Augusto Aras: avaliação de que procurador-geral da República é leniente com Bolsonaro existe dentro do STF (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Agência O Globo
Publicado em 16 de janeiro de 2023 às 06h54.
Última atualização em 16 de janeiro de 2023 às 07h22.
Alvo de críticas pelo comportamento que era visto como um alinhamento com o ex-presidente Jair Bolsonaro nos últimos três anos, o procurador-geral da República, Augusto Aras, tentou sair da defensiva na última semana e tomou uma série de medidas contra os atos terroristas realizados em Brasília no dia 8 de janeiro. Entre as ações da Procuradoria-Geral da República (PGR) estão a criação de um grupo específico para cuidar desses casos, a solicitação de abertura de diversos inquéritos e um pedido de investigação do próprio Bolsonaro.
Apresentado na sexta-feira e já aceito pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), o requerimento para que Bolsonaro seja investigado pela possível incitação dos atos não foi assinado pelo procurador-geral, mas sim por um subordinado, designado para comandar as investigações sobre os atos. Entretanto, foi uma resposta à ação de 79 membros do Ministério Público, que enviaram a Aras um pedido para que o ex-presidente fosse alvo de inquérito.
Indicado ao cargo por Bolsonaro em 2019, e reconduzido em 2021, Aras sofreu diversas críticas por ter uma atuação considerada leniente com o ex-presidente. A PGR acumulou, ao longo dos últimos anos, decisões favoráveis a Bolsonaro, como os pedidos de arquivamento de investigações relacionadas à pandemia, entre elas a de prevaricação na negociação da compra da vacina indiana Covaxin, e da apuração após a divulgação de documentos sigilosos em uma live com o objetivo de atacar as urnas eletrônicas, posteriormente negados pelo Supremo Tribunal Federal.
A avaliação de que Aras tende a ser leniente com Bolsonaro existe inclusive dentro do STF, o que levou a PGR a ser preterida em alguns inquéritos, com ministros tomando decisões sem um parecer do Ministério Público.
Bolsonaro ignorou a lista tríplice da categoria ao fazer as indicações, quebrando uma tradição que vinha desde 2003. A escolha fora dos critérios tradicionais, embora não seja ilegal, reforça a tese dos críticos de Aras, que a citam como confirmação de uma ligação especial entre os dois.
Analistas jurídicos enxergam, porém, um novo posicionamento de Aras desde a posse de Luiz Inácio Lula da Silva. No dia seguinte à invasão e depredação da sede dos três Poderes, o procurador-geral da República participou da reunião que Lula realizou com governadores e outros chefes de Poder . Aras fez um discurso em defesa do seu trabalho, dizendo que atuou nos últimos dois anos para coibir atos antidemocráticos, e buscou se colocar como parceiro do Judiciário nessa tarefa. O tom adotado foi de prestação de contas.
"Nesses últimos dois anos não faltou Ministério Público. Nesses últimos dois anos não faltou Supremo Tribunal Federal" afirmou na ocasião: "Isso é necessário dizer à nação. É necessário dizer a todos os presentes. É necessário dizer que não faltaram Ministério Público e Poder Judiciário na busca desse controle."
LEIA TAMBÉM: Brasília retorna à normalidade uma semana após atos terroristas
Uma das medidas tomadas recentemente por Aras nesta tentativa de novo posicionamento foi a criação de um grupo específico dentro da PGR para atuar nas investigações manifestação golpista, batizado de Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos. O núcleo é comandado pelo subprocurador -geral da República Carlos Frederico Santos. Foi Santos o responsável pelo pedido de investigação de Bolsonaro.
Nos últimos dias, a PGR pediu a abertura de sete inquéritos para investigar os atos do último dia 8. Os pedidos foram divididos de forma a identificar os executores, financiadores, instigadores e autores intelectuais do protesto golpista, além de autoridades públicas envolvidas. Bolsonaro foi incluído em um desses inquéritos. A motivação do pedido foi o fato de o ex-presidente ter compartilhado um vídeo sugerindo que a eleição de Lula foi fraudada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e pelo STF. Bolsonaro fez a publicação na noite do dia 9, mas apagou a postagem horas depois.
Um dos pedidos de abertura de inquérito feito pela PGR tem como alvo três deputados federais eleitos, todos com ligações com o bolsonarismo: André Fernandes (PL-CE), Clarissa Tércio (PP-PE) e Silvia Waiãpi (PL-AP). Eles são suspeitos de incitarem os atos golpistas e de atentar contra o Estado de Direito.
Outra solicitação teve como alvo o governador afastado do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, e o ex-ministro e ex-secretário Anderson Torres, além de outras autoridades do DF. O pedido de investigação, no entanto, foi feito após Moraes já ter afastado Ibaneis do cargo e determinado a prisão de Torres. Mesmo assim, um novo inquérito foi aberto.
Aras tem mandato até setembro. Uma troca antes disso é considerada complexa e delicada, pois dependeria de uma inédita destituição do procurador-geral, que teria que ser aprovada pelo Senado — Casa do legislativo onde o conservadorismo é mais forte.
Na campanha, Lula evitou se comprometer com a lista tríplice na indicação do novo procurador-geral.
Em nota, a Procuradoria-Geral da República “esclarece que a atuação do órgão é e sempre foi técnica e considera os fatos que demandam o posicionamento da instituição".
LEIA TAMBÉM: