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Apesar da troca de ministros, governo ainda enfrentará obstáculos. Entenda

Entenda em cinco pontos os principais desafios de Jair Bolsonaro e dos novos ministros

Bolsonaro usando máscara durante a pandemia de covid-19 (EVARISTO SA/AFP/Getty Images)

Bolsonaro usando máscara durante a pandemia de covid-19 (EVARISTO SA/AFP/Getty Images)

AO

Agência O Globo

Publicado em 30 de março de 2021 às 07h49.

No pior momento da pandemia no Brasil, Jair Bolsonaro decidiu colocar em prática a primeira reforma ministerial de seus dois anos no mandato. Ao todo, seis ministérios tiveram a chefia alterada na tentativa de gerenciar a crise em diversos setores do governo, mas a dança das cadeiras não será sinônimo de calmaria para o presidente no comando do Executivo.

As trocas que atingiram a Secretaria de Governo, Casa Civil, Relações Exteriores, Defesa, Justiça e Advogacia-Geral da União (AGU), vêm na esteira de atritos e aumento da pressão do Congresso sobre Bolsonaro. O Legislativo cobra uma atuação mais dura do governo federal para controlar o avanço da Covid-19, que não dá sinais de diminuição do ritmo de contaminação ou de aceleração da vacinação. A condução errática do governo federal levou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aliado de Bolsonaro, a subir o tom das cobranças.

No setor econômico, a cobrança foi tornada explícita por meio de uma carta: empresários, banqueiros e economistas cobraram medidas concretas de enfrentamento à pandemia. Além disso, as pautas dedicadas ao setor enviadas pelo governo ao Congresso, seguem travadas por questões urgentes em torno da crise sanitária no Brasil.

Em cinco pontos, entenda os obstáculos no caminho de Bolsonaro e dos novos ministros:

Relações Exteriores

Com a imagem deteriorada após a atuação ideológica de Ernesto Araújo à frente do Itamaraty, o novo chanceler, embaixador Carlos França, ex-chefe do Cerimonial do Planalto, enfrentará um cenário de terra arrasada. Maior parceira comercial do Brasil, a China não era tratada com cordialidade por Araújo, que dificultou a importação de vacinas e trabalhou pelo banimento de empresas chinesas na implantação do 5G no país. Diametralmente oposto, os Estados Unidos de Donald Trump sempre foram aclamados pelo chanceler, mas a relação diplomática foi imediatamente abalada pela chegada de Joe Biden ao poder.

Outro dificuldade a ser enfrentada por França é que, apesar de ter sido promovido a embaixador por merecimento, o diplomata nunca assumiu uma embaixada. A falta de experiência é apontada por colegas como um possível obstáculo.

Na prática, a falta de experiência de França na função pode significar uma manutenção da política adotada para as relações exteriores, altamente influenciada pela “ala ideológica” do governo Bolsonaro e pelo filho do presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro.

Militares

Com uma carta sucinta e sem muitas explicações, o general Fernando Azevedo e Silva deixou o ministério da Defesa após o aumento da pressão para que o Exército desse mais respaldo às declarações do presidente Jair Bolsonaro. “Nesse período, preservei as Forças Armadas como instituições de Estado”, destacou Azevedo em seu texto, deixando claro que o órgão não trabalha para governo, nem para partido político.

Segundo a colunista Malu Gaspar, Azevedo disse a interlocutores próximos que saiu da pasta porque não queria repetir o que viveu em maio passado. Maio de 2020 foi o mês em que bolsonaristas realizaram diversas manifestações pedindo intervenção militar e atacando o Supremo Tribunal Federal. Na ocasião, o presidente discursou em manifestação golpista e chegou a afirmar que "as Forças Armadas estão ao nosso lado".

A saída repentina estremeceu os ânimos das três Forças Armadas – Exército, Marinha e Aeronáutica – que se reuniram na noite desta segunda-feira para discutir uma possível renúncia conjunta dos cargos, como uma reação à saída de Azevedo da Defesa. De acordo com a colunista, uma decisão final não foi tomada, mas a tendência é que Edson Pujol, do Exército, Ilques Barbosa Junior, da Marinha, e Antonio Carlos Moretti Bermudez, da Aeronáutica, entreguem os cargos. O ato seria inédito na história do Brasil.

Centrão

A nomeação da deputada federal Flávia Arruda (PL-DF) para assumir o cargo de ministra-chefe da Secretaria de Governo consolida a aproximação do Planalto com o Centrão, após o retorno positivo das vitórias nas eleições da presidência da Câmara e do Senado. A deputada é casada com o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, que ficou inelegível nas últimas eleições após ser condenado e preso por participar de esquema de corrupção.

Com Luiz Eduardo Ramos comandando a Segov, o PL ficou insatisfeito com a articulação de na aprovação do Orçamento de 2021 e ameaçou obstruir a votação. Nos bastidores, lideranças do partido acusaram a Secretaria de Governo de privilegiar senadores na distribuição de emendas.

Flávia ficará responsável pela articulação política do governo no lugar do ministro Luiz Eduardo Ramos, que substituirá Walter Braga Netto no comando da Casa Civil. Mas a proximidade - física e simbólica - do Centrão com o governo não dá carta branca à Bolsonaro: por enquanto, o Congresso não dá indícios de que vai afrouxar a fiscalização sobre a atuação do Executivo, nem que diminuirá a pressão de parlamentares por cargos e emendas.

Mercado Econômico

Completamente congestionado pelas consequências da pandemia, a relação do governo federal com os atores econômicos não é boa. O pessimismo nesta área foi sacramentado por uma carta assinada por cerca de 200 economistas, banqueiros, empresários e acadêmicos, intitulada “País Exige Respeito; a Vida Necessita da Ciência e do Bom Governo”.

O texto classifica o cenário atual como “desolador” e não se esquiva ao apontar que o governo “subutiliza ou utiliza mal os recursos de que dispõe, inclusive por ignorar ou negligenciar a evidência científica no desenho das ações para lidar com a pandemia”. Ao todo, o documento leva a assinatura de quatro ex-ministros da Fazenda, além de cinco ex-presidentes do Banco Central e do BNDES.

Outro ponto de fragilidade neste setor é a agenda de reformas do governo, que avançou muito pouco nos últimos meses. Travadas no Congresso por conta das consequências da crise sanitária gerada pela Covid, projetos como a reforma tributária, reforma administrativa e uma série de privatizações não dão sinais de que serão analisados com a celeridade que o governo federal precisa.

Pandemia

Mais de um ano após a chegada da Covid-19 no Brasil, o país se tornou o epicentro mundial de contaminações e ganha destaque negativo nas manchetes internacionais. Nesta segunda-feira, um novo recorde na média móvel de mortes pelo vírus foi alcançado: o número chegou a 2.655, maior 34% se comparado ao cálculo de duas semanas atrás. Ao todo, 314.268 vidas já foram perdidas para o novo coronavírus.

A alta constante no número de infectados provoca o colapso da rede de saúde em praticamente todos os estados da Federação. Filas para conseguir um leito hospitalar se tornaram comuns. Até os estoques do “kit intubação” para tratar os enquanto o novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, pretende implementar protocolos assistenciais para economizar no uso de oxigênio no país.

O ritmo da campanha nacional de imunização também é lento: em todo o país, 16.258.743 pessoas receberam a primeira dose de um imunizante, o equivalente a 7,68% da população brasileira. A segunda dose da vacina, por sua vez, foi aplicada em 4.819.324 pessoas, ou 2,28% da população nacional.

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