Site de apostas esportivas ( Bruno Peres/Agência Brasil)
Repórter de Brasil e Economia
Publicado em 12 de abril de 2025 às 09h15.
A regulamentação das casas de apostas no Brasil completou 100 dias na última semana, com o combate aos sites ilegais, o controle de apostas por beneficiários do Bolsa Família e a criação do Sistema Nacional de Apostas como desafios centrais para o governo e o setor.
Desde janeiro, apenas casas autorizadas pelo Ministério da Fazenda podem operar no Brasil, seguindo regras específicas e utilizando o domínio bet.br. Atualmente, 73 empresas estão autorizadas, somando 162 sites legalizados, além de outras 8 empresas que atuam por decisão judicial, ligadas a 18 marcas.
Segundo dados do Banco Central (BC), R$ 90 bilhões foram direcionados para bets de janeiro a março.
Apesar do avanço da regulamentação, dados da consultoria Aposta Legal mostram que, nos dois primeiros meses de 2025, o Brasil movimentou cerca de R$ 350 milhões em apostas ilegais, com mais de 30 milhões de acessos a plataformas não autorizadas. O número representa menos de 1% do tráfego total registrado pelo mercado legal.
O combate às plataformas não regulamentadas ocorre em duas frentes principais. A primeira é a retirada dos sites do ar, via atuação da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Segundo a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA), mais de 11.360 sites foram derrubados desde o início de 2025. A SPA afirma manter contato constante com a Anatel para bloqueio dos domínios irregulares.
"A atuação dos sites ilegais impacta a indústria de forma negativa, sobretudo por criar concorrência desleal. Essas plataformas não recolhem impostos nem assumem os custos operacionais necessários no país", afirma Plínio Lemos Jorge, presidente da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL).
Estimativas de profissionais do setor apontam que o mercado ilegal representa hoje quase 40% da indústria de apostas no Brasil. No Reino Unido, referência mundial no segmento, esse percentual é de apenas 13%.
A segunda linha de enfrentamento ao mercado ilegal é o estrangulamento financeiro. Em março, a Fazenda publicou uma portaria que proibiu instituições financeiras e de pagamento de processarem transações de operadores ilegais, detalhando regras já previstas na lei original que regulamenta o setor.
De acordo com a nova norma, bancos e financeiras não podem manter contas transacionais de empresas não autorizadas, nem executar depósitos e pagamentos de prêmios. As instituições têm até 24 horas para comunicar à SPA eventuais transações suspeitas, indicando o CNPJ e a razão social da empresa.
Desde fevereiro, 22 notificações já foram enviadas a instituições financeiras alertando para operações com empresas de apostas ilegais. "As facilitadoras de pagamento são peças-chave para impedir a operação de sites clandestinos", afirma João Fraga, CEO da Paag, que atua exclusivamente com plataformas regulamentadas.
Outro ponto sensível na regulamentação envolve beneficiários de programas sociais, como o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Em decisão de 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o governo deve criar medidas para impedir o uso desses recursos em apostas.
A Advocacia-Geral da União (AGU) informou ao STF no fim do ano passado que a restrição seria difícil de implementar tecnicamente. Mesmo assim, o secretário da SPA, Regis Dudena, afirmou ao jornal Estado de S. Paulo que o governo pretende proibir as apostas por beneficiários do Bolsa Família, sem detalhar como ou quando ocorrerá a restrição.
Segundo dados do Banco Central, entre janeiro e março, apostadores brasileiros movimentaram até R$ 30 bilhões por mês em bets. A SPA estima que 93% desse montante volta aos apostadores em forma de prêmios.
Em levantamento preliminar de 2024, o BC identificou que 5 milhões de beneficiários de programas sociais haviam transferido R$ 3 bilhões a plataformas de apostas em apenas um mês. Os dados, porém, foram considerados imprecisos.
O Instituto Brasileiro do Jogo Responsável (IBJR), que representa 75% do mercado regulamentado, declarou que implementará "imediatamente" qualquer regra que venha a restringir o acesso de beneficiários a plataformas de apostas.
A SPA iniciou negociações com estados e o Distrito Federal para criar o Sistema Nacional de Apostas (Sinapo). A proposta é estabelecer diretrizes conjuntas para regulação, fiscalização e combate a práticas ilegais.
Atualmente, estados já têm autorização para explorar apostas de quota fixa, e a criação do Sinapo é uma das prioridades da agenda regulatória da SPA para o biênio 2025-2026. A portaria que oficializará o plano deve ser publicada na próxima semana.
Estados como Santa Catarina, Pará e Bahia avançaram em regulamentações locais, enquanto outros ainda avaliam sua participação no setor. A expectativa do governo federal é criar um modelo de federalismo cooperativo para unificar práticas e fortalecer o controle sobre o mercado.