunca façam concessões com isso, não vale a pena", disse. "Não tenham nenhum momento de preguiça cívica pois o preço será um dia você ter que lutar muito mais fortemente pela democracia, pelas suas liberdades", completou, se endereçando aos jovens.
A magistrada defendeu a necessidade de se ‘enraizar’ a vocação democrática no Brasil, para que o País ‘não seja só um modelo de processo eleitoral democrático, mas um modelo de democracia para o mundo’.
As ponderações de Cármen se deram no seminário O Papel do Supremo nas Democracias, promovido pelo Estadão e a Universidade Presbiteriana Mackenzie. A ministra respondeu perguntas em um painel sobre a organização do processo eleitoral e sua credibilidade. Ela ainda encerra o evento com uma palestra sobre os 'desafios do Supremo Tribunal Federal na democracia brasileira'.
Cármen Lúcia abriu sua exposição explicando como a Justiça Eleitoral foi criada para dar uma resposta a vícios e à inconfiabilidade por parte do eleitorado, questões que levaram à ruptura do poder em 1930.
"Um dos motivos que levaram à aceitação desse movimento foi a ausência de eleições seguras e limpas. A Justiça eleitoral veio para dar conta dessa demanda e é exemplo no mundo, como um modelo", ressaltou.
Segundo a ministra, ter um ramo do poder judiciário encarregado especificamente da justiça eleitoral ‘assegura a integridade do processo eleitoral pela garantia do voto livre do eleitor’. "É um dado importante para a confiabilidade, a confiança e transparência ao processo".
Ela ressaltou que talvez grande maioria do eleitorado não tenha noção do que significa fazer uma eleição no mesmo dia, no mesmo horário, em uma das quatro maiores democracias do mundo, com a proclamação dos resultados horas depois da votação. "Não é um feito pequeno."
Cármen exaltou o trabalho da Justiça eleitoral. Em 2012 ela presidiu o TSE. Na ocasião, a Justiça eleitoral administrou 513 mil candidatos em uma votação com 123 milhões de eleitores, em três horários diferentes.
A ministra ressaltou como a Justiça começa a trabalhar para o pleito, um ano antes. "Não paramos um dia" Também frisou a importância da imprensa livre para o pleito.
Cármen destacou que a Justiça Eleitoral é 'voltada para fora de si'.
"A Justiça eleitoral lida com o estudante que pergunta como funciona, o médico que quer saber, porque alguém contou. A participação de militares, civis, professores e estudantes faz parte do processo. A eleição é voltada pelo eleitor que livremente escolhe e para isso ele tem que saber como funciona", ponderou.
A ministra diz que houve um processo de legitimação do sistema eletrônico de votação e exaltou a transparência do processo, dizendo que é por isso que ele funciona. Citou as eleições de 2022. Segundo a ministra, apesar de ter havido tanto questionamento - ‘com o objetivo de desvalorizar um processo democrático por razões nada republicanas’ - a população continuou acreditando e compareceu às urnas.
"O Brasil engole um elefante e engasga com uma formiga, é impressionante. Ele faz uma eleição que é modelo no planeta, mas às vezes lá no município tem uma confusão que não é capaz de administrar. Temos uma vocação democrática que precisa ser cada vez mais enfatizada, educada, para que a gente seja não só modelo de processo eleitoral democrático, mas modelo de democracia para o mundo", pregou.
Uma ouvinte de Cármen Lúcia pediu um conselho. A ministra disse contar com que os jovens ‘não deixem de participar em nenhuma hora de tudo que diga a respeito de suas vidas’.
"Espero que vocês saibam que a gente tem que cultivar todos os dias. Drummond tinha razão: as leis não bastam, os lírios não nascem das leis. Mas somos capazes de cultivar - em qualquer tempo, em qualquer lugar, e principalmente para o gosto da gente e de quem vier depois da gente- o melhor da vida. Os lírios não nascem das leis, mas nascem desse cultivo diário que é feito", disse.
"A única flor que garante a liberdade de você cultivar o que você quiser na sua vida é a flor da democracia. Tudo mais é erva daninha. Nunca façam concessões com isso, não vale a pena", completou.
Lembrou que é de uma ‘geração que foi amordaçada, calada, que corria de polícia na rua, não tinha o direito de votar’. "Tenho o gosto do voto como um dever com o próximo e um direito de fazer da sua vida o que você quiser, para todos nós", frisou.
Cármen pediu que os jovens ‘entrem em campo’. "Não tenham nenhum momento de preguiça cívica pois o preço será um dia você ter que lutar muito mais fortemente pela democracia, pelas suas liberdades", destacou.
Cármen Lúcia também foi questionada sobre a composição atual do STF e a pressão pela indicação de uma mulher negra à cadeira vaga na Corte com a aposentadoria da ministra Rosa Weber. Respondeu que o que as mulheres esperam é ‘ter igualdade de condições não apenas de se fazerem representar, mas também de se apresentarem para participar de tudo da vida, incluindo a vida política e os espaços de poderes, entre eles o Judiciário’.
A ministra ressaltou como o Judiciário continua a ser preconceituoso com as mulheres, ‘machista’, e defendeu a transformação da ‘modelagem cultural perversa contrárias às mulheres’.
Cármen defendeu a luta pela igualdade afirmando: "Não há nenhuma boa vontade de quem detém o poder, em repartir esse poder".