SUPREMO: em votação unânime, o STF decidiu tornar sem efeito a Medida Provisória do presidente Jair Bolsonaro que transferia o direito de demarcação de terras indígenas da Funai para o Ministério da Agricultura / Adriano Machado/ Reuters (Adriano Machado/Reuters)
Ligia Tuon
Publicado em 2 de fevereiro de 2020 às 08h00.
Última atualização em 2 de fevereiro de 2020 às 09h00.
São Paulo - O Supremo Tribunal Federal (STF) volta do recesso nesta segunda-feira (3) com uma agenda para o primeiro semestre, já definida pelo presidente Dias Toffoli, repleta de temas espinhosos.
Além de pontos das reformas trabalhista, eleitoral e da previdência, estão na pauta temas como tabela do frete e suspensão temporária do Whatsapp a partir de decisões judiciais.
Os ministros também vão definir o alcance da decisão de que réus delatados têm o direito a apresentar suas alegações finais depois dos delatores, impactando decisões da Lava Jato.
“Não será um ano de águas mansas o que, inclusive, ficou no passado”, diz a professora direito constitucional da FGV, Flávia Bahia.
Ainda assim, temas da chamada pauta de “costumes” ficaram de fora. Em dezembro de 2019, quando a agenda foi divulgada, Tofolli justificou que assuntos de maior repercussão já haviam sido superados, como a questão da prisão em segunda instância.
“Em 2019, a Suprema Corte teve a coragem de enfrentar uma extensa lista de temas polêmicos, complexos e de grande impacto político, social, econômico e cultural”, afirmou Toffoli.
Veja os principais ponto da agenda:
Tabela do frete – 19 de fevereiro
O tabelamento do frete tem origem na greve dos caminhoneiros, em maio de 2018. A categoria exigiu que houvesse a definição de preços mínimos para o transporte rodoviário de cargas, editada via Medida Provisória e aprovado pelo Congresso.
Mas a solução foi controversa desde o início, com várias associações alegaram que o controle de preços feria a livre iniciativa e aumentava custos, e levando questionamentos à Justiça.
Em fevereiro de 2019, o ministro Luiz Fux suspendeu todos os processos que correm sobre o tema e deferiu liminar que suspende a aplicação de multas relacionadas ao tabelamento.
Agora, vai colocar em julgamento três ações diretas de inconstitucionalidade, abertas pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Confederação da Agricultura e Pecuária e a Associação do Transporte Rodoviário de Carga do Brasil.
Distribuição proporcional de votos nas eleições – 04 de março
O STF vai decidir se partidos que não atingiram o número mínimo de votos nas eleições proporcionais (deputado e vereador) podem concorrer às "sobras eleitorais".
A alteração do Código Eleitoral, em 2017, permitiu que todos os partidos concorressem às vagas não preenchidas. Antes, somente as legendas que haviam atingido o quociente eleitoral eram consideradas.
O partido Democratas questionou a lei no Supremo, defendendo que a mudança distorce o sistema eleitoral porque permite que legendas sem representatividade consigam eleger parlamentares.
Em dezembro de 2018, o ministro Marco Aurélio negou o pedido em liminar, afirmando que a modificação permitia uma maior representação de grupos minoritários. Agora, essa e outras duas ações sobre o tema serão avaliadas no plenário.
Alegações finais – 25 de março
No final de agosto, por três votos a um, a segunda turma do STF determinou que réus delatados têm o direito a apresentar suas alegações finais depois dos delatores. Em setembro, a decisão passou em plenário, por seis votos a cinco.
Foi a primeira vez que o tribunal revogou uma decisão do ex-juiz federal Sergio Moro no âmbito da Operação Lava Jato, que protestou imediatamente.
Apesar da decisão ter se restringido ao caso do ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras, Aldemir Bendine, abriu um precedente para que advogados alegarem que seus réus também foram prejudicados. Agora, os ministros definirão até onde vai o alcance da decisão.
Apesar de o direito do réu de falar por último ser garantido no artigo 222 do Código de Processo Penal, não há definição na lei de delação que sustente esse mesmo entendimento.
Reforma da previdência – 15 de abril
O STF vai retomar o julgamento de três ações, abertas pela Associação de Magistrados Brasileiros (AMB), Confederação dos Servidores Públicos do Brasil e Partido da República (PR).
Eles questionaram parte da reforma da Previdência de 2003 que evocou o artigo 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) para impedir que o teto de benefícios fosse violado com base no conceito de direito adquirido.
Em setembro de 2011, cinco ministros se posicionaram pela inconstitucionalidade do dispositivo. Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto, Celso de Mello e Cezar Peluso avaliaram que a norma desconsiderava garantias da Constituição de 1988.
O julgamento, no entanto, foi interrompido após um pedido de vista do então ministro Joaquim Barbosa e só agora será retomado.
Reforma trabalhista – 14 de maio
Desde que entrou em vigor, em novembro de 2017, a reforma trabalhista foi alvo de vários questionamentos judiciais. Alguns já foram julgados pelo STF, como o que permitia o trabalho de grávidas em locais insalubres, mas outros ainda precisam ser analisados.
No mês de maio, em duas ações, os ministros vão decidir sobre o índice usado para correção monetária de valores de indenizações trabalhistas, e também vão analisar o chamado trabalho intermitente.
Esses contratos permitem que o empregador pague o funcionário por hora, mas dentro das regras de contratação da CLT. O trabalhador, por sua vez, deve ser avisado do serviço com três dias de antecedência e pode recusar, além de poder ter mais de um contrato intermitente simultaneamente.
A Federação Nacional dos Empregados em Postos de Serviços de Combustíveis e Derivados de Petróleo (Fenepospetro), que ajuizou a ação, alega que o contrato intermitente precariza as relações de emprego e que serve “como desculpa para o pagamento de salários inferiores ao mínimo constitucionalmente assegurado”.
WhatsApp – 20 de maio
O Supremo vai avaliar duas ações que questionam o bloqueio do aplicativo, algo já ocorrido por três decisões de tribunais de primeira instância desde 2015.
Na primeira delas um juiz de Teresina, no Piauí, determinou a suspensão porque a empresa se negou a entregar informações para uma investigação policial.
O aplicativo não chegou a ser suspenso porque a decisão foi revertida na segunda instância. O desembargador que avaliou o caso concluiu que os usuários não deveriam ser penalizados.
Desde então, outras duas decisões suspenderam o aplicativo pelo mesmo motivo. Na última, em 2016, o então presidente do STF Ricardo Lewandowski derrubou uma decisão da justiça do Rio de Janeiro. O Facebook, proprietário do WhatsApp, alegou que não poderia cumprir as decisões porque as mensagens são criptografadas e, portanto, não acessíveis.
Dois partidos políticos, Partido da República (PR) e Cidadania, questionaram os bloqueios judiciais no Supremo e agora o plenário vai decidir sobre o tema.
Uso de armas por guardas municipais – 28 de maio
O uso de armas de fogo por guardas municipais em serviço se arrasta na pauta do STF desde 2014.
A questão é em quais cidades os guardas podem portar armas ou não, já que o Estatuto do Desarmamento permite o porte em municípios com mais de 50 mil habitantes e menos de 500 mil.
Em 2018, o ministro Alexandre de Moraes, atendeu a um pedido do Democratas e liberou o porte de armas para guardas de todas as cidades do país. Agora, caberá ao plenário a decisão final.