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Brasil é o país que menos fez quarentena na América Latina

Na comparação com os principais países da região, como Argentina, México, Colômbia e Chile, o Brasil teve os maiores índices de circulação de pessoas para trabalho, varejo e lazer

Movimentação na avenida Paulista: a volta à rotina presencial foi mais rápida no Brasil, segundo números de deslocamento (Roberto Parizotti/Fotos Públicas)

Movimentação na avenida Paulista: a volta à rotina presencial foi mais rápida no Brasil, segundo números de deslocamento (Roberto Parizotti/Fotos Públicas)

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Carolina Riveira

Publicado em 14 de fevereiro de 2021 às 08h01.

Que os índices de isolamento social têm diminuído nos últimos meses, é sabido. Com o prolongamento da pandemia, mais pessoas encerraram a quarentena e retomaram o trabalho presencial, assim como outras atividades.

O movimento aconteceu em todo o mundo. Mas números de deslocamento do Google ao longo do ano passado mostram que esse processo de retorno à rotina foi mais rápido no Brasil. Mesmo nos piores momentos da pandemia, o Brasil foi o país em que a população mais teve cidadãos se deslocando na comparação com os principais vizinhos da América Latina.

Com exceção de março, primeiro mês de isolamento e quando os índices de mobilidade do Brasil estiveram no nível mais baixo até agora, o Brasil liderou o "ranking da mobilidade" entre os principais países latino-americanos.

Os números são do Google Mobility Trends, compilados pelo banco Morgan Stanley. O Google tem divulgado taxas de mobilidade com base em informações de localização anônimas dos celulares. A empresa usa como parâmetro a visita (e tempo de permanência) em locais de trabalho, lazer ou compras, tendo fevereiro de 2020 -- o último mês pré-pandemia -- como régua de comparação.

Em todos os países analisados, o percentual de pessoas indo ao trabalho ou a atividades de lazer e varejo (como a lojas e outros centros de compras) foi subindo gradativamente desde março, porém com mais força no Brasil (veja nos gráficos abaixo).

Desde abril o Brasil tem mais de 80% do movimento pré-pandemia no trabalho. Como mostrou reportagem da EXAME, a ida ao trabalho presencial aumenta a circulação de pessoas nos espaços da cidade, como o transporte público, propiciando maiores chances de contágio.

Os números do Google corroboram análise da Pnad-Covid, do IBGE, que mostrou que o Brasil tinha em setembro menos de 10% dos trabalhadores em regime de trabalho remoto, segundo os últimos dados disponíveis.

Em determinado momento, em novembro, o Brasil teve até mesmo maior movimentação de pessoas no trabalho presencial do que em fevereiro, no pré-pandemia. Já em dezembro, os números mostram uma queda brusca nas idas ao trabalho, diante dos recessos de fim de ano.

Foi também em novembro que o Brasil atingiu seu pico de mobilidade para lazer/varejo, mais de 80% da movimentação que foi registrada em fevereiro de 2020.

No fim de janeiro, o Brasil seguia tendo a maior movimentação percentual entre os países analisados: 71% para lazer/varejo (ante 62% do México, segundo colocado) e 93% para trabalho (à frente da Argentina, com 82%).

O Brasil teve menores índices de isolamento mesmo do que países com maior taxa de informalidade e com menor rede de proteção social, como o México, em que 60% da população trabalha no mercado informal, ante 40% no Brasil antes da pandemia -- índice parecido ao da Argentina e pouco maior que o do Chile.

Novas quarentenas e a economia em 2021

Os níveis menores de isolamento do Brasil e quarentenas menos restritivas não fizeram necessariamente com que escapassem da crise negócios mais dependes da mobilidade, sobretudo no setor de serviços -- como bares, restaurantes, salões de beleza, turismo e outras frentes.

No ano passado, o setor de serviços encerrou em queda de 7,8%, um recorde negativo e muito mais do que indústria (queda de 4,5%) e varejo (alta de 1,2%, beneficiado pelo auxílio emergencial e compras online).

O movimento é especialmente ruim para a economia porque o setor de serviços respondia antes da pandemia por mais de dois terços dos empregos no Brasil.

O Morgan Stanley afirma que uma preocupação é o avanço do número de casos e mortes por coronavírus em toda a América Latina, o que pode levar à imposição de novas quarentenas mais restritas neste começo de ano.

No entanto, o relatório afirma que as restrições de mobilidade nos últimos meses parecem não ter impactado as economias nos mesmos níveis do começo da pandemia, a julgar por índices como o PMI (índice gerente de compras, que serve como um parâmetro da atividade esperada nos meses seguintes para indústria e serviços). O PMI latino-americano enfrenta quedas, mas menores do que em 2020.

Isso se deve, em parte, à adaptação de muitas empresas para continuar os negócios mesmo em meio ao isolamento. Ainda assim, negócios amplamente dependes da atividade presencial devem seguir sofrendo até que se contenha o vírus.

Os analistas do Morgan Stanley apontam que a América Latina como um todo dependerá da velocidade da vacinação para sua recuperação econômica, e que números econômicos melhores devem ser vistos a partir de abril. No ano passado, o produto interno bruto (PIB) da região deve ter caído 6,7%, segundo projeção do banco, e a expectativa é que cresça 4,9% em 2021, ainda sem recuperar totalmente as perdas.

"Embora esperemos quedas sucessivas na atividade na maioria das economias da América Latina no primeiro trimestre, nós visualizamos uma retomada no segundo e terceiro trimestres de 2021, dependendo do resultado das campanhas de vacinação", diz o relatório. Apesar disso, é possível "que a América Latina fique atrás de outras regiões" na vacinação, especialmente de países mais desenvolvidos.

Por outro lado, a avaliação no relatório é de que os países da região se beneficiam ao ter uma população relativamente mais jovem do que lugares como EUA e Europa, o que tende a sobrecarregar menos o sistema de saúde e levar à imposição de quarentenas menos rígidas por parte dos governos locais.

Apesar disso, o colapso em estados como Amazonas e Pará no Brasil mostra que o coronavírus fora de controle pode levar a hospitais lotados e cenas de tragédia. A segunda onda do coronavírus, em especial com as novas variantes mais contagiosas -- já detectadas na América Latina -- tem levado países em todo o mundo a novos picos de casos e mortes que devem seguir prejudicando a economia.

Enquanto não se chega a uma vacinação em massa, seguem sendo necessárias medidas de distanciamento a quem puder fazê-lo e conscientização da população para uso correto de máscaras e busca por ambientes ao ar livre. A retomada econômica só acontecerá com combate efetivo ao vírus -- e nisso, economistas e médicos estão em total concordância.

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