Agência Caixa: Para o Nordeste, foram fechadas menos de dez operações de empréstimo, que juntas totalizam R$ 89 milhões, ou cerca de 2,2% do total - volume muito menor do que em anos anteriores (Pilar Olivares/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 2 de agosto de 2019 às 13h14.
Última atualização em 2 de agosto de 2019 às 14h43.
O presidente da República, Jair Bolsonaro, contestou nesta sexta-feira, 2, reportagem do Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) e do jornal O Estado de S. Paulo sobre o baixo número de empréstimos a estados e municípios do Nordeste. Para ele, as prefeituras da região são as mais inadimplentes do país. "Houve um equívoco nessa informação. As prefeituras do Nordeste são as mais inadimplentes e a Caixa precisa de garantias para poder emprestar", disse.
Ao ser questionado sobre a reportagem, ele ligou para o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, e colocou no viva-voz para que os jornalistas que o aguardavam na saída do Palácio da Alvorada pudessem ouvir a explicação.
Guimarães respondeu que "não existe nenhuma indicação para não favorecer uma região ou outra". "Este ano liberamos muito mais dinheiro para a Região Nordeste. O que acontece é que você tem uma série de esteiras de análise. Neste momento, estamos analisando inclusive para o Estado da Paraíba e para o município de São Luís (MA)", disse.
O presidente da Caixa afirmou ainda não reconhecer o dado de 2,2% de empréstimos à região como mostrou reportagem do Broadcast na quinta-feira, 1º de agosto, e do jornal O Estado de S. Paulo nesta sexta. "Esse dado não é algo que reconhecemos. Simplesmente pegaram um dado específico, mas vai ser normalizado. Mas se é 20%, 15%, essa é uma análise técnica. É matemática", disse.
Ao encerrar a ligação, Bolsonaro afirmou que "isso é igual o desmatamento", em referência a dados oficiais contestados por ele recentemente.
A Caixa reduziu a concessão de novos empréstimos para o Nordeste neste ano, mostra levantamento feito pelo Estadão/Broadcast com base nos números do próprio banco e do sistema do Tesouro Nacional.
Em 2019, até julho, o banco autorizou novos empréstimos no valor de R$ 4 bilhões para governadores e prefeitos de todo o país. Para o Nordeste, foram fechadas menos de dez operações, que juntas totalizam R$ 89 milhões, ou cerca de 2,2% do total - volume muito menor do que em anos anteriores.
No ano passado, a região recebeu R$ 1,3 bilhão, o equivalente a 21,6% dos R$ 6 bilhões fechados pela Caixa em operações para governos regionais. Em 2017, o banco contratou R$ 7 bilhões, dos quais R$ 1,3 bilhão foi direcionado para governadores e prefeitos nordestinos (18,6% do total).
Segundo apurou o Estadão/Broadcast com fontes do banco e da área econômica, a ordem para não contratar operações para os estados e municípios do Nordeste veio do presidente Pedro Guimarães. Sob condição de anonimato, elas confirmam que ouviram a orientação em mais de uma ocasião.
Na quarta-feira, 31, ao saber do teor da reportagem, Guimarães prometeu conceder uma entrevista na última quinta-feira, 1º, sobre esse ponto. O banco, porém, apenas enviou uma nova nota. Nela, afirmou que as contratações (novas concessões) apresentam "sazonalidade" e variação ano a ano, "dependendo ainda do número de pleitos recebidos bem como da aprovação dos ritos anteriormente relacionados".
Segundo o banco, de R$ 2,8 bilhões desembolsados neste ano para Estados e municípios, R$ 706 milhões foram para o Nordeste, "número expressivo em âmbito nacional".
Os desembolsos são diferentes das contratações porque estão relacionados a contratos que foram firmados em anos anteriores. A Caixa não respondeu sobre os números de contratações neste ano.
Na semana passada, o banco orientou a reportagem a fazer a procura no site. Depois, ao ser questionada sobre a queda na participação do Nordeste na comparação com o que foi contratado nos anos anteriores, a Caixa destacou "problemas de endividamento" decorrentes da crise pela qual passam alguns estados e municípios, inclusive das regiões Norte e Nordeste.
As operações do Nordeste neste ano saíram para seis municípios baianos, um de Pernambuco e outro de Sergipe.
Ao contrário do que diz o banco, o Estadão/Broadcast apurou que há uma fila de pedidos de empréstimos para a região Nordeste que não foram autorizados pela instituição. Entre eles, está o de um financiamento de R$ 133 milhões para a prefeitura de São Luís (MA), para bancar obras de infraestrutura. O pedido do prefeito Edivaldo Holanda Júnior (PDT) foi feito no dia 9 de maio e até hoje não houve uma resposta.
A orientação para a área técnica, segundo apurou a reportagem, era de não aprová-lo mesmo estando tudo certo. A estratégia foi protelar até os documentos vencerem em 30 de junho. A prefeitura de São Luís foi procurada, mas não se manifestou.
Situação oposta teve a prefeitura de Florianópolis, de Gean Loureiro (sem partido). O pedido de crédito de R$ 100 milhões para obras de infraestrutura, transporte, energia e logística feito no início de julho foi atendido em menos de uma semana e anunciado solenemente por Pedro Guimarães no dia 17 de julho, quando visitou a cidade. Para a solenidade estava prevista a presença do presidente Jair Bolsonaro, que cancelou a ida.
O governo da Paraíba, de João Azevedo (PSB), também fez um pedido de R$ 188 milhões no dia 11 de junho e também ficou sem resposta. O Estado informou que ainda aguarda aval da Caixa para operação.
Neste mês, antes de um café da manhã com jornalistas estrangeiros, em uma conversa informal com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que daqueles "governadores de 'paraíba', o pior é o do Maranhão; tem que ter nada pra esse cara". Depois, se justificou dizendo que fez uma crítica de "três segundos" aos governadores do Maranhão e Paraíba, que são "intragáveis".
Para conseguir um desembolso de R$ 293 milhões em 8 de julho, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), precisou recorrer à Justiça e, mesmo depois de decisão favorável, teve que esperar algumas semanas. A operação foi travada por pendências de documentação. O governo estadual, porém, as sanou e conseguiu que a Justiça determinasse o repasse.
Já Goiânia recebeu sinalização de que vai conseguir R$ 780 milhões para mobilidade urbana mesmo sem aval da União (ou seja, se o município der calote, o governo federal não cobre). O pedido de Iris Rezende (MDB) foi feito em 7 de julho.
Para justificar a queda na participação do Nordeste no total de empréstimos aprovados para Estados e municípios neste ano, a Caixa afirmou que as contratações das operações apresentam "sazonalidade ao longo do exercício" e também variação ano a ano dependendo ainda do número de pleitos recebidos. O banco ressaltou ainda que a aprovação depende ainda das câmaras municipais e assembleias legislativas, além da Secretaria do Tesouro Nacional, entre outros ritos.
A Caixa informou que tem 589 operações de financiamento ativas com a Região Nordeste, totalizando R$ 20,2 bilhões. Não foi informado o total com as outras regiões. Segundo o banco, esses contratos envolvem aportes em saneamento básico, infraestrutura urbana, mobilidade urbana, energia e construção naval.
O banco disse ainda que o presidente Pedro Guimarães e membros da alta gestão visitaram todos os Estados do Norte do País e já estiveram em seis Estados do Nordeste: Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte. O banco afirmou que, "tendo observado a crise pela qual passam alguns Estados e municípios, inclusive das Regiões Norte e Nordeste", que estão com problemas de endividamento, oferece assistência técnica gratuita que "acompanha e orienta o ente na equacionalização da saúde financeira." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.