Paralisação: Associação Brasileira de Caminhoneiros afirmou que a manifestação teve adesão massiva, de cerca de 200 mil motoristas (Rodolfo Buhrer/Reuters)
Reuters
Publicado em 21 de maio de 2018 às 21h41.
Brasília - Caminhoneiros realizaram nesta segunda-feira protestos em 19 estados e no Distrito Federal, afetando o transporte de cargas com impacto até no porto de Santos, em manifestação que pede redução da carga tributária sobre o diesel em meio a elevados preços do combustível mais utilizado no país.
As manifestações levaram integrantes da cúpula do governo a se reunirem com o presidente Michel Temer no início da noite para tratar da alta dos combustíveis e na terça deverá haver um diálogo com a Petrobras.
Após o encontro, o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, garantiu a jornalistas que o governo tratará do assunto "com responsabilidade" e que, na terça, o presidente da Petrobras, Pedro Parente, se reunirá com os ministros Moreira Franco (Minas e Energia) e Eduardo Guardia (Fazenda). De acordo com Marun, este será um encontro mais técnico e, a partir daí, serão analisadas medidas.
Sem uma decisão sobre a reivindicação dos caminhoneiros, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que o presidente está preocupado com a alta constante dos combustíveis, com a Petrobras repassando os ganhos do mercado internacional de petróleo, que está oscilando perto dos maiores valores em mais de três anos.
"Temos uma política internacional de preços que a Petrobras acompanha diariamente, e isso tem dado aumentos, com o dólar subindo e o petróleo subindo... O que vamos tentar agora é ver se encontramos um ponto em que possa haver um pouco mais de controle desse processo para que os maiores interessados... possam ter previsibilidade sobre o que vai acontecer", disse Padilha a jornalistas.
Ele afirmou ainda que o governo tem trabalhado para dar uma resposta aos caminhoneiros.
"Temos que trabalhar com a realidade, mas temos que ter uma resposta. Possivelmente hoje não, porque teremos que conversar com a Petrobras, possivelmente amanhã", acrescentou Padilha, ressaltando que Temer quer ver a questão resolvida da forma mais "palatável" aos cidadãos.
Os protestos contra os altos custos com o diesel foram realizados em dezenas de rodovias, com registro de interdições em muitas delas --a Polícia Rodoviária Federal não detalhou em seu site se as barreiras nas estradas eram totais ou parciais.
Importantes Estados agrícolas, como Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do Sul, Goiás e Minas Gerais, que estão escoando uma safra recorde de soja, registraram o maior número de interdições, segundo a PRF.
As manifestações afetaram o fluxo de mercadorias que entram e saem do porto de Santos, o maior da América Latina e o principal na exportação de soja, café, açúcar e suco de laranja, commodities que o Brasil lidera no mercado global.
"O acesso de veículos rodoviários de carga às instalações do porto de Santos ficou comprometido pela ação dos manifestantes. O fluxo de acesso já apresentava, desde as primeiras horas da manhã, significativa redução em virtude do anunciado movimento", afirmou em nota o porto de Santos.
O porto afirmou ainda que operações de carga e descarga de navios ocorreram normalmente, apesar de protesto de caminhoneiros, com alguns terminais contando com estoques. Santos recebe boa parte de produtos como soja, açúcar e farelo de soja por via ferroviária, o que reduz o impacto da manifestação para alguns terminais.
Mas se os protestos prosseguirem por mais tempo isso pode vir a comprometer os embarques brasileiros.
"Normalmente, essas paralisações são por tempo determinado. Elas teriam de se prolongar por alguns dias para ter impacto nos embarques de grãos... Pode acabar atrasando os recebimentos", disse o assistente-executivo da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), Lucas Trindade.
Representantes dos caminhoneiros disseram que os protestos continuarão na terça-feira.
A Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abcam), que organiza a greve, afirmou que a manifestação teve adesão massiva, de cerca de 200 mil motoristas, acrescentando que a maior parte das interdições tem sido parcial, ou seja, sem fechar completamente as vias.
O movimento cobra do governo reduzir a zero a carga tributária sobre o diesel. No meio da tarde, antes da reunião dos ministros, caminhoneiros realizavam um buzinaço em Brasília para chamar a atenção para o tema.
Desde que a Petrobras implantou em julho passado um sistema de reajustes mais frequentes de preços dos combustíveis, para refletir cotações internacionais do petróleo e do câmbio, tanto o diesel quanto a gasolina tiveram aumentos de quase 50 por cento nas refinarias da empresa.
Apesar dos protestos, a Petrobras anunciou nesta segunda-feira um novo aumento no preço do diesel e da gasolina nas refinarias.[nL2N1SS0O8]
"A Abcam entende o novo aumento do combustível como um desaforo a todos os trabalhadores brasileiros", disse o presidente da Abcam, José da Fonseca Lopes.
Já o setor de combustíveis afirma que boa parte do preço na bomba decorre da elevada carga tributária, enquanto a Petrobras afirma que não tem o poder de formar as cotações.
A greve dos caminhoneiros acontece enquanto entidades que representam os donos de postos também apelam por mudanças tributárias, afirmando que a política de preços da Petrobras está causando prejuízos ao setor.
Nesta segunda-feira foi a vez do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo (Sincopetro) também protestar.
"Essa política de preços da Petrobras satisfaz governos e investidores da companhia, mas expropria a população por meio do aumento dos custos de todas as mercadorias e serviços movimentados no país, e, como consequência, dos preços finais", afirmou o Sincopetro.
"Ficou difícil acompanhar a vertiginosa escalada dos preços dos combustíveis nas refinarias", acrescentou o sindicato, ressaltando que desde a mudança na política a Petrobras fez alterações nos preços --mais frequentemente para cima-- 125 vezes.
Procurada, a Petrobras não comentou o assunto imediatamente.
A última vez que os caminhoneiros promoveram protestos em âmbito nacional foi no início de 2015, quando exigiram redução de custos com combustível, pedágios e tabelamento de fretes.
Para o BTG Pactual, mudar a política de preços da Petrobras "não é a melhor opção".
"A outra opção é reduzir impostos. O problema é o impacto negativo sobre as contas fiscais do Brasil", diz o banco, lembrando que há, por exemplo, algum espaço para reduzir a Cide (Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico), mas com pouco impacto real sobre os preços.