Audiência pública sobre a atuação de juízes e procuradores brasileiros no âmbito da Operação Lava Jato. Jornalista fundador do jornal The Intercept, Glenn Greenwald (Vinicius Loures/Câmara dos Deputados/Agência Câmara)
Clara Cerioni
Publicado em 25 de junho de 2019 às 15h13.
Última atualização em 26 de junho de 2019 às 10h13.
São Paulo — O jornalista americano Glenn Greenwald, editor do The Intercept Brasil, participou nesta terça-feira (25) de uma audiência na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados para falar sobre as mensagens vazadas pelo site envolvendo o atual ministro da Justiça, Sergio Moro, quando ele ainda atuava como juiz da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
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“O jornalismo mais importante nas ultimas décadas foi baseado em informações e documentos muitas vezes roubados”, disse Glenn justificando a publicação do material.
Ele afirmou que os vazamentos são “para fortalecer e não enfraquecer a luta contra a corrupção" pois "é impossível lutar contra a corrupção usando corrupção”.
O jornalista também classificou como "cínica" a atitude de Moro de questionar a autenticidade do material:
"Moro não está defendendo o comportamento que ele teve, porque é impossível ele defender. Ele está fazendo algo diferente, uma tática muito cínica, ele está tentando enganar o público, dizendo que o material é falso".
Glenn citou declarações recentes do presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre, e editoriais da revista Veja e do jornal Estadão para destacar que as críticas às atitudes de Moro não estão restritas a um campo ideológico.
A deputada Carla Zambelli (PSL) desafiou Glenn a mostrar os áudios e vídeos que o jornalista diz que que tem. Ele respondeu que ela iria "se arrepender muito" de pedir isso, e a deputada se levantou e deixou a comissão. Ela depois voltaria para a sala para questionar novamente o deputado.
O deputado José Medeiros gerou uma onda de críticas de outros deputados ao se referir ao marido de Glenn, o deputado federal David Miranda (PSOL-RJ), como seu "parceiro sexual".
O presidente da Comissão pediu que o termo não fosse incluído nas notas e pediu atenção ao decoro parlamentar. "Meu marido é meu marido", disse Glenn, que foi aplaudido.
Os deputados também fizeram questionamentos sobre as motivações da viagem do ministro Sergio Moro aos Estados Unidos, já que ele estava marcado para falar na Câmara nesta quarta-feira (26).
O convite para ouvir o jornalista partiu dos deputados Camilo Capiberibe (PSB-AP), Carlos Veras (PT-PE), Márcio Jerry (PCdoB-MA) e Túlio Gadelha (PDT-PE).
Os parlamentares justificam que as reportagens, publicadas desde 9 de junho, "jogam dúvidas contundentes sobre a imparcialidade na atuação do Juiz Sergio Moro".
Eles dizem, ainda, que "os direitos dos cidadãos objeto da Operação Lava Jato, particularmente do cidadão Luiz Inácio Lula da Silva, foram violados sistematicamente" após as revelações do veículo de comunicação.
Glenn Greenwald é um jornalista americano vencedor do prêmio Pulitzer por ter revelado, em 2013, um sistema de espionagem em massa dos EUA com base em dados vazados por Edward Snowden.
Desde o último dia 09, o site que ele edita revela uma série de conversas vazadas que mostram Moro e Deltan Dallagnol combinando estratégias de investigação e de comunicação com a imprensa no âmbito da Operação Lava Jato.
Segundo as revelações, o ex-juiz sugeriu mudanças nas ordens das operações, antecipou ao menos uma decisão e deu pistas informais de investigações nos casos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O último artigo sobre o caso foi publicado no domingo (23), em parceria com o jornal Folha de S. Paulo. No texto, aparece uma troca de mensagens entre Moro e Dallagnol, em que os dois discutem formas de o juiz não se indispor com o Supremo Tribunal Federal.
Após a publicação, Moro foi ao Twitter e publicou uma frase em latim, do poeta romano Horácio: parturiunt montes, nascetur ridiculus mus (a montanha pariu um ridículo rato).
Na visão do ministro, o conteúdo divulgado, apesar das altas expectativas criadas pelo jornalista, era de pequena importância.
Moro e Deltan não garantem a autenticidade das mensagens, ao mesmo tempo em que destacam que elas, até agora, não mostraram nenhuma ilegalidade.
Como as revelações vieram a público por uma reportagem, ainda será necessária uma extensa investigação, provavelmente conduzida pela Polícia Federal, para confirmar as implicações jurídicas.
O vazamento de informações sigilosas no âmbito da Lava Jato tem sido comum desde o início da operação em 2014.