Nesta quarta, em audiência na Câmara dos Deputados, Vélez dizia estar firme no posto (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 28 de março de 2019 às 08h42.
Brasília - Diante de deputados que chegaram a pedir sua renúncia, o ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodrigues, afirmou nesta quarta-feira, 27, que ficará no posto, mesmo comparando o cargo com um "abacaxi do tamanho de um bonde". Apesar de garantir a permanência, o jornal O Estado de S. Paulo apurou que a situação de Vélez é considerada delicada. Cogita-se até sua troca pelo ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que tem enfrentado problemas para fazer a articulação política do governo.
Na noite desta quarta, o presidente Jair Bolsonaro foi às redes sociais para dizer que o ministro não foi exonerado. Ao Estado, Onyx também rejeitou a possibilidade de queda de Vélez. Assessores que estavam com o ministro à noite informaram que ele se mostrava tranquilo, sobretudo depois de Bolsonaro ir ao Twitter garantir a ele sobrevida no cargo. Também no Twitter, o ministro escreveu que seu "compromisso é com o os brasileiros e seus representantes".
O jornalismo brasileiro se põe raivoso por estar, pela primeira vez, sem poder barganhar às custas de trocas de favores. Meu compromisso é com os brasileiros e seus representantes. Os veículos que busquem outras fontes de financiamento.
— Ricardo Vélez (@ricardovelez) March 28, 2019
Nos bastidores, contudo, a avaliação de governistas é de que Vélez não tem programa e escalou para a equipe alguns "pensadores" que não entendem nada de administração. Militares no primeiro escalão do governo resolveram abandonar a tarefa de encontrar um substituto. Eles lavaram as mãos após a exoneração do presidente do Inep, Marcus Vinicius Rodrigues, indicado do grupo militar com cadeira na Esplanada.
Nesta quarta, em audiência na Câmara dos Deputados, Vélez dizia estar firme no posto. "Muitos pediram para eu sair, mas não vou sair. Porque estou gostando muito do cargo. É um passeio às ilhas gregas? Não. O cargo é um abacaxi do tamanho de um bonde. Mas topei o convite porque quero devolver ao meu País o que ele fez por mim", disse, com voz embargada.
Foram mais de cinco horas de sessão, com uma interrupção que durou menos de dez minutos. Até o fim da reunião, a sala permaneceu lotada, com pessoas acompanhando de pé as declarações de Vélez, com muitos ataques e poucos elogios.
Desgastado no cargo e enfrentando uma crise que já dura três semanas, o ministro alternou momentos de nostalgia, quando falou das razões que o levaram a sair da Colômbia e vir morar no Brasil, com revide a ataques feitos por congressistas e emoção ao falar do cargo. Com dificuldade em encontrar algumas palavras em português, Vélez garantiu que sua equipe continua a trabalhar, embora 15 exonerações tenham ocorrido nos últimos dias.
O ministro atribuiu os desligamentos a critérios técnicos. Mas não poupou críticas a Marcus Vinícius Rodrigues. A relação entre ambos, que já era conflituosa, chegou ao limite quando uma portaria do Inep que determinava a suspensão da alfabetização foi publicada. No dia seguinte, a medida foi retirada e a avaliação, mantida. "O presidente do Inep puxou o tapete, mudou de forma abrupta o entendimento de fazer as avaliações", justificou o ministro.
Para Vélez, a medida provocaria insegurança no setor. A proposta da suspensão partiu do secretário de Alfabetização, Carlos Nadalim - ligado ao grupo de Olavo de Carvalho, e mantido no grupo. Vélez argumentou que a portaria, embora tenha base em parecer técnico, deveria ter sido debatida. Para ele, as críticas do presidente exonerado do Inep, como a falta de diálogo na equipe, teriam sido provocadas por "ressentimento".
No governo Bolsonaro o MEC é um campo de batalha entre três grupos, que disputam poder. Militares, que estavam à frente de postos-chave (mas agora, sem o Inep, considerado um trunfo), o grupo de discípulos de Olavo de Carvalho e os chamados "técnicos". Ao longo de dois meses, havia um certo equilíbrio entre as três alas. Com o episódio da carta enviada pelo ministro para sugerir a gravação do Hino Nacional em colégios, "técnicos" procuraram retirar integrantes dos "olavistas". Houve o contra-ataque, que resultou em 15 demissões.
Nesta quarta, teria se definido mais uma: segundo o site G1, Paulo César Teixeira, diretor de Avaliação da Educação Básica, responsável pela elaboração do Enem, pediu exoneração.
Enquanto as disputas internas estão a todo vapor, as políticas de educação patinam. Sem prestígio, o ministro tem dificuldades em recompor quadros.
A situação delicada ficou evidente na sessão da Câmara, com ataques sem freios de boa parte dos deputados.
Vélez chegou acompanhado de assessores e secretários. A tropa de assistentes, contudo, não foi suficiente para poupá-lo das críticas, sobretudo a suas afirmações vagas, à falta de dados e à falta de metas específicas para a gestão. O deputado federal Túlio Gadelha (PDT-PE) afirmou que Vélez dava um péssimo exemplo para os alunos. "O senhor veio para a prova sem estudar. Apresentou uma lista de desejos", disse. A deputada Maria do Rosário (PT-RS) chegou a citar o regulamento da Câmara para evitar que o ministro repassasse a palavra para seus secretários. "Se o senhor não souber as respostas é só dizer", completou. Mais tarde, Vélez retrucou, dizendo que não é obrigação de ministro saber de tudo "de cor e salteado."
O deputado Ivan Valente (PSOL-SP) foi o primeiro a pedir sua renúncia. Em resposta, Vélez afirmou: "Não renuncio, não faz sentido. Só apresentaria minha renúncia ao presidente da República. Ou ele me demite..." O deputado do PSOL interrompeu a resposta do ministro e indagou: "Falta muito?" Parte dos presentes riu. Túlio Gadêlha (PDT-PE) disse desejar que Vélez permanecesse no cargo. "Em um governo que pretere Paulo Freire a Olavo de Carvalho, prefiro que o senhor não saia do MEC. Tenho medo de imaginar quem pode lhe suceder."
A audiência não foi apenas com troca de farpas. Parlamentares afinados com o governo fizeram discursos em defesa de Vélez. Carla Zambelli (PSL-SP) até se desculpou pelos colegas. "Faltaram com a educação com o senhor e peço desculpas por isso."
Entretanto, o ministro voltou a provocar reação negativa quando comparou o Brasil à Colômbia de 30 anos atrás, por causa da violência e das drogas. Em outro momento de lembrança ao país de origem, citou uma estratégia que supostamente seria adotada pelo traficante Pablo Escobar para afastar jovens de tráfico de drogas: biblioteca e quadras de esportes. A declaração foi dada quando defendia a implementação do modelo cívico-militar nas escolas públicas.