Amazônia: relatório alerta para ameaça de redução de áreas protegidas no País, que pode aumentar o desmatamento e emissões. (foto/Divulgação)
Vanessa Barbosa
Publicado em 17 de maio de 2017 às 18h24.
Última atualização em 17 de maio de 2017 às 18h26.
São Paulo - Você já se perguntou por que existem florestas e áreas de natureza protegidas? Ao longo de séculos, muitas áreas verdes, com toda diversidade de plantas e bichos, foram dominadas e destruídas para erguer cidades e alimentar populações humanas crescentes. A história do desenvolvimento econômico baseia-se na exploração e transformação do meio ambiente, com ajuda de tecnologias, para sustentar um determinado ideal de estilo de vida e a produção e consumo associados a ele.
O surgimento dos primeiros jardins botânicos e zoológicos na Europa, por exemplo, foi motivado pelo interesse de famílias abastadas em exibir uma coleção particular de plantas de valor estético ou animais exóticos. Da ideia de que a natureza deve ser preservada por suas características físicas surgiu o primeiro parque nacional do mundo, o Yellowstone, nos Estados Unidos, em 1872. Do século XX em diante, porém, o discurso conservacionista ganharia destaque nos debates sobre o futuro da humanidade por razões que vão muito além da beleza cênica.
As áreas protegidas são o principal mecanismo para conservação da biodiversidade e de serviços ambientais, e são manejadas para fins diversos, que incluem pesquisa científica, manutenção de equilíbrio climático e ecológico, proteção da vida selvagem, conservação de espécies e de ecossistemas, proteção de belezas naturais, educação ou uso sustentável. Ou seja, a conservação da natureza anda de mãos dadas com a manutenção das condições básica para a vida por aqui.
A importância da preservação de florestas é tamanha que a lei brasileira define unidade de conservação como "espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regimes especial de administração, ao qual se aplicam as garantias adequadas de proteção".
Apesar dos marcos regulatórios, o Brasil corre risco de perder 10% do território das unidades de conservação federais. Está em curso uma ofensiva contra as áreas protegidas, que vai de Norte a Sul do país, e envolve uma área de cerca de 80 mil de quilômetros quadrados, quase o tamanho do território de Portugal, estima um relatório lançado hoje (17) pela organização ambientalista WWF.
Segundo a organização, esse processo é marcado pelo confronto entre dois blocos: de um lado, produtores rurais que ocupam irregularmente ou gostariam de ocupar essas áreas protegidas, empresas de mineração ou grileiros de terras públicas. De outro, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), que colocou o Brasil no final da década passada na posição de líder mundial em extensão de áreas protegidas.
Na medida em que um dos lados ganha mais força, o impacto nas áreas protegidas pode resultar em mais desmatamento da Amazônia, com prejuízo às metas brasileiras para a redução das emissões de gases de efeito estufa na Convenção do Clima das Nações Unidas, além de implicar o desmonte do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA) e ameaçar o cumprimento dos compromissos assumidos pelo na Convenção da Diversidade Biológica (CDB).
Um dos projetos em tramitação no Congresso Nacional que propiciam esse cenário, o PL 3751, torna caducos todos os atos de criação de unidades de conservação cujos proprietários privados não foram indenizados no período de cinco anos.
Para se ter uma ideia do impacto dessa proposta, o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) calculou em 56 mil quilômetros quadrados a extensão de terras privadas ainda não indenizadas no interior de UCs federais, mas o número poderia chegar a 100 mil quilômetros quadrados, segundo o próprio instituto.
Caso aprovada, a proposta representaria o desaparecimento de aproximadamente 10% das áreas protegidas em UCs federais no país, que somavam, em agosto passado, 788 mil quilômetros quadrados. E mesmo as áreas protegidas por lei não estão a salvo.
O desmate de florestas dentro das Unidades de Conservação da Amazônia Legal alcançou quase 2.300 quilômetros quadrados em 2015, segundo levantamento do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), com base em dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Aumentaram não apenas a taxa de desmatamento nas áreas protegidas como o seu peso no corte de árvores total da região, que dobrou de 6% para 12% entre 2012 e 2015.
O desmatamento se concentrou em 50 unidades de conservação localizadas na fronteira agropecuária ou que estão sob influência de projetos de rodovias e hidrelétrias, por exemplo. O Imazon atribuiu o aumento do desmatamento a um movimento para reduzir o grau de proteção ou a área de algumas unidades.
O entorno da BR-163 foi considerado a área mais sensível, e a Floresta Nacional do Jamanxin, no município de Novo Progresso, no Pará, a mais desmatada de todas as áreas protegidas. Só em 2015, a região perdeu mais de 90 quilômetros quadrados de floresta.
Ontem (16), o plenário da Câmara dos Deputados aprovou a Medida Provisória (MP) 756 que altera os limites da Floresta Nacional do Jamanxim. A ideia é desmembrar a floresta nacional e rebaixar uma parte dela para uma categoria inferior de proteção ambiental, que permite ocupação humana e atividades econômicas sujeitas a regras específicas.
O desmembramento da floresta de Jamanxim deve liberar uma área equivalente a quase quatro vezes o tamanho da cidade de São Paulo para exploração de madeira, minerais e agropecuária. Outra justificativa é a passagem de uma ferrovia para transporte de grãos na região. A MP segue agora para o Senado e, se aprovada, passará à sanção presidencial.