O Brasil é competitivo apenas do lado de dentro da fábrica, diz vice-presidente da Abimaq (ARQUIVO/EXAME)
Da Redação
Publicado em 13 de abril de 2011 às 07h18.
São Paulo – “Os estrangeiros veem o Brasil como um high-cost country.” A constatação é do primeiro vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq), José Velloso, que está na China acompanhando a missão comercial e política. Antes, esteve durante dez dias na Alemanha participando da Feira de Tecnologia Industrial de Hannover.
Em entrevista por telefone a EXAME.com, Velloso enumerou as dificuldades do setor produtivo brasileiro. “Temos a questão do câmbio valorizado, a maior taxa de juros do mundo, elevada carga tributária e péssima infraestrutura. Quando a gente chega a um país como a China, que tem o câmbio extremamente desvalorizado, baixo custo sobre a folha de pagamento e ainda possui inúmeros subsídios nos financiamentos, isso lhe confere uma competitividade muito grande da porteira para fora das fábricas. Do lado de dentro das empresas, nós somos competitivos, o brasileiro é empreendedor, mas a conjuntura econômica tira a nossa competitividade. Atualmente, eu diria que 85% da responsabilidade está no câmbio. Na China e na Alemanha, o Brasil é encarado como um high-cost country, ou seja, um país de alto custo.”
O empresário disse que a presidente Dilma está batalhando para que o Brasil deixe de ser um mero exportador de produtos primários, como soja, minério de ferro, derivados de petróleo e celulose. “Nós temos a vontade e o discurso de vender produtos de alto valor agregado, mas, na prática, o que está acontecendo é o contrário. Os brasileiros estão vindo buscar bens manufaturados, intermediários e componentes na China.”
O vice-presidente da Abimaq salienta que não bastam as boas intenções do governo brasileiro. “Veja o exemplo que foi dado aqui (em seminário na China). O Brasil não quer vender minério, quer vender aço. O Brasil não quer vender celulose, quer vender papel. Ora, papel e aço continuam sendo bens de baixo valor agregado. Eu sinceramente acredito que, na atual conjuntura econômica, por mais boa vontade que o governo da presidente Dilma tenha, vai ser muito difícil sair da boa intenção e ir para a prática. Ainda existe lição de casa para ser feita no Brasil.”
Questionado por EXAME.com se os chineses deram algum sinal de ajuda no câmbio, o executivo foi enfático: “A China não tem que ajudar nada, ela faz a lição de casa dela. A China pensa na China. O Obama pensa nos Estados Unidos e assim por diante. Quem tem que fazer a nossa lição, somos nós.”
Velloso lembra que, desde 2004, quando o então presidente Lula fez a primeira visita à China, o Brasil tem aumentado as exportações. “Mas são produtos sem valor agregado. São matérias-primas e semi-manufaturados. Enquanto isso, a China exporta para o Brasil automóveis, eletrônicos e bens de capital. O setor de máquinas brasileiro não vende quase nada para a China, que, por sua vez, passou do 15º lugar para o 2º lugar no ranking dos países de origem das nossas importações de equipamentos, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Em 2004, era menos de 1% e agora 17% das importações de máquinas vêm de lá. Ainda não é muito, mas a velocidade de crescimento assusta. E olha que há um problema sério de qualidade das máquinas chinesas, que são 40% mais baratas.”
O empresário já esteve outras vezes na China e sempre fica admirado com a infraestrutura. “Eu conheço vários aeroportos do mundo e não conheço nada parecido com o de Pequim. A estrutura de transportes é impressionamte. Os Jogos Olímpicos deixaram um grande legado. Há problemas como poluição, exclusão social e baixa distribuição de renda, mas você percebe que eles estão sempre evoluindo.”
O ponto alto do discurso da presidente Dilma, na opinião do representante da Abimaq, foi quando “ela disse que quer fazer negócios com países que respeitam a questão social, o clima e a sustentabilidade. Isso mostra uma mudança de postura da diplomacia brasileira.”