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Campinas: ex-assessor promete "espaço" a PCC com reeleição de prefeito

"Esse era o cargo que eu queria te dar", prometeu um ex-assessor do prefeito de Campinas, Jonas Donizette (PSB), a um líder do grupo

Campinas: a administração diz que o assessor foi exonerado em 2015, "quando surgiram as acusações contra ele" (Reprodução/Reuters)

Campinas: a administração diz que o assessor foi exonerado em 2015, "quando surgiram as acusações contra ele" (Reprodução/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 13 de julho de 2018 às 13h20.

Última atualização em 13 de julho de 2018 às 13h25.

São Paulo - "Esse era o cargo que eu queria te dar", prometeu um ex-assessor do prefeito de Campinas, Jonas Donizette (PSB), a um líder do PCC. Condenado a 5 anos e 2 meses de reclusão por organização criminosa e perdoado por indulto, Alexandre Cora Francisco, o Xandão foi flagrado, em 2015, em conversa com Marcelo Celso dos Santos, o Kardec, acusado de ser responsável pela contabilidade da facção no interior de São Paulo.

O processo correu sob sigilo. A reportagem obteve acesso às transcrições dos grampos que pegaram o ex-assessor. Nas conversas, Xandão chega a dizer que o prefeito precisava se reeleger para que ele Kardec "ganhassem espaço" e "confiabilidade".

Xandão foi preso no primeiro dia de dezembro de 2015. De acordo com o pedido de prisão, foi descoberto que ele "mantém contatos com a liderança do PCC na região de Campinas, servindo de elo da organização com o serviço público e atividades políticas". Naquele dia, ele foi afastado da prefeitura, onde ocupava cargo de Assessor Técnico Departamental junto ao gabinete de Jonas Donizette.

A título de exemplo, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público Estadual em Campinas expôs à 6ª Vara Criminal de Campinas uma conversa entre ele e "um dos principais líderes do PCC na região, Marcelo Celso dos Santos, que, antes de ser preso, vinha exercendo função de Final do Financeiro, ou seja, responsável pelo controle da organização em todo o interior do Estado de São Paulo".

"O teor do diálogo é claro e deveras ilustrativo no sentido de demonstrar o envolvimento de criminosos ligados ao PCC com atividades políticas na região", afirmaram os promotores.

O prefeito, no entanto, não é investigado, porque o Gaeco entendeu que as investigações não encontraram indícios de irregularidades o envolvendo. Para a prefeitura, os diálogos obtidos pela reportagem "reforçam a afirmação do MP". A administração municipal ainda reforça que Xandão foi exonerado em 2015, "quando surgiram as acusações contra ele".

No diálogo, Xandão chega a dizer que daria seu próprio cargo a Kardec, como é conhecido o traficante. Inicialmente, ele reclama:

"Xandão - Tô lá...tô lá naquela caminhada que o cê sabe na prefeitura lá...os home não honraram a palavra deles comigo naquela situação...cê tá ligado..."

"Aham", responde Kardec.

"De dois cargos...me deram um...que é a qual eu estou. Tá?"

"Aham", repete.

"Mais não esqueci de você e nunca vou esquecer de você porque você é meu irmão. Cê sabe disso.

"Da Hora, pô. Da Hora", responde Kardec.

Xandão ainda ofereceu outros favores ao traficante, para quando ele tiver reivindicações políticas. "Isso...eu que peço parceiro, eu que peço. Entendeu? Pelo gabinete do prefeito...eu sou o braço direito do prefeito e do Vandão...Entendeu? Cê pode pergunta pro Gordo...E o Xandão? Como é que é lá? E ele vai fala pra vc, fio".

Wandão é o presidente do PSB em Campinas e Secretário de Relações Institucionais.

Ele também comemorou a possibilidade de sucesso de Donizette em sua campanha de reeleição em 2016, que depois o reconduziu ao cargo. O então assessor do prefeito dizia que, em uma nova gestão, ele e o líder da facção ganhariam "espaço".

"É bom pá Nóis (sic). Ele tem que ganha/tem que ganha parceiro. Porque daí Noi (sic) garante o nosso espaço...né? Confiabilidade. E o Jorge se ganha lá também em Hortolândia... por que o PT já era né...parceiro?.

Fundador do sindicato do transporte alternativo da região, ele se gaba de ter "nas mãos", setores do transporte da cidade ao líder do PCC. "Só vô fala uma coisa/eu vô te dá uma força não...hoje o presidente dos escolares tá na nossa mão...hoje o alternativo todo na nossa mão...hoje os táxis todos na nossa mão e hoje o fretado todo na nossa mão...fechando...eu que cuido deles, parceiro (sic)"

Dívida

O diálogo tinha um motivo. Xandão pedia ajuda de Kardec para amortizar uma dívida de US$ 80 mil que teria sido cobrada por um agiota de nome Jonas. "Ô, meu parceiro...minha ligação...e minha vinda até aqui atrás de você...é a questão de Hortolândia.. O Jorge não honrou com o Jonas, com o Baiano e co Pernambuco...dos 80 mil dólar lá...". E ainda completa. "O Jonas tá em cima de mim feito carniça".

O líder da facção orienta a cobrança. "Tem que ir lá no Jorge e dá uma dura no Jorge...mano. Levar eles até o Jorge e falar...aí Jorge tá aqui...Cê não deu a palavra pus cara? O cara tá aqui, ó...vai lá então e já põe os cara de frente".

Xandão reclama. "O doutor...ele que assumiu o barato. Agora que jogar o barato na minha costas mano? Eu falei Jonas...eu já me fudi pra caramba...o Duda deu a chacrinha dele...onde ele morava parceiro. Nói demo o sangue pra você (sic)".

Crime organizado

Xandão ainda foi flagrado em outras conversas nas quais reafirma suposta ligação com o PCC. No dia 31 de outubro de 2015, ele recebeu chamada de "Maurício Gordão", que é um "pé de borracha", cargo responsável pelo gerenciamento de veículos à facção.

De acordo com as transcrições, Xandão diz que "não entrou para o comando porque não quis, mas já corre com o comando faz muitos anos, e que seus parentes são do comando".

A outro homem não identificado, Xandão conversa sobre o transporte alternativo. Afirma que agora eles "vão assumir o barato, e é para o Doma falar que ele está junto na cooperativa, e o pessoal da prefeitura está junto com ele". Ele ainda indica doações políticas a um candidato a vereador não eleito em Campinas.

Em determinado momento da conversa, ainda comenta uma suposta traição entre criminosos, e que "no mundo em que caminham, no crime, não existe isso".

Perdão

Após cumprir parte da pena, Xandão foi contemplado por indulto após cumprir parte da pena em dezembro de 2017 - ele já respondia pelo processo em liberdade desde outubro.

"O executado comprovou padecer de cegueira bilateral, contraída após a prática do delito, bem como o cumprimento do lapso suficiente da pena a ele infligida para atender ao requisito objetivo temporal demandado pelo texto legal da indulgência principis", diz a decisão.

A Justiça ainda anotou que ele foi condenado a crimes inferiores a 8 anos e havia cumprido um terço da pena, obediência exigida pela constituição.

Inocência

Em relação ao processo que levou à condenação, Xandão afirma ser inocente. "Queria dizer a você que o mais prejudicado nessa história fui eu que, além de ficar cego, perdi meu emprego". E ressalta: "Tenho vizinhos que me conhecem inclusive investigadores, policiais, bombeiros, que ficaram indignados que fui acusado e me conhecem desde criança e meu dia a dia".

"Não sou criminoso. Não pertenço a facção nenhuma. Não sou traficante. Nunca fiz parte dessas coisas", afirma Xandão.

E ressalta seu trabalho para Jonas Donizette."Toda Campinas me conhece, o meu trabalho que fazia pelo gabinete do Prefeito".

O ex-assessor da prefeitura critica o vazamento das investigações. "Pode ser uma rivalidade política para querer me prejudicar". "Eu vou te dizer que não tenho mais esse problema com a Justiça. Eu não devo mais à Justiça esse processo. eu tenho indulto pleno que me isentou de todas e quaisquer acusações deste processo", conclui.

A prefeitura de Campinas de manifestou por meio de nota. "O assessor foi exonerado ainda em 2015, quando surgiram acusações contra ele. O cargo de assessoria é de livre nomeação e exoneração, não restando vínculos entre o profissional e a Administração. Sobre as declarações, o próprio Ministério Público já afirmou, à época, que não havia ligação entre as acusações feitas contra o ex-assessor e a Administração Municipal. O diálogo captado no grampo reforça a afirmação do MP".

Marcelo Celso dos Santos, o Kardec, e sua defesa não foram localizados pela reportagem. O espaço está aberto para manifestação.

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