André Mendonça (Nelson Jr./SCO/STF/Flickr)
Agência de notícias
Publicado em 24 de abril de 2023 às 17h26.
Última atualização em 24 de abril de 2023 às 17h49.
Segundo Mendonça, é "muito mais simples definir a situação fática" dos investigados que foram presos em flagrante durante os atos que deixaram um rastro de destruição na Praça dos Três Poderes, não sendo "necessariamente possível" fazer o mesmo com relação aos outros 50 denunciados, apontados como incitadores dos atos e detidos no acampamento montado em frente ao QG do Exército em Brasília.
Nessa linha, o ministro ressaltou que há questões "para ele fundamentais", a começar pelo fato de o STF ter um histórico de defesa das garantias com relação ao processo (direito de defesa, o princípio do juiz natural).
"Não necessariamente agora no ambiente da denúncia, mas em algum momento do julgamento dos casos, se eu aplico essa corrente mais garantista ou se eu entro em uma vertente que se concebe, teoricamente como direito penal do inimigo. É um dilema porque eu serei cobrado a aplicar a Justiça. Quais os contornos vão definir."
Mendonça destacou ainda um segundo ponto: a interpretação restritiva de foro por prerrogativa de função no STF. Ele lembrou que só é julgado na Corte máxima quem comete crime como parlamentar federal, em casos em que a conduta está ligada ao exercício do mandato. "E nenhuma dessas 100 pessoas está nessas circunstâncias. Esse para mim é um ponto que merece reflexão não apaixonada", anotou.
As ponderações se deram durante palestra durante reunião-almoço promovida pelo Instituto dos Advogados de São Paulo. A fala de Mendonça teve como tema os desafios do Supremo Tribunal Federal em 2023. Ele disse não defender nem uma 'aplicação literal da lei', nem 'uma interpretação independente da lei', mas uma interpretação seguindo os valores que estão expressos na Constituição.
"Por isso que eu digo, não são os meus valores. Porque penso que no Estado de Direito, o que permanece é verdade que está expressa no texto que está na Constituição. Vejam os panoramas. E se eu abro a exceção hoje, como é que eu faço no futuro, para outros casos? Então tenho aqui dois grandes dilemas: a do juiz natural e quais os contornos que eu vou dar na interpretação das condutas diante do marco positivados dos crimes - a questão do dolo da culpabilidade, dos limites da liberdade de expressão", seguiu sobre o julgamento ligado aos atos golpistas do 8 de janeiro.
Ao início de sua exposição, Mendonça ponderou que, em sua avaliação, um dos grandes desafios da Corte é 'ter noção das limitações que o texto legal dá, mas ter uma atitude autocontida diversa de uma ativista'. "É preciso aplicar a justiça, mas a justiça a partir da lei. O prisma de interpretação são os princípios e os valores, mas o objeto de interpretação tem que ser a lei. Porque a lei, bem ou mal, foi a resposta que a sociedade conseguiu dar, nesse momento histórico, de consenso", anotou.
"O papel que eu desempenho é um papel que demanda de mim limites. E quais o limites? O primeiro é o texto da Constituição. Eu tenho que privilegiar a norma posta, mas não sou escravo da injustiça ou das convenções que estão na norma. Além disso, quando eu, como aplicador de direito, quero fazer prevalecer a minha compreensão do mundo, eu tendo a gerar tensões no ambiente social. Precisamos dar as respostas muitas vezes duras e complexas, mas também existe uma divisão de poderes, instituições e papeis distintos a serem exercidos na sociedade. A democracia pressupõe isso", ressaltou.