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Câmara aprova projeto que flexibiliza licenciamento ambiental

Proposta permite que empresas com potencial poluidor ou de degradação ambiental façam uma autodeclaração de licenciamento

Plenário da Câmara votou projeto que muda licenciamento ambiental  (Kayo Magalhães / Câmara dos Deputados)

Plenário da Câmara votou projeto que muda licenciamento ambiental (Kayo Magalhães / Câmara dos Deputados)

Agência o Globo
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Agência de notícias

Publicado em 17 de julho de 2025 às 07h03.

Última atualização em 17 de julho de 2025 às 07h13.

A Câmara aprovou na madrugada desta quinta-feira, 17, por 267 votos favoráveis e 116 contrários, o projeto de lei que flexibiliza as regras do licenciamento ambiental no país. O texto, que segue para sanção presidencial, cria pelo menos sete tipos de licenciamentos que poderão ser obtidos de forma facilitada, um deles poderá ser obtido por meio de um termo de compromisso, assinado pelo empreendedor. Na prática, funcionará como uma autodeclaração.

O avanço do projeto representa uma derrota para a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e também para parlamentares e para a base ideológica mais à esquerda do governo, que apontam retrocessos ambientais. Parlamentares contrários ao texto reclamaram da aprovação e chamaram atenção para o fato de a votação ter sido feita em sessão remota e durante tarde da noite, adentrando a madrugada.

Por outro lado, os ministérios da Casa Civil, Transportes, Agricultura e Minas e Energia já sinalizaram serem favoráveis ao texto, sob a justificativa de que as medidas destravariam obras de infraestrutura em todo o país e melhorariam a capacidade do governo de fazer entregas.

Mesmo com o Poder Executivo dividido, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), orientou a base para votar contra o projeto.

O texto ainda precisará ter a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Caso o petista vete trechos ou todo o projeto, a decisão pode ser revista pelo Congresso Nacional. Ainda assim, integrantes do governo já disseram que as novas regras podem ser questionadas judicialmente.

Confusão

Durante a sessão, houve uma confusão envolvendo deputados da oposição e a deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG). Ela foi alvo de ataques e ironias dos parlamentares. O deputado Rodolfo Nogueira (PL-MS) disse que Célia precisaria de uma licença ambiental para usar o cocar com penas de pavão que ela trajava. Por sua vez, o deputado Kim Kataguiri (União-SP) declarou que a deputada estava usando "cosplay".

Após os ataques, a deputada pediu a palavra ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que a concedeu. No momento de sua fala, ela se emocionou e deputados bolsonaristas começaram um bate-boca. Motta então chegou a pedir a presença da Polícia Legislativa no plenário. A deputada do PSOL foi levada por integrantes de sua equipe para o café do plenário e começou a chorar lá, sendo aparada pelos deputados Glauber Braga (PSOL-RJ) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

Apresentado em 2004

O projeto que muda o licenciamento ambiental foi apresentado originalmente em 2004 pela Câmara, mas foi destravado apenas neste ano após um compromisso firmado entre o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), conhecida como bancada ruralista. O texto foi aprovado pelo Senado em maio e agora passou pela segunda votação na Câmara.

O relator do projeto, deputado Zé Vitor (PL-MG), manteve a emenda sugerida pelo presidente do Senado que cria uma modalidade de licença ‘especial’ para empreendimentos, mesmo que eles “utilizem recursos ambientais, efetiva ou potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente”.

Segundo o relator, as licenças especiais continuarão sendo emitidas pelo Ibama, mas o governo poderá determinar quais empreendimentos federais devem ser considerados estratégicos e, portanto, passar na frente da fila de análises de licenciamentos do órgãos.

"Não há alteração nas avaliações dos impactos ambientais, nas regras. Os órgãos licenciadores continuam avaliando os impactos. A lei não mexe nisso nem uma vírgula. Além disso, estamos inserindo expressamente que exista análise de risco para empreendimentos de alto impacto, por exemplo", afirmou Zé Vitor.

O novo tipo de Licença Ambiental Especial (LAE), proposto por Alcolumbre, abre caminho para que explorações ou obras como na Margem Equatorial , com possível impacto à Foz do Amazonas, possam se autorizados com maior facilidade. Alcolumbre é do estado do Amapá e tem interesse na exploração de petróleo na faixa do pré-sal, identificado na região.

Nos casos de demais empreendimentos, sem organização federal, os órgãos locais de Meio Ambiente, como secretarias estaduais e municipais, seguirão responsáveis pela emissão da licença, bem como o estabelecimento de regras.

As licenças autodeclarados, por exemplo, só poderão ocorrer para empreendimento de médio e baixo risco. Quem determina as áreas ambientais de alto, médio e baixo risco também são os órgãos locais.

Também permaneceu no texto a possibilidade de mineradoras de alto risco terem licença facilitada. O relator aceitou uma emenda do Senado que retirou o trecho da proposta original o qual determinava que prevalecerão as disposições do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), nos casos de mineração.

Em outro trecho, o texto também retira a necessidade do Ibama dar anuência para casos de desmatamento da Mata Atlântica. Zé Vitor justifica que hoje, boa parte dos pedidos já são aceitos pelo órgão federal, uma vez que os órgãos locais de licenciamento já fazem uma análise mais minuciosa dos casos.

O projeto ainda elimina a possibilidade de lideranças indígenas e quilombolas, como as exercidas por meio da Funai, tenham o poder de paralisarem obras que não estejam em áreas de demarcação.

A proposta sofreu resistência de uma ala do governo, ligada a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) reclamou do projeto durante a sessão.

"Como é possível acreditar que nós tenhamos licença ambiental especial, em que os interesses políticos e não a avaliação técnica possa definir um licenciamento?Como é possível aqui você estabelecer que há um autolicenciamento? O próprio empreendimento pode se autolicenciar. Como é possível você tirar a força dos órgãos da União, ou do Conama, nesse processo de licenciamento?"

Por outro lado, o líder do MDB, deputado Isnaldo Bulhões (AL), foi contra adiar a votação:

"No licenciamento ambiental, por exemplo, o governo é dividido. Essa é a realidade. Eu compreendo aqueles que têm muita dificuldade de apreciar, em qualquer que seja o momento, como a bancada evangélica, por exemplo, que tem muita dificuldade em votar pautas de costumes. Agora, a gente adiar a matéria para não ter acordo, eu não acho lúcido. Eu acho que não é viável."

O projeto também prevê que a licença ambiental pode ser renovada automaticamente, por igual período, sem a necessidade da análise de autoridades, a partir de declaração do empreendedor em formulário disponibilizado na internet, desde que não tenham sido alterados as características e o porte da atividade ou do empreendimento; tenham sido cumpridas as condicionantes ambientais aplicáveis ou, se ainda em curso, estejam sendo cumpridas conforme o cronograma aprovado pela autoridade licenciadora.

Entre os sete tipos de licenciamento, quatro deles podem permitir uma autodeclaração de empreendedores ou a renovação quase automática de licenças em áreas ambientalmente sensíveis. São elas:

  • Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC), que pode ser feita “mediante declaração de adesão e compromisso do empreendedor com os requisitos preestabelecidos pela autoridade licenciadora”;
  • Licença Ambiental Única (LAU), que estabelece, em uma única etapa, atesta viabilidade da instalação, da ampliação e da operação de atividade ou de empreendimento;
  • Licença de Operação Corretiva (LOC), regulariza atividade ou empreendimento que esteja operando sem licença ambiental, e
  • Licença Ambiental Especial (LAE): sugerida por Davi Alcolumbre, ato administrativo que estabelece condicionantes para o empreendimento estratégico ser instalado, ainda que utilizador de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente.
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