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Bolsonaro já estuda "Plano B" após Senado derrubar decreto de armas

Há duas estratégias em curso no governo: uma delas seria avançar projetos de leis que já estão em tramitação no Parlamento, a outra, é apelar para o STF

Jair Bolsonaro: Senado não aprovou seu decreto de porte de armas e agora presidente pensa em Plano B (Alan Santos/PR/Divulgação)

Jair Bolsonaro: Senado não aprovou seu decreto de porte de armas e agora presidente pensa em Plano B (Alan Santos/PR/Divulgação)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 19 de junho de 2019 às 08h16.

Última atualização em 19 de junho de 2019 às 08h53.

Brasília - Apesar da pressão do presidente Jair Bolsonaro, o Senado derrubou, por 47 votos a 28, os decretos de 7 e 21 de maio que flexibilizam regras para o porte de armas. Foi a maior derrota imposta pelo Senado ao governo. Antes da votação, Bolsonaro usou redes sociais, eventos públicos e entrevistas para pedir votos a favor da proposta, um a bandeira de campanha. E ligou pessoalmente para senadores. "Não deixe o projeto morrer", disse ele nesta terça-feira, 18.

As normas de maio ampliam as categorias profissionais com direito ao porte de arma, elevam o limite de cartuchos que podem ser comprados por ano e facilitam a prática de tiro esportivo por adolescentes. A decisão dos senadores pode ser revertida na Câmara dos Deputados, mas o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já sinalizou que a proposta também não deve prosperar entre os deputados. "O governo tem uma defesa do decreto que acho frágil, mas respeito."

A gestão Bolsonaro já estuda até um "plano B". "Temos de buscar uma alternativa, retirar um ponto ou outro, mas manter a espinha dorsal", afirmou a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP). A reportagem apurou que há duas estratégias em curso no governo: a primeira é de avançar projetos de leis que já estão em tramitação no Parlamento. Um deles seria do ex-senador Wilder Morais (PP-GO) que permite a posse de arma em toda propriedade rural e não só no imóvel.

Outra estratégia é questionar no Supremo Tribunal Federal (STF) a decisão do Congresso. Parlamentares governistas alegam que os decretos legislativos que tentam barrar as mudanças discutem o mérito da proposta e a possibilidade de o presidente decidir sobre isso.

Ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni disse "ter certeza" de que o STF vai julgar, na semana que vem, procedentes os decretos. Mas a Corte já impôs derrota ao governo ao impedir que Bolsonaro acabasse com conselhos federais por decreto.

O presidente falou nesta terça em uma alternativa, sem precisar da aprovação legislativa: determinar ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, que a Polícia Federal não dificulte a posse de armas em casa. "A Polícia Federal está sob meu comando. No Brasil, o grande 'reclamo' do pessoal do passado era com a PF, na questão de comprovar efetiva necessidade (quando o interessado explica porque deveria ter a arma) Como presidente, isso vai ser atenuado." Mas, no Twitter, Bolsonaro ainda fez novo apelo à Câmara, pedindo que respeitem o "legítimo direito à defesa".

Se confirmada a queda dos decretos, segundo as assessorias do Executivo e do Legislativo, restará em vigor apenas o primeiro decreto de Bolsonaro relativo ao tema, de janeiro - sobre posse de arma em casa ou estabelecimento comercial.

Debate

Nesta terça, senadores criticaram o modo como a questão chegou ao Congresso. "O Senado não se intimida com esse bombardeio de robôs, de maníacos, reacionários, que acham que não é através do diálogo, da lei e da polícia que se resolvem as coisas. Que o presidente arme e treine os policiais, porque não podemos permitir que as pessoas cuidem sozinhas das próprias vidas", disse a senadora Kátia Abreu (PDT-TO).

Com base em parecer jurídico da consultoria do Senado, parlamentares contrários disseram que o Planalto extrapolou suas prerrogativas. O texto, diz a consultoria, tem nove pontos inconstitucionais e abre brechas para facilitar o acesso a armas. O decreto permite, por exemplo, que envolvidos em "atividade profissional de risco" e sob "ameaça à integridade física" tenham arma, o que inclui até advogados e jornalistas.

Antes da votação, dez senadores discursaram a favor e contra. Entre os defensores estava Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente, que passou o dia telefonando para colegas e fez um dos discursos mais enfáticos. "O projeto de decreto legislativo (de anular a regra do presidente) é flagrantemente inconstitucional."

O discurso foi interrompido por manifestação do deputado Pastor Sargento Isidório (Avante-BA), que levou cartaz com a frase "Armas não, livros sim" e angariou votos contrários com uma Bíblia na mão. "Vamos falar pra mulher estuprada que ela pode atirar um livro na cabeça do estuprador e não dar tiro para defender sua vida e integridade física", disse Flávio, em resposta.

"A defesa de sua política de segurança foi o que permitiu ao presidente ter a expressiva votação que teve", afirmou o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-CE). Para o senador Renan Calheiros (MDB-AL), "o que está na raiz desta decisão é se o presidente pode continuar governando por decreto". Ele destacou ainda publicação em rede social nesta terça do guru do bolsonarismo, o escritor Olavo de Carvalho, dizendo que "o Parlamento só existe para impedir que a vontade do povo prevaleça".

Com só 4 votos no Senado, o partido do presidente (PSL) votou unido para manter os decretos, mas as posições de MDB e PSDB foram fundamentais na derrota. Mais à noite, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sugeriu que o Congresso discuta em conjunto um projeto de lei, mas "em relação à posse de armas".

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