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Até quando SP vai ressuscitar (e esgotar) volumes mortos?

Especialistas veem com ressalvas ideia do governo de usar a reserva técnica do Alto Tietê e defendem racionamento para evitar colapso do sistema

Solo ressecado é visto na represa de Jaguary, em Bragança Paulista (Nacho Doce/Reuters/Reuters)

Solo ressecado é visto na represa de Jaguary, em Bragança Paulista (Nacho Doce/Reuters/Reuters)

Vanessa Barbosa

Vanessa Barbosa

Publicado em 24 de julho de 2014 às 09h37.

São Paulo – O Sistema Cantareira falece a olhos vistos. Seu volume de água útil acabou. Sobrou apenas o volume morto para abastecer cerca de 9 milhões de pessoas na Região Metropolitana de São Paulo. Mas a reserva técnica já dá sinais de exaustão: o nível de água marca 16,6% nesta quarta-feira (23). Para afastar preocupações, o governo anunciou um backup: pretende recorrer ao volume morto do Alto Tietê.

Especialistas ouvidos por EXAME.com veem com reserva a proposta, anunciada nesta semana, de utilizar 25 bilhões de litros da reserva técnica do sistema a partir de agosto. O motivo é simples: é insustentável ressuscitar reservas atrás de reservas e esgotar uma a uma.

Como medida emergencial para contornar a crise hídrica, o Alto Tietê já vem socorrendo os bairros da capital paulista há algumas semanas, o que tem feito seus níveis caírem em ritmo alarmante.

Para piorar, o uso do volume morto deve garantir menos de um mês de sobrevida ao manancial. Resultado: sem ajuda de São Pedro, os dois maiores sistemas que abastecem a Grande São Paulo podem entrar em coma até o final do ano.

O raciocínio de que a crise atual será resolvida com novas fontes de água se mostra perigoso.

“Esses mananciais precisam ser preservados e não explorados à exaustão. É uma questão de preservação da qualidade da água”, diz Roberta Baptista Rodrigues, doutora em recursos hídricos e professora dos cursos de Engenharia Ambiental e Sanitária e de Engenharia Civil da Universidade Anhembi Morumbi.

“Recuperar esses sistemas vai ser muito mais complicado, mesmo com chuvas. À medida que o nível da água reduz, aumenta a taxa de evaporação, porque o solo fica mais seco e em contato com a atmosfera. Assim, a água da chuva infiltra e evapora”, explica.

Segundo Roberta, a estratégia do governo de afastar o racionamento tem se revelado um "tiro no pé", a medida que aumentam as reclamações de moradores sobre faltas temporárias de água. A Sabesp nega que se trate de rodízio, mas, sim, de manutenções na rede de distribuição.

Racionamento

Sujeitar 9 milhões de pessoas a regime de racionamento não é uma decisão fácil. “Mas é necessária”, afirma Marco Antonio Palermo, doutor em engenharia de recursos hídricos pela USP.

“O uso do volume morto é uma estratégia paliativa e muito deletéria, que não trata o problema de forma estrutural. Pior, está virando rotina. Isso não pode ser prática de uma política de gestão de recursos hídricos, que deve focar na produção de água e no uso do volume útil”, defende.

Segundo ele, se São Paulo tivesse iniciado o rodízio no começo do ano, não teria sido necessário recorrer à reserva técnica, que só seria usada como estratégia última. “E se as chuvas não vierem em quantidade suficiente, o que vai sobrar para fazer rodízio depois?”, pergunta.

Questionado sobre outras medidas emergenciais de contornar a crise, como a tentativa de fazer chover no Alto Tietê, o especialista taxa: “É tolice. Se funcionasse, era só colocar todos os aviões da FAB [a Força Aérea Brasileira] para bombardear nuvens e produzir chuva”.

A prática citada tem sido adotada há cinco meses no Cantareira e, segundo a Sabesp, provocou a queda de cerca de 11,5 bilhões de litros nos reservatórios, o que representa 1,2% de todo o volume do sistema.

“Ainda que tardio, o racionamento ainda é a melhor solução”, defende Palermo.

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