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As favelas deixadas de fora da campanha eleitoral

ONGs organizaram um debate com candidatos ao governo do estado do RJ em complexo de favelas com aproximadamente 140.000 habitantes

Os organizadores escolheram segurança como tema do debate. Mas quando perguntado sobre suas prioridades, os moradores citam primeiro saúde e educação (./Divulgação)

Os organizadores escolheram segurança como tema do debate. Mas quando perguntado sobre suas prioridades, os moradores citam primeiro saúde e educação (./Divulgação)

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AFP

Publicado em 20 de setembro de 2018 às 14h44.

"Como pretende melhorar a segurança pública, para evitar que a gente perca aula, já que toda hora tem operação policial?", pergunta Ellen, uma adolescente da Maré, aos candidatos ao governo do Rio de Janeiro.

Ela tem 14 anos, a mesma idade que Marcos Vinicius, morto durante uma operação da polícia quando voltava da escola em junho na mesma comunidade.

É neste complexo de favelas com aproximadamente 140.000 habitantes - incluindo mais de 100.000 com idade para votar - que ONGs organizaram um debate com os candidatos ao cargo de governador do estado.

O centro cultural lotou: por volta de 300 pessoas, em sua maioria jovens, negros e quase todos moradores da Maré. Todas as cadeiras de plástico foram ocupadas, bem como os paletes de madeira transformados em grades, e muitos espectadores ficaram de pé.

Apesar disso, apenas três dos 12 candidatos compareceram. Dayse Oliveira (PSTU), Marcia Tiburi (PT) e Luiz Eugênio (PCO). Tarcísio Motta (Psol) foi representado pela vice, Ivanete Silva.

Segurança

"Cadê os candidatos, não conheço ninguém aqui. Nenhum deles vai para o segundo turno, mal passam de 1%", lamentou Daniel Silva, de 21 anos, que esperava ver os favoritos, o ex-jogador de futebol Romário e o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes.

"Estou um pouco decepcionada, mas isso só mostra o perfil desses candidatos. É importante o candidato ir para a favela e ter contato com a gente, para ter uma noção diferente do que a mídia passa", considerou Karla Rodrigues, de 35 anos.

Todos os dias, tragédias causadas por tiroteios nas favelas do Rio ocupam as páginas dos jornais.

O debate eleitoral na Maré não foi poupado. Por alguns segundos, o discurso de um candidato foi abafado pelo som de duas rajadas de tiros.

Arthur Viana de Andrade, de 21 anos, vai votar pela primeira vez. Ele ainda não escolheu seu candidato para governados nem para presidente, mas sabe em quem não irá votar.

"Quando um candidato foca muito nessa questão de 'bandido bom, bandido morto', vejo que não é o caminho a ser seguido, porque como homem negro favelado, você entende que é um alvo", afirma, em referência ao discurso do candidato de extrema direita Jair Bolsonaro, que lidera as intenções de voto para o primeiro turno da presidencial.

"Nenhum pudor"

Os organizadores escolheram a segurança como tema do debate. Mas quando perguntado sobre suas prioridades, os moradores citam primeiro a saúde e a educação.

"Eles têm que fazer um hospital grandão lá atrás. Esse negócio de segurança pública dentro de favela não existe. Hospital pode realmente ajudar. A saúde é o mais importante", afirma Lucia Gomes, de 49 anos, que vende bolos na entrada do centro cultural.

"As pessoas aqui estão bem descrentes da política, e generalizam muito, falam que todo político é corrupto, todo político é ladrão. Mas eu quero ouvir as propostas, porque deixar de votar não é a solução", declara por sua vez Sheyla Amaral, de 42 anos.

Para Eliana Sousa Silva, diretora da Redes da Maré, ONG que organizou o debate, o posicionamento político dos candidatos e suas propostas não são, necessariamente, levados em conta nas favelas.

"É difícil ter uma penetração inteligente e interessante da política porque as pessoas acabam votando de forma muito instrumentalizada. Alguns políticos veem as favelas como um curral eleitoral no qual estabelecem relações assistencialistas e clientelistas", explica.

E em certos casos, os candidatos devem obter autorização dos traficantes para fazer campanha, às vezes pagando pedágios.

"Já vi candidato oferecendo corte de cabelo, distribuindo peixe podre. Parece que é mentira, mas eles não têm o menor pudor", conclui Shyrlei Rosendo, membro da ONG.

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